São 6 da manhã, os galos já se fazem ouvir cheios de pressa para começar o dia. Há que despachar, não há tempo a perder! O sol já se espreguiça e quando estiver totalmente acordado irá impor a sua presença. Há que subir a serra, com passo apressado. Sente-se o cheiro a pinheiro e eucalipto. As ervas, que ainda verdejam em agosto, ostentam colares de gotas de orvalhada, verdadeiros bens preciosos que reluzem aos primeiros raios de sol.

O caminho ostenta silvas e tojos, não está tudo limpo. Desde que o Sr. Manuel morreu que tudo ficou ao encargo da natureza, os filhos não voltam da frança e os netos nem sabem o que existe na terra. Vai ficar esquecido assim que os que conheciam o sr. Manuel partirem. O caminho tem tanto de agreste como de belo. Ver o espreguiçar da natureza é um luxo que só a idade nos permite reconhecer.

Chegada à poça de água, cheia de água de nascente, feita à enxada por mãos calejadas e que já cá não estão, há que desempenhar a tarefa com zelo. Abrir a poça, levantar o torrão de terra e deixar na abertura um pau a dosear a saída da água. Assim, que a água se sente solta navega, bem guiada até à aldeia. Segue, inicialmente, de forma preguiçosa pelo rego de terra batida. Vai como que a pedir licença para passar. Segue-se um acompanhar deste trajeto, para garantir que a água segue o seu curso, não pode haver desvios nem perdas. Inicialmente o passo é lento, pois a água avança timidamente e as folhas secas pesam-lhe. Quando a água apanha um declive, ganha velocidade e o passo acelera. De todas as vezes ganhou a água. Os pés eram demasiado pequenos para esta corrida.

Chega a água ao seu destino e continua a ter de ser guiada, agora há uma missão. Garantir que cada gota chega aos campos sequiosos. Tomates, pimentos, pepinos, batatas, cebolas, feijão, milho…tudo reclama por água. Há que gerir o bem preciso.

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Enquanto se abrem os atalhos para a rega, já alguém interrompe o silêncio do momento com um sólido “bom dia” e com as corriqueiras expressões “daqui a nada já queima” ou “hoje vem mais que ontem”.

Tudo regado. Os campos verdejam e agradecem exibindo-se perante o sol ainda preguiçoso. Há que voltar à serra para fechar a poça e garantir que nada se desperdiça. Amanhã, os campos voltarão a precisar de rega.

Trata-se do celeireiro no verão, por isso nada pode falhar. Feitas as regas há que ir cuidar dos animais, tirar os ovos, deitar milho e couves e limpar as lojas.

São 9h. O sol já começa a queimar.

Avança-se pelas colheitas. Apanhar o que estiver maduro, limpar as ervas daninhas que vão retirar energia à planta e impedir o crescimento do fruto.

Às 12 já o sol começa a expulsar o trabalho do campo. Há que procurar uma sombra. Na mesa uma salada diretamente da horta e um peixe grelhado, que veio de longe. O Oceano é longe daqui. É apenas visto um ou dois dias no ano. O almoço e o sol alto, pedem, um abrandar no tempo. Procura-se o descanso do corpo. Aqui, é apenas o corpo que se cansa…Não há notificações constantes, há tempo para se coexistir em simbiose com a natureza. Um luxo…

Em agosto o país vai a banhos…O país não é só o litoral. Há mais formas de viver agosto.