E de facto, esta semana está a ser quase perfeita para Portugal. Em pleno Verão de São Martinho, com 20 graus e o sol a brilhar, as notícias dificilmente podiam ter sido melhores (principalmente para o Ministro das Finanças). Ficámos a saber que, no terceiro trimestre de 2016, Portugal registou o maior crescimento da área do euro, com 0,8% (e só não foi o maior crescimento da União Europeia porque ficou empatado com a Bulgária). E, ontem, a Comissão Europeia não só anunciou que “aprova” o Orçamento do Estado para 2017, como também encerrou o processo das sanções e corte dos fundos estruturais.

Nem tudo é cor de rosa. A venda dos aviões F-16 à Roménia (algo que não se repete todos os trimestres) poderá ter dado um grande contributo para o crescimento do PIB. Os juros das obrigações portuguesas continuam a subir no mercado secundário – é certo que por motivos principalmente externos, mas, coincidência ou não, sobem mais do que para as obrigações de outros países. E, finalmente, a administração da Caixa Geral de Depósitos pode estar de saída, e pelo que disse a Comissão, a recapitalização da CGD pode até adiar por mais um ano a saída do Procedimento por Défice Excessivo (PDE). Mas, claro, isto são apenas pormenores que não devem servir para estragar uma boa história.

Ironias á parte, quer o crescimento no terceiro trimestre, quer principalmente as boas novas de Bruxelas quanto à política orçamental são excelentes notícias para o governo, mas principalmente para Portugal. É certo que este ritmo de crescimento não é sustentável, mas um crescimento de 0,8% vem pelo menos praticamente eliminar a necessidade de novas revisões em baixa por parte do governo – uma novidade no ultimo ano. E claro que com o voto de confiança da Comissão Europeia, diminuem substancialmente os riscos de descidas de rating e de mais desconfiança do mercado.

Tal como foi muito bem explicado ontem aqui no Observador, a aprovação do OE para 2017 contou desta vez com uma postura diferente por parte da Comissão Europeia. Ao contrário do OE para este ano, o orçamento para 2017 já não chocava de frente com os compromissos assumidos com a Comissão, mas mesmo assim fica ainda aquém do ajustamento estrutural necessário ( 0.6% do PIB). Segundo as contas da Comissão, o ajustamento será nulo, e a diferença de 0,6 pontos percentuais deveria levar a que fossem exigidas novas medidas para pelo menos reduzir essa diferença para 0,5 pontos – tal não aconteceu porque a Comissão entendeu flexibilizar a leitura das regras e reconhecer que esta diferença é “marginal”. Veremos até onde vai esta flexibilização no futuro…

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E de onde terá vindo esta boa vontade? Será só porque Portugal conseguiu demonstrar que é um aluno rebelde mas aplicado? Ou será que mais uma vez há um plano B escondido?

À partida, desta vez não parece haver nenhum “plano B”, mas também ainda ninguém o perguntou diretamente à Comissão. De qualquer forma, o governo e a maioria de esquerda provaram ao longo dos últimos meses que conseguiam manter-se sólidos mesmo cedendo às exigências da Comissão. Basta ver que depois do primeiro choque em fevereiro, aquando da apresentação do OE para 2016, o governo implementou um “plano B” assim que a travagem da economia começou a por em causa o “plano A” (ainda que nunca o reconhecesse), com as cativações e o perdão fiscal. Desta forma, a Comissão e alguns países do norte da Europa sentir-se-ão mais confortáveis para 2017 e, de certa forma, já viram até onde conseguem ir caso seja novamente necessário.

Para além deste facto mais interno, há outro externo que terá pesado. Parece que, mais uma vez, o “mundo mudou” e a Comissão Europeia está agora bastante mais “tolerante” quanto às políticas orçamentais. Ou “assumidamente política” como escreveu ontem o comissário Carlos Moedas.

Não só recomendou uma expansão orçamental equivalente a 0,5 pontos percentuais do PIB da Zona Euro, para os países com margem para tal – Portugal obviamente não está incluído – mas também deu uma maior margem para os países que estão em pior situação orçamental. Portugal não foi o único pais a ter direito a alguma margem. Vários países tiveram direito ao beneficio da dúvida, entre os quais dois países da “primeira liga”: Itália e Espanha. O primeiro irá aumentar o défice estrutural em cerca de 0,5 pontos do PIB e o segundo não tem ainda um orçamento aprovado, nem sequer sinais muito claros por parte do novo governo de que seguirá as recomendações de Bruxelas. Ou seja, dificilmente a Comissão poderia ser dura com Portugal quando outros países estão ou na mesma situação ou até ligeiramente pior.

Portanto, caso encerrado e está tudo resolvido?

Quando o Comissário dos Assuntos Europeus for amanhã ouvido Parlamento, irá certamente repetir os mesmos elogios que fez ontem ao governo português. No entanto, convém sempre levar os elogios/reprimendas de Bruxelas com alguma moderação… O Mundo costuma mudar muito e bastante rápido. Em 2009, Portugal foi elogiado por aumentar o investimento publico e a Comissão só criticou em público o governo de então já bastante tarde, tarde demais até.

E, claro, estes elogios pressupõem que o governo consegue cumprir as metas do défice para o próximo ano – algo bastante improvável. Caso os riscos se materializem novamente, o governo e a maioria aprovam um novo “plano B” (mesmo que não lhe chamem assim). Caso isso não aconteça, o Mundo muda outra vez, e com os juros da divida a subir, o poder negocial da Comissão será ainda maior.