Marcelo Rebelo de Sousa abriu o dossier das presidenciais, lançando Pedro Passos Coelho, claramente para abrir uma nova página na agenda mediática e sair de um capítulo em que perdeu o controlo da narrativa. É um estratagema comum, de recurso frequente por todos os políticos com influência suficiente para o pôr em prática.

Se o propósito de Marcelo é de curto alcance e facilmente se analisa em quatro linhas, o tema escolhido ultrapassa este imediatismo e merece reflexão mais alargada, em particular no momento difícil que o país atravessa; se nos assusta o presente, é normal que pensemos no futuro. Obviamente, a conjugação de Marcelo, Passos Coelho e Presidência da República gera alvoroço e expectativa. Tem-se visto pela catadupa de reacções e afirmações.

É verdade que as próximas presidenciais, apesar de ainda distantes, vão ser determinantes para a vida nacional e radicalmente diferentes das anteriores. Serão disputadas entre pesos pesados da política e não têm um vencedor garantido à partida, por muita qualidade que tenham os putativos candidatos.

À esquerda a questão será pacifica, com António Costa a tentar completar a “carreira natural”, já livre do peso do Governo, sem ninguém que verdadeiramente lhe possa perturbar os planos. Fruto do modo como Costa gere o poder, não há à esquerda um único nome forte que lhe ensombre para já os planos. Caso não queira, ou não possa, só Santos Silva se poderá perfilar. Santos Silva é o Paulo Portas da esquerda, frio, cerebral, intelectualmente superior, com menos poder de sedução é certo, e com tantas simpatias nos próximos quantos os ódios que gera fora do seu espaço político. Não partirá com a vantagem de Costa, não é o desejado da esquerda, mas é um candidato de respeito. Claro que é possível que PC e BE apresentem os seus tradicionais figurantes, mas até essa aferição habitual pode cair, para evitar comparações com as forças emergentes à direita. Costa pode mesmo fazer o pleno à esquerda partidária na primeira volta, que encenará uma frente unida contra um perigoso direitista.

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À direita a questão é bastante mais complexa. Há, com enorme visibilidade, um naipe de quatro personalidades com perfil presidenciável. Como é normal nestes processos, os que alcançam uma maior fatia do eleitorado evitam falar do assunto e não manifestam disponibilidade a esta distância, enquanto os que têm menos condições naturais trabalham há muito arduamente para ultrapassar as suas limitações. Vejo no primeiro grupo naturalmente Pedro Passos Coelho e Rui Moreira e no segundo grupo Paulo Portas e Luis Marques Mendes.

Os quatro nomes da direita, diria que dois desejados e dois com muita vontade, são nomes de quatro políticos de alta qualidade, com percurso e provas dadas, um sinal de esperança para a tão necessária recredibilização das Instituições.

Passos Coelho e Rui Moreira são ambos sinais de determinação, seriedade, obra feita e, acima de tudo, coragem e carácter. A distingui-los politicamente, está uma visão mais liberal do mundo de Passos e a dedicação de Moreira ao social e a paixão pela cultura. Passos Coelho poderá ter uma vantagem competitiva numa certa capitalidade, Rui Moreira compensará com o apoio de um país que se sente adiado e esquecido face a essa capitalidade. Passos Coelho mobilizará a direita em peso, Rui Moreira tem fortes possibilidades de penetração no eleitorado de esquerda, como se tem visto no Porto.  Se perguntarmos às pessoas na rua quem preferem destes quatro nomes, diria que Passos e Moreira são os desejados, as suas qualidades naturais não se inventam, nem fabricam, a identificação com o povo é mais forte porque é mais natural. Talvez por terem o tempo a seu favor, talvez porque esta é uma decisão magna de vida que exige muita ponderação e reflexão, talvez porque são pessoas que não se deixam impressionar e condicionar, nenhum dos dois deu qualquer sinal ou admitiu disponibilidade. Marcelo, atento ao povo, já disse de ambos que ocupariam muito bem a cadeira que é transitoriamente sua.

Paulo Portas e Marques Mendes jogam noutro campeonato, mas não têm menos mérito por isso. Ambos querem muitíssimo e fazem pela vida com afinco, o que é sempre de registar e respeitar. O percurso de Portas e Mendes é medido ao milímetro enquanto se medem mutuamente. Portas é de uma inteligência invulgar, de uma cultura notável e de uma astúcia política incomum; como passivo, tem um passado onde cultivou inimigos poderosos, desbaratou constância e permitiu-se por diversas vezes ser visto como pouco confiável. Tem uma enorme simpatia em muitos meios da direita, alguma desconfiança em gente do centro e ódios figadais à esquerda. Marques Mendes é o trabalhador metódico e incansável, com uma imagem que não faz jus à sua inteligência e ao instinto político apurado que tem. Se Portas é um sedutor natural, Mendes tem o charme de um contabilista na pré-reforma, se Portas discorre com à vontade sobre os grandes pensadores, imaginamos mais Mendes socorrer-se de uma tirada de Cavaco Silva, se Portas provoca e sabe provocar impacto, Mendes luta para não provocar sono. Nesta liga, diria que Paulo Portas é o candidato mais mobilizador e mais capaz de fazer a vida difícil ao candidato da esquerda.

Por fim, falou-se, e ainda há que insista em falar, na hipótese Gouveia e Melo. O próprio Almirante terá ficado visivelmente deslumbrado com o estatuto de hipótese. Tal possibilidade nasce de um equívoco; num país habituado a falhanços, houve grande espanto ao ver um militar fazer aquilo para que foi formado e treinado. Gouveia e Melo cumpriu a sua missão, como muitos dos seus camaradas teriam cumprido; as nossas Forças Armadas têm quadros bem preparados e de grande qualidade. A competência profissional não implica acesso directo a Belém. Mais importante, os cargos políticos devem ser exercidos por políticos, as figuras militares salvíficas não fazem sentido numa democracia madura onde, como vimos, dispomos de actores políticos de qualidade e com experiência. Deixo, assim, Gouveia e Melo fora deste lote de seis verdadeiros presidenciáveis.

Em política, o tempo que nos separa das próximas presidenciais é uma eternidade, mas o estatuto de presidenciável precisa de um tempo que já não cabe no tempo que falta, por isso, estes são os seis homens, indo ou não a jogo, independentemente das voltas que o mundo dê.