Setenta anos depois de dois grandes momentos “refundadores”, a Europa volta a viver um tempo que pode ficar para a história. Se há cerca de sete décadas o Plano Marshall e a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço mudaram o modelo económico e social e ajudaram a recuperar a Europa Ocidental de uma guerra que deixou feridas profundas em todo o continente, hoje é o Pacto Ecológico Europeu (Green Deal) a definir um novo rumo não só para toda a Europa, mas também para o mundo – na comunicação apresentada pela Comissão Europeia sobre o novo Pacto, fala-se na “green deal diplomacy” para convencer outras regiões do globo a promover o desenvolvimento sustentável.

Ambição é o que não falta ao Pacto Ecológico Europeu apresentado no dia 11 de dezembro pela nova presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Assente em 10 pilares, que sustentam 50 iniciativas, propõe um novo modelo de crescimento para a União Europeia onde o objetivo central é a preservação do planeta. Claro que nada se fará sem muitos milhões – aponta-se para cerca de 260 mil milhões de euros anuais para cumprir as metas climáticas e energéticas em 2030 – mas também nada acontecerá se todos, cidadãos, empresas e poderes públicos e privados não aproveitarem as oportunidades.

Oportunidades também não faltam no documento da Comissão Europeia. Redefinir a forma como produzimos, distribuímos, reciclamos e fazemos crescer a economia dissociando-a do uso de recursos é a ideia transversal a todas as ações propostas. O título da introdução da comunicação da Comissão sobre o Green Deal – transformar um desafio urgente numa oportunidade única – traduz a forma como a União Europeia está a partir para este novo modelo de desenvolvimento.  Haverá necessidade de repensar as políticas europeias em diversas áreas e a forma como todo o sistema irá funcionar com energias limpas.

O Pacto consagra uma ideia que, ano após ano, tem ganho uma dimensão incontornável: cuidar do ambiente é cuidar, também, do crescimento económico e da competitividade europeia. Uma tarefa que implica mobilizar vários sectores da economia, entre os quais a indústria. No documento que define o “roadmap” do Green Deal refere-se que transformar um sector industrial e toda a sua cadeia de valor demora 25 anos. Portanto, para termos tudo pronto em 2050, as decisões e ações têm de ser tomadas nos próximos cinco anos.

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Reindustrialização verde é aqui a palavra-chave. Tratar e reciclar é uma etapa fundamental, um território por excelência para a INOVAÇÃO. Tal como refere o documento da Comissão “em março de 2020 a Comissão Europeia apresentará uma estratégia industrial para enfrentar os desafios de uma transformação digital e verde. Juntamente com esta estratégia um novo plano para a economia circular ajudará a modernizar a economia da União Europeia e redefinirá as oportunidades que surgirão da economia circular quer a nível local, quer global”.

Como país pioneiro na definição de metas para a neutralidade carbónica, Portugal pode aproveitar as oportunidades desta “nova economia” que vai nascer na União Europeia. No sector da reciclagem das embalagens, por exemplo, onde já temos das melhores práticas a nível europeu, poderemos ir mais além e dar um grande contributo para atingir os objetivos do Green Deal. Somos uma economia circular há mais de 20 anos e agora temos de evoluir para negócios e consumo circulares.

Toda a cadeia de valor terá de ser convocada para estas oportunidades. Os poderes públicos não podem ficar de fora e têm a responsabilidade de desenhar e aplicar melhores políticas públicas em matéria ambiental. Para acompanhar a ambição do Green Deal precisamos de mobilizar vontades e determinações, otimizar processos e redefinir com transparência as regras e regulação deste sector.

No centro de todo o processo deverá estar o cidadão. Se na área da reciclagem das embalagens as metas estão a ser globalmente cumpridas em Portugal, há ainda muito a fazer noutras áreas e por isso é preciso dotar o país com capacidade para recolher e tratar o que se vai pedir aos cidadãos para colocar em determinado lugar. Situações como esta vão criar novas oportunidades na área do tratamento e recolha de resíduos, potenciar a inovação e contribuir para executar a nova estratégia da União Europeia. Este é um sector que tem uma palavra decisiva no novo momento “refundador” da Europa.