Como apresentado na primeira parte deste conjunto de crónicas, o intuito é focarmo-nos em como manter o projeto da construção de uma União Europeia (EU) de maneira a ser a organização como a conhecemos, e que tanto tem sido de benefício para Portugal. Nesta crónica vamos nos focar no Grupo da Identidade e Democracia (GID), e no Grupo Confederal da Esquerda Unitária/Esquerda Nórdica Europeia (GUE/NGL), e na ação dos eurodeputados do parlamento do Partido Comunista na terceira e última

Comecemos pela (extrema) direita.

O grupo a que o Partido Chega quer associar-se no Parlamento Europeu é o GID, onde se incluem partidos de extrema-direita e de direita radical como o Freiheitliche Partei Österreichs na Áustria (FPÖ), o Vlaams Belang na Bélgica (VB), o Rassemblement National de França (RN), a Alternative für Deutschland (AfD) da Alemanha, o Lega Nord de Itália, e o Partij voor de Vrijheid (PVV) dos Países Baixos.

Estes partidos defendem uma alteração profunda do projeto europeu, para se tornar uma união de países onde cada um defenderá as suas posições chauvinistas, protecionistas, e onde valores democratas como são a tolerância, a inclusão, a abertura, e o cosmopolitismo são vistos como indesejáveis. A matriz de valores dominante para estes projetos políticos são: a soberania, a nação, a família, as raízes cristãs da Europa, as teorias de conspiração sobre uma suposta ‘governação global’ por grupos secretos (leia-se judeus), a descrição do liberalismo como perigooso e até ‘imoral, a luta contra um ‘marxismo cultural’ que ameaça a civilização ocidental, e outros chavões criados em think tanks europeus e americanos.

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A líder do RN, a Madame Le Pen, já fez saber que reduzirá significativamente a contribuição econômica da França para a UE, e fará com que os programas europeus, que sobrevivam dos cortes orçamentais, beneficiem principalmente a França, em detrimento dos outros parceiros na União. Le Pen prefere uma UE sem Comissão Europeia, passando o centro de decisão para o Conselho Europeu onde será mais fácil (juntamente com líderes de países como a Hungria, Eslovénia, Itália, Áustria) parar programas que promovem ajuda sociais ou econômicas para países afetados por crises ou catástrofes naturais, ou desinvestir na criação de infraestruturas transeuropeias. Defende igualmente a anulação do Tratado de Schengen para tornarem a ser instalados controlos fronteiriços, o que seria um retrocesso de uma das principais conquistas da UE: o livre movimento de pessoas, capitais e serviços, que tanto tem beneficiado Portugal.

Já a AfD, quando se formou, tinha o intuito de convencer os alemães a sair da Zona Euro (ter o Euro como moeda), o que seria benéfico para a Alemanha, mas prejudicial para todos os outros que não conseguem competir economicamente com esse país. A AfD não esconde a sua ideologia racista, muitas vezes antissemita e islamofóbica, com membros do partido a utilizarem linguagem e ideias nazis, e uma supremacia germânica sobre outros povos europeus

Em Itália, o Lega Nord apresenta-se em oposição a projetos europeus para combater as alterações climáticas– como o Green Deal e o Fit for 55 – porque estes são “um perigo para a competitividade das empresas e para o estilo de vida dos cidadãos italianos”, ignorando assim um problema que é continental. Alguns dos membros do partido, mais ligados a área da economia, também já expressaram a preferência da saída da Itália da Zona Euro. Porém, ao contrário dos colegas da Alemanha e da França, o Lega Nord está interessado no dinheiro que recebe da UE, mas sem condições para o receber, algo que se observa na Hungria de Orbán.

Geert Wilders, o líder do PVV, tem sido historicamente contra a imigração, e é parte do grupo de ‘eurocéticos’, resistente à influência da UE em políticas dos Estados Membros, usando expressões como “os Países Baixos serão novamente para o povo neerlandês”. Oferece a aplicação de uma linha “muito mais dura” no que se trata de respeitar acordos da União Europeia, principalmente em questões de políticas de imigração e asilo. O PVV também é um partido com retórica anti ação climática, argumentando que o dinheiro aplicado a pela UE para proteger o ambiente e inovar indústria para ser mais sustentável são “passatempos climáticos inúteis”.

Um crescimento e maior peso do GID no Parlamento Europeu significará também que Ucrânia será deixada a sua sorte. Inclusivo, haverá tentativas, por parte de eurodeputados deste grupo, de minar ou mesmo parar com o apoio económico e militar à Ucrânia, defendendo uma melhoria nas relações com Moscovo, retomando assim a uma dependência económica, principalmente energética, com o regime de Putin, o que alimentará a máquina de guerra do presidente russo.

São publicamente conhecidos os empréstimos avultados que organizações associadas ao Kremlin fizeram ao partido da Le Pen, que tem, por sua vez, defendido a Rússia desde a invasão da Crimeia e minimizando os ataques à Ucrânia. O Parlamento francês, recentemente, avisou que o partido RN e um promotor de interesses russos dentro da sua instituição. Apesar de algumas recentes declarações mais veementes da líder sobre a atuação da Rússia na Ucrânia, uma dose de ceticismo é recomendada neste caso.

A AfD vê Putin como um aliado próximo e parceiro ideológico. O partido promove o fim das sanções à Rússia e tenta justificar a anexação da Crimeia. Produziu mais de 50 iniciativas no Bundestag (parlamento alemão), apelando à ‘cooperação em vez da confrontação’ com a Rússia, seguramente como compensação por todo o apoio que recebe do Kremlin.

O Lega Nord tem mantido relações próximas com a Rússia de Putin. Durante algum tempo, o seu líder, Matteo Salvini, foi apoiante vocal de Putin, e em 2017 o partido assinou um acordo formal de cooperação com o partido Rússia Unida, liderado pelo presidente russo. O Lega Nord tem defendido frequentemente, tanto na Itália como na UE interesses russos. Quando foram impostas sanções à Rússia após a anexação ilegal da Crimeia (em 2014), o Lega Nord opôs-se no Parlamento Europeu, e tentou (sem sucesso) criar pressão noutros grupos parlamentares para terminar as sanções.

É regular a presença de membros do PVV em eventos de propaganda russa, com visitas a Moscovo que são organizadas pelo membro de extrema-direita da Duma (parlamento russo).  O objetivo desta relação é ter um aliado no PPV para a remoção de sanções à Rússia, e a promoção da ideia (nos Países Baixos e por extensão na EU) que a Ucrânia não é uma nação soberana e não deve ser apoiada politicamente e militarmente pelo ocidente.

Para além da agenda política que estes líderes e partido têm, há também a forma de fazer política, que tem mostrado repetidamente não ser construtiva ou conciliadora. Estes partidos apoiam-se em estratégias de ação que se pautam pela produção de ataques pessoais, criação de dissensão, comportamentos infantis (trolling), apelo a polarização e em certos casos violência política. Tem para oferecer uma perspetiva niilista de estar na política, pôs-factos, pós-verdade, pós-compromisso.

Membros do Parlamento Europeu que sejam eleitos pelo Chega encontraram este enquadramento à sua espera, e serão seguramente manietados pelos grandes partidos, de uma forma voluntária ou não, para se juntarem ao coro de vozes dentro do GID que desejam uma alteração profunda do projeto europeu para um de nações que lutam entre si por recursos e supremacia.