O paciente e resiliente Mundo Rural acordou. Necessário foi um “erro de comunicação” do IFAP e o descontentamento europeu para que se constatasse a necessidade de melhor valorizar e estimar uma atividade económica indispensável para a soberania nacional. Ironia do destino: os dois setores mais sacrificados na pandemia (Saúde e Agricultura) que permitiram manter o nosso quotidiano, estão hoje em franca convulsão.

A Agricultura tem vindo a perder a relevância política devida a um setor produtivo fundamental para o País, para a economia e para a sociedade. Por mais diferenciadas as visões com que consideremos o papel ou as funções da agricultura e dos agricultores, a que persiste, em qualquer análise, é o seu contributo fundamental para a soberania alimentar e, consequentemente, para a soberania nacional.

Perante um novo quadro comunitário, com uma forte componente agroambiental e um conjunto de medidas que condicionam o desenvolvimento do setor a nível nacional, o atraso e erros na sua execução, que põe em risco a utilização total dos fundos atribuídos a Portugal pela Política Agrícola Comum, contribui para o presente contexto, que condiciona de forma determinante o funcionamento do setor e o lança numa enorme nuvem de incerteza no que respeita à autonomia alimentar.

A pouca compreensão dos objetivos e metas de Bruxelas e a realidade adaptada a tempos que incluem pandemia e guerras, ou a ajustamentos às especificidades nacionais, leva, hoje, a um crescendo geral de contestação a uma das poucas Politicas Comuns Comunitárias, a Agrícola. Ora, a crescente filosofia ambientalista e uma forte pressão sobre os agricultores como responsáveis de práticas responsáveis da emissão de gases de efeito estufa, condicionou uma politica agrícola com particular incidência ambientalista.

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A estratégia “Farm to Fork” estimula o aumento da redução da emissão para mais de 50% dos GEE, 50% na redução dos antimicrobianos e de pesticidas, 20% na redução dos fertilizantes e o aumento de 25% da área em agricultura biológica. Simultaneamente, pretende a geração de valor para os agricultores, uma cadeia de valor justa, o comercio justo e a competitividade dos estados-membros. E, se bem que vamos no inicio desta PAC, é altura de refletir, mensurar e corrigir, pois gerar valor e competitividade não são presentemente o que encontramos na Agricultura nacional e comunitária.

Tem tido a União Europeia um papel importante na redução das emissões do GEE, estimando-se a redução de 48% em 2030, superior ao objetivo de 40% do Pacote Energia-Clima para 2030 da UE. A Agricultura portuguesa tem acompanhado esse esforço, 44% de redução comparativamente a 2005, a um ritmo superior a outras economias europeias e mundiais. Se por este lado, cumprimos a metas exigentes, é relevante que esse esforço, que tem implicações na produtividade e competitividade, seja valorizado não só pela PAC mas, igualmente, pela sociedade.

Se pretendemos um sistema alimentar saudável e mais sustentável, se adicionarmos a relevância de um mundo rural forte e de um território povoado, de um rejuvenescimento de atividade agrícola, é fundamental uma politica nacional que também torne mais robusto e atrativo o setor. E, essa, não tem acontecido, por mais “erros de comunicação” que queiramos interpretar.

Exige-se uma gestão eficiente e atempada dos apoios comunitários, mesmo da sua revisão ajustada aos tempos e necessidades atuais, a redução de uma burocracia que tem de deixar de ser a “primeira causa” de um Ministério e, com a força politica necessária, favorecer investimentos, agilizar licenciamentos, simplificar procedimentos, enfim, confiar em quem investe.

Ser ambicioso para os tempos futuros. A produtividade e competitividade surgem através de estratégias que valorizem os recursos naturais, a água, e a sua eficiência, promovam o uso mais sustentável do solo e as boas praticas agrícolas, reforcem a comercialização e a qualidade dos produtos, incentivem a inovação e a internacionalização. E, sobretudo, deem o justo peso à produção primária dentro da cadeia de valor alimentar.

Ora, mais do que pedir desculpas por “erros” ou encontrar (agora) paliativas compensações financeiras, temos de ter coragem, rasgo e encontrar politicas que valorizem a agricultura e contribuam para o equilíbrio da nossa balança alimentar.

Nota (Pessoal): Sou Pai do Bernardo, um jovem agricultor que se dedicou à Agricultura Biológica e que foi vitima do “erro de comunicação” em 35%. Acompanho, ainda, de perto, as burocracias; os tempos, sem tempo, das licenças e autorizações; as obrigações incompreensíveis; os atrasos de pagamento; a ineficiência, enfim, a cada vez menor notoriedade e relevância da Agricultura. Também pelo Bernardo, entendo a angústia de quem se manifesta, mas, sobretudo, pelo Bernardo,, e por todos os Agricultores é necessária uma outra visão, uma outra estratégia, uma outra política, uma esperança no Futuro.