A frase em título é de César Monteiro em A comédia de Deus.

Esta semana coloco-me na pele de um qualquer português jovem, nem rico, nem pobre, diria remediado, nas razões que se lhe apresentam entre ficar em Portugal ou emigrar.

Sou neto de dois emigrantes que rumaram à Alemanha à procura de uma vida melhor. Confesso que a ideia só me surgiu já eu tinha vida feita, razão pela qual dela desisti. Mas os jovens estão a optar por deixar o país; são, atualmente, nada mais, nada menos que 30% entre os 15 e os 39 anos, representando o número de 850 mil.

O país envelhece, a taxa de natalidade é baixa e existem razões bastantes para tal evidência. Repare o leitor que o número de jovens emigrantes radica, tout court, na falta de perspetiva de futuro e tal é uma insuficiência gritante que a todos deve ou deveria preocupar.

Paralelamente, assistimos a uma taxa de imigração também ela alta. Todavia, sem peias ou preconceitos, antes numa base de realismo, importa aferir numa introspeção necessária, quem vai, e quem vem, ao nível da qualidade, do conhecimento, da escolaridade e daquilo que representa em mais-valias para o país e para a sociedade.

Aqui chegados, o panorama do país não é bom e não augura brilhantismo aos jovens, pelo que, entre eles, há os que partem e os outros, que se acomodam. Infelizmente para todos nós, Portugal não capta além do turismo, i.e., além daquele as portas estão e estarão fechadas ao sucesso de uma pessoa cujas valências inerentes à sua formação claudicam num qualquer trabalho, tantas vezes fora do âmbito da formação académica, não permitindo o desenvolvimento pessoal e profissional.

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Repare-se, é absolutamente redutor falar-se “somente” das deficiências do país no que tange à habitação, SNS, justiça, desemprego, altíssima (e pornográfica) carga fiscal, ensino, serviço público, custo de vida, corrupção, baixos salários, ausência de apoio à natalidade, desinvestimento, economia, (des)confiança na classe política, entre tantas outras que, elencando-as, ficaria sem espaço para mais escrever.

O que nos deve mover o pensamento (deixando as deficiências acima assinaladas para o estado de preocupação), é a realização enquanto pessoas, num todo que se complementa ou, de outro modo, aquilo que se quer para a vida num todo em termos materiais e temporais; que futuro, que qualidade, que projeção se faz da vida e para a vida.

Quando visitei a Holanda, um taxista disse-me que por aqueles lados pagavam muitos impostos, mas que tinham tudo em retorno, obtendo uma grande qualidade de vida nos amplos sentidos de uma vida em sociedade organizada. Quando ouvi a declaração, o meu pensamento, de forma imediata, fez um termo de comparação com a realidade portuguesa. E sim, fui assombrado pela frustração.

Poderão alguns – como antes ouvi – retorquir ser uma questão cultural e incomparável. Permitam que frontalmente discorde. Portugal estagnou. O país ficou parado no passado e dele teima não sair. Vamos “vivendo” nesta declarada pasmaceira que nada de bom nos traz, mas tudo de mau nos confere.

E aqui serei claro: somos o que somos nos exatos termos que a política ditou.

Se regredimos e não progredimos, se aferimos que por essa Europa fora os nossos concidadãos europeus têm uma vida díspar da nossa, ao nível do serviço público e salarial, ao nível da oferta de trabalho, horário de trabalho, proteção social, incremento à natalidade, entre outros, não seria – questiono – copiar o(s) modelo(s) importando o que de bom se faz além-fronteiras para, de vez, prosperamos enquanto país e sociedade?

Pois enquanto o nosso modelo for a avestruz – que copiosamente enterra a cabeça na areia – veremos os mais audazes e os nossos melhores partir para fora à procura não do sol que Portugal oferece, mas de uma vida digna e próspera que Portugal teima não conceder.

Olhemos, por exemplo, um advogado (compreenderão a razão subjacente à escolha) sediado em Portugal, com prática isolada. Mensalmente, paga quotas à Ordem dos Advogados no valor de € 35,00; acresce CPAS (Caixa de Previdência dos Advogados que de previdente nada tem e são os Advogados, na realidade, a previdência da Caixa com o mesmo nome) no valor mensal de € 277,77; acresce IVA. Só aqui (e não somando o IVA) despende mensal e sucessivamente de € 312,77. Se pensarmos que tem outras despesas fixas (renda de escritório, água, luz, eletricidade, consumíveis), além do combustível, renda da casa (ou prestação ao banco), despesas escolares dos filhos, alimentação, farmácia, vestuário, etcetera, e sabendo como sabemos que muitos deles (sobre)vivem de oficiosas, porquanto os clientes são incertos e, não existindo avenças, ninguém sabe quanto aufere em cada mês que inicia, podemos bem aferir o nível de vida destas pessoas. E note-se, fizeram os seus estudos, acreditaram no Estado e na mensagem que o Estado lhes deu, mas a verdade é que ao fim do dia, o Estado lhes falhou. De que lhes valeu o estudo, exames? Sim, acederam a uma profissão, mas a sua vida vai além desta. E então questiono: quanto ganha um advogado na Suécia, na Dinamarca, na França, na Holanda, no Luxemburgo ou Áustria? E que nível global de vida fazem? A resposta dá-se com mediana clareza

Esta é a razão pela qual 30% dos jovens emigraram. Esta é a razão pela qual uma maior percentagem se verificará no futuro próximo. Ninguém tenha dúvidas. Ou a política muda importando os modelos de sucesso lá de fora, ou quem muda de vez são os mais qualificados que Portugal produz.

Temos o que merecemos porque nada tentámos e nada mudámos ou fizemos mudar. Em função desta conclusão, trago à colação César Monteiro:

– Não são vocês que me expulsam, sou eu que vos condeno a ficar!