O problema da imigração é o problema mais sério que a União Europeia enfrenta. É ainda mais grave do que o Brexit (que já foi de resto causado pela imigração) e do que as desigualdades da zona Euro. Os partidos políticos que beneficiam do voto anti-imigrantes constituem hoje a maior ameaça à integração europeia. Mas usar o termo fascismo para os descrever, como fazem muitos à esquerda, revela, simultaneamente, ignorância sobre a história da Europa e um julgamento político muito pobre. Vamos esquecer a história e olhar para a questão política.
O que terá ainda de acontecer para os “anti-fascistas” entenderem que a diabolização do adversário político não serve de nada. Não aprenderam com a vitória de Trump nos Estados Unidos? Não perceberam o que se passou com o Brexit? Não retiraram lições da ida de Marine Le Pen à segunda volta, do resultado eleitoral da direita alemã anti-imigração e da vitória do M5 Estrelas e da Liga em Itália? Ainda não entenderam que o eleitorado já não tem medo da diabolização feita pela imprensa e pelas elites intelectuais e políticas?
Os governos europeus das últimas duas décadas são os grandes culpados pelo crescimento do problema da imigração. Todos eles, sem excepção, sabiam que seria apenas uma questão de tempo até a imigração se tornar num sarilho complicado. Entre 2006 e 2012, em Bruxelas, assisti e participei em inúmeras discussões e reuniões sobre a imigração. Toda a gente, da esquerda à direita, tinha consciência do problema. Mas ninguém quis tomar decisões difíceis e todos preferiram continuar a fingir que “acreditavam” no “multiculturalismo” e na “integração dos imigrantes”. O problema da imigração é o resultado de um dos maiores falhanços dos governos europeus nas últimas duas décadas. As responsabilidades estão repartidas entre as esquerdas e as direitas.
Tanto as esquerdas como as direitas fizeram cálculos políticos com os votos dos imigrantes. Discordo daqueles que falam apenas das esquerdas. É verdade que muitos partidos de esquerda viram no “voto étnico” uma oportunidade de crescimento eleitoral. Mas à direita também houve quem acreditasse que poderia beneficiar do voto conservador das famílias imigrantes. Ouvi várias vozes da CDU e dos Tories a defenderem a oportunidade de captar o voto religioso da maioria dos imigrantes.
As esquerdas já estão a pagar desde há uns anos pela traição do “multiculturalismo” aos interesses das classes trabalhadoras. Os partidos de esquerda, apesar da retórica radical, aburguesaram-se e abandonaram os operários e os camponeses, os quais votam agora em Le Pen, em Salvini, na AfD e no Brexit. Iglesias do Podemos e Vourofakis são bons exemplos de burgueses radicais que pouco dizem à classe trabalhadora. Se alguém julga que a acusação de “fascismo” vai mudar o sentido de voto dos órfãos das esquerdas, estão completamente enganados. Por sua vez, os partidos de direita estão agora a pagar o preço pelas irresponsabilidades das últimas décadas com a fuga de muito eleitorado das classes médias que privilegiam a ordem e a segurança para os novos partidos anti-imigração.
O crescimento dos partidos anti-imigração tem uma única virtude: já não é possível ignorar o problema. Veja-se o que se passa na Alemanha e em França. Desafio aliás os “anti-fascistas” de pacotilha a olhar para as políticas anti-imigração de Macron, antes de chamarem fascistas a Salvini e ao novo chanceler austríaco. Ninguém tenha dúvidas, os partidos dos centros políticos vão intensificar a luta contra a imigração. Macron já começou e Merkel também irá fazê-lo.
Os novos partidos anti-imigração oferecem a justificação necessária para os governos alemão e francês adoptarem políticas de imigração muito mais duras e restritivas. Merkel e Macron sabem que não há outra maneira de recuperar os votos perdidos para o AfD ou de continuar a derrotar Le Pen. Isto não é fascismo. Chama-se competição democrática pelos votos dos eleitores europeus. O futuro da União Europeia depende da capacidade de Macron e de Merkel de ganharem essa luta democrática.