Por décadas a NATO foi crucial para a defesa coletiva dos países aderentes e para dissuadir os adversários estratégicos durante a Guerra Fria. Nunca, ninguém, com suficiente bom senso, questionou a importância da adesão à NATO. Mas à medida que a revolução da Inteligência Artificial (IA) ganha ímpeto global, torna-se evidente a necessidade de uma nova abordagem coordenada e estratégica por parte da Europa. A Europa pode ter desistido de investir na defesa. Mas pretende fazer o mesmo nesta nova fase, marcada pela IA?

Atualmente, os Estados Unidos da América e a China lideram a corrida pela supremacia em IA, investindo massivamente nesta tecnologia disruptiva. Se a Europa não agir de forma decisiva, corre o risco de ficar para trás, submetida aos interesses de potências estrangeiras numa área tão crucial para o seu futuro económico e estratégico. A hegemonia tecnológica não é apenas uma questão de competitividade económica, mas também de soberania e segurança nacional. A IA está a transformar rapidamente setores como a defesa, a inteligência e a cibersegurança, áreas em que a dependência de tecnologias estrangeiras pode representar um risco significativo. É por isso imperativo que a União Europeia promova uma nova “NATO da Indústria de IA” para proteger e impulsionar os seus interesses nesta nova era tecnológica, evitando uma ruína quase certa.

A criação de uma agência europeia e americana, uma espécie de NATO da Indústria de IA, permitiria unir forças, recursos e talentos, criando uma base sólida para competir em pé de igualdade com as superpotências tecnológicas. Essa abordagem colaborativa evitaria a duplicação de esforços e promoveria melhores práticas e a partilha de conhecimentos. Tal iniciativa poderia envolver a criação de um centro de excelência em IA, financiada conjuntamente pelos países membros, dedicada ao desenvolvimento de soluções de ponta e à formação de talentos. Além disso, seria necessária a harmonização de regulamentos e políticas, garantindo um ambiente propício ao crescimento da indústria de IA europeia.

Portugal, como membro da União Europeia atlântica para outras regiões, tem um papel fundamental a desempenhar nesta iniciativa. A implementação de uma política de IA na Administração Pública portuguesa, alinhada com o AI Act, é um passo essencial para preparar o país para esta nova realidade. Ao adotar soluções de IA e aumentar a literacia nesta área, Portugal estará a contribuir para o fortalecimento da indústria europeia de IA. Além disso, poderá posicionar-se como um hub de inovação e talentos, atraindo investimentos e parcerias estratégicas. O governo português deve investir em programas de formação e sensibilização sobre IA, tanto para os funcionários públicos como para a população em geral. Essa abordagem abrangente garantirá que a sociedade portuguesa esteja preparada para abraçar as oportunidades e para enfrentar os desafios dessa tecnologia transformadora.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A construção de uma “NATO da Indústria de IA” traria ainda benefícios significativos para o crescimento económico e soberania tecnológica da Europa. Ao unir forças, os países europeus poderiam desenvolver soluções de ponta em IA, adaptadas às suas necessidades específicas e alinhadas com os seus valores e princípios. Essa abordagem colaborativa também promoveria a criação de empregos altamente qualificados, impulsionando a inovação e o empreendedorismo em toda a região. Além disso, reduziria a dependência de tecnologias estrangeiras, aumentando a resiliência e a segurança da Europa num mundo cada vez mais digitalizado.

A implementação de uma “NATO da Indústria de IA”, no entanto, não está isenta de desafios. Seria necessário abordar questões complexas, como a proteção de dados, a privacidade e a ética na utilização da IA. A Europa deve estabelecer padrões rigorosos e mecanismos de supervisão para garantir que a IA seja desenvolvida e utilizada de forma responsável e alinhada com os valores europeus. Essa abordagem, ética e transparente, não apenas protegeria os direitos e liberdades dos cidadãos, mas também reforçaria a confiança pública nessa tecnologia transformadora.

O desafio pode ser ambicioso, mas é essencial para o futuro da Europa. Ao unir forças e recursos, os países europeus poderão enfrentar as ameaças de uma hegemonia tecnológica que os exclua. E serão capazes de aproveitar as oportunidades oferecidas pela revolução da IA. As alternativas são evidentes: ou decidimos avançar ou prolongaremos a dependência de terceiros, pagando caro pelas migalhas do que sobrar. Para quem se assume como o velho continente e para um país que tem as mais antigas fronteiras da Europa, ficar abrigado sob as saias de outras geografias ou sujeito à pressão esmagadora de países com valores diferentes não parece aceitável. Pior: é mesmo dramático e condenará a Europa e Portugal a um novo século de subserviência.