O mercado imobiliário tem um peso significativo na economia, tanto como reserva das famílias e dos fundos de investimento (refúgio de investidores em tempos de crise), como método de poupança já que quem compra habitação própria consegue uma poupança, em média, de 100.000 euros em 30 anos superior a quem não compra. Temos ainda bem presente a crise do sub prime de 2008 e os danos colaterais que provocou em toda a economia.
As notícias que lemos na imprensa, nomeadamente nos cadernos económicos dos jornais, dão-nos conta de que os preços estão a subir e que há uma valorização do imobiliário, permanente, consistente e sem retorno. Nada mais errado. Por norma estas afirmações são corroboradas pela subida dos valores médios (que supomos serem os das transacções), a estatística do frango.
Nestas “análises”, certamente por falta de tempo, os articulistas esquecem 80% do país, a generalidade dos Centros Históricos e os invendáveis (mesmo nas grandes cidades).
Também têm vindo a ser “valorizados” imóveis com intervenções que podem colocar em risco todo o edificado, por retirada de paredes portantes, por aumento das cargas actuantes, tudo sem controlo camarário já que numa leitura muito liberal da legislação é entendido que “as obras dentro das fracções não necessitam de processo camarário”.
A diferença entre valor e preço não é tida em conta, muitos ignoram-na e outros desconhecem-na. Assim, em todo o processo que envolve a compra e venda de imóveis ou investimento nestes, os únicos elementos que podem avaliar (o valor e não o preço) são os PAI (peritos avaliadores de imóveis).
Um PAI é um técnico que, além de um curso na área (por norma em engenharia ou arquitectura), possui uma pós graduação específica em avaliação imobiliária e anos de experiência. Só conjugando estas três competências tem acesso à inscrição da CMVM e o direito de fazer avaliações para a banca.
Presentemente existem 1676 PAI. Não é bem assim já que neste número existem empresas, o que considero manifestamente errado, já que não é possível comprovar se quem lá trabalha tem a competência necessária ao desempenho da profissão.
Os bancos também não percebem a diferença entre valor e preço e o resultado é chegar a ser entregue ao PAI 35,00 a 40,00 euros por avaliação e 20,00 por vistoria – perto de 10% do que cobram aos clientes.
Eis um exercício que devia ser feito, a determinação do valor (não o preço) de uma avaliação: um perito qualificado entra num prédio, constata que apresenta fissura que podem ser sinal de assentamento, ou manchas ténues nas paredes ou tectos que podem ser infiltrações, vê um vão onde já houve uma parede que deve suportar todas as que lhe estão em cima, vê ainda a envolvente do prédio, o enquadramento social da zona, os riscos (proximidade de linhas de água ou outros), regressa no carro que comprou (ou que está a pagar), a consumir combustível a 2,00 euros o litro, ao escritório cuja renda paga, abre o computador que comprou por 1000,00 euros, liga-se à net que também paga, liga a luz e o aquecimento, liga a máquina fotográfica ao computador e pousa o telemóvel de onde fez as marcações das visitas e começa a amortizar o curso de engenharia que custou uns milhares aos pais e a especialização que também foi cara. Faz uma análise do mercado do imobiliário, tenta perceber os juros das contas a prazo e outros investimentos para definir o yield e ajustá-lo ao risco daquele imóvel em concreto. Pelo caminho paga a quota anual à CMVM, o seguro (obrigatório) de responsabilidade civil. Demora o seu tempo. Conclui o relatório e envia-o por mail ou coloca-o numa plataforma. Passado uma hora recebe um telefonema do banco ou da empresa que o contratou a pedir esclarecimentos. Finalmente envia a nota de despesa, 35,00 euros mais IVA, menos 25% de retenção na fonte. Espera ter sorte este mês e receber em menos de 60 dias. O PAI produz também implicitamente no seu relatório um due delligence que a nossa legislação não impõe.
Num mercado em que os custos têm subido, o preço do trabalho dos avaliadores mantém-se, há anos, apesar do seu valor subir e muito.
É importante que tanto a CMVM como o BP se debrucem sobre este problema e percebam a razão de ser da greve que os PAI levam a efeito.