Todos sabemos que se discute este tema – um novo aeroporto para Lisboa – há mais de 50 anos, mas se os aviões continuam a aterrar é porque há 50, 30 ou 20 anos não precisávamos de uma nova localização. No entanto, é claro que estamos todos os dias a perder milhões de euros por termos um aeroporto esgotado.
Não nos podemos dar ao luxo de não ter uma infraestrutura que não só acomode a atual procura como potencie a atividade do turismo, as exportações e a atratividade do nosso território. Acresce a necessidade de diminuir o tráfego que sobrevoa e impacta a cidade de Lisboa.
Posto isto, 50 anos é muito tempo e por isso vamos diretos à questão : qual a melhor localização para a nova infraestrutura, sendo ela complementar ou não à atual? Vou ser excêntrico: não tenho uma resposta. Mas vamos a factos.
Não existe até agora nenhuma evidência de que alguma das localizações estudadas tenha qualquer impedimento ao nível da aeronavegabilidade ou de engenharia. A opção de Alverca + Portela passou a ser possível ao nível da aeronavegabilidade com a colocação das pistas no Mouchão da Póvoa.
Assim, importa analisar outros indicadores e, por ser leigo, vou analisar apenas os mais óbvios mas decisivos para a competitividade e viabilidade de uma localização.
Existem 9 soluções com 6 localizações. Olhando para cada uma delas, Alverca destaca-se por ser aquela que está mais próxima do centro de Lisboa (Saldanha, CBO) com 24km de distância. Santarém, Monte Real e Beja como sendo as mais distantes com 91, 149 e 173 km de distância respectivamente. Se analisarmos o tempo de deslocação por automóvel, a ordem mantém-se com Alverca a demorar 27 minutos, prolongando-se Santarém, Monte Real e Beja por 65, 94 e 108 minutos respetivamente. Conclusão, por automóvel, tendo como referência europeia a média de 30 minutos de automóvel entre o aeroporto e o CBO, apenas Alverca, Alcochete e Montijo respeitam esse indicador. Santarém, Monte Real e Beja implicam deslocações de 1 hora ou mais.
No entanto, o meio de transporte que deve ser promovido é a ferrovia. Neste particular, se analisarmos os aeroportos de referência a nível europeu, sendo estes os principais ou o único aeroporto da cidade, por ferrovia a urbe está habitualmente a escassos 20 minutos de tempo de viagem (é o caso, por exemplo, de Barcelona, Berlim, Bruxelas e Madrid-Barajas). Neste indicador Alverca e Monte Real são as únicas localizações que não precisam da construção de nenhum ramal ferroviário porque já têm estações construídas e ficam a 18 minutos (Alverca) e 150 minutos (Monte Real) de viagem até à estação de referência (Gare Oriente).
Segundo a Comissão Técnica Independente (Aeroparticipa.pt, não é claro quais os pontos de referência do cálculo) o tempo de viagem em ferrovia, depois de concretizados os investimentos do Programa Nacional de Investimentos 2030 e do Plano Ferroviário Nacional, Alverca continuará a 10 minutos de Lisboa, Alcochete 22 minutos, Santarém 29 minutos, Monte Real 45 minutos e Beja 105 minutos. Se é certo que são investimentos que devem ser realizados, estes têm uma concretização com um período temporal que pode não responder à urgência de aliviar o aeroporto da Portela.
Assim, parece claro que a opção de Beja e Monte Real não respondem positivamente a este repto. Um dos argumentos de quem defende a localização do novo aeroporto (principal ou complementar) em Beja é que já existe uma infraestrutura. No entanto, é importante termos a noção de que, para além da pista (que realmente é uma boa pista), o terminal de passageiros é tão pequeno como um hipermercado, o parqueamento e os taxiways tem muito pouca capacidade. Isto é, a vantagem desta localização não pode ser o facto de já existir um aeroporto porque teríamos que construir um de raiz (exceto a pista).
É relevante ter em conta que existe um contrato de concessão com a Vinci que a obriga a comparticipar os melhoramentos na Portela e a construção de um novo aeroporto, ficando o estado com o financiamento dos acessos. Mas aqui há um “se” importante: esta cláusula só é válida se a nova localização for na região de Lisboa. Aqui ficam de fora Santarém, Monte Real e Beja. Santarém tem o caso particular de ter investidores privados que afirmam que financiam a construção.
Continuando a análise, todos sabemos que só há aeroporto se existirem companhias aéreas dispostas a voar para esse mesmo aeroporto. Todos sabemos como foi difícil convencer as companhias low cost a irem para o Montijo. Quererão elas ir para Santarém, Monte Real ou Beja? Esta dúvida adensa-se se colocarmos a hipótese de continuarmos com o aeroporto da Portela a funcionar (altamente competitivo) e com menos movimentos. Se o aeroporto da Portela for desativado, como convencer milhares de funcionários a trabalharem a 55 minutos de distância do atual posto de trabalho (mais portagens)?
Desativar ou não o atual aeroporto é uma outra questão interessante. Para mim, faz sentido, a nível ambiental e económico, manter a Portela em conjugação com outra solução, dando tempo à expansão da nova infraestrutura e não desperdiçando as centenas de milhões de euros de investimento dos últimos anos.
Assim, partindo desse pressuposto (1 + Portela), claramente sobram-nos três opções competitivas em tempo-custo-conforto. Montijo parece ser a mais limitada das soluções, pois alia as desvantagens de Alcochete (estar na outra margem, maior investimento em acessibilidades), acrescido do facto de não ter ferrovia projetada e de não ter a possibilidade de expansão de Alcochete. Montijo foi sempre apresentada como uma solução provisória para dar tempo ao estudo de Alcochete. Sobra assim Alverca + Portela e Alcochete + Portela.
Estas soluções permitem um aumento gradual da capacidade aeroportuária e proximidade com o atual aeroporto. Alverca tem já a linha do norte e a A1/A9, pode ter um comboio automático a ligar o terminal com a Portela/metro de Lisboa (como acontece com vários aeroportos) e Alcochete, com os investimentos previstos, ficará também mais próxima do atual terminal e da cidade. A possibilidade de expansão em Alcochete é evidente. Em Alverca, com o Mouchão da Póvoa sem requisitos para reserva natural, tem capacidade para duas pistas (segundo os peritos que a defendem) e não faltam exemplos de aeroportos em ilhas artificiais e naturais.
Não é uma decisão fácil, mas urge. Deixo assim o meu contributo para a discussão e reflexão da Comissão Técnica Independente. Decida-se e faça-se.