No dia 28 de novembro de 2018, decorreu a primeira reunião e apresentação do projeto para a criação de uma Área Marinha Protegida de Interesse Comunitário (AMPIC) na Baía de Armação de Pêra. Desde então, o CCMAR – Centro de Ciência do Mar da Universidade do Algarve, em colaboração com a Fundação Oceano Azul e as Câmaras Municipais de Albufeira, Silves e Lagoa, associações locais de pescadores, marítimo-turísticas, administração regional, laboratórios do Estado, organizações não-governamentais e demais parceiros sociais têm vindo a promover várias reuniões consultivas onde são debatidas as bases deste projeto.
No entanto, é necessário perceber a dimensão da área em causa, entender que a mesma se encontra balizada entre o Farol da Alfanzina (concelho de Lagoa) e a Marina de Albufeira, alcançando o seu maior registo a cerca de trinta metros de profundidade (Fig.1) englobada numa área de 94,5 quilómetros quadrados.
Os objetivos associados a esta AMPIC na Baía de Armação de Pêra (BAP) pretendem a defesa de um dos maiores recifes naturais existentes a nível nacional e,à semelhança de outras áreas protegidas, reforçar a necessidade da preservação ambiental, da biodiversidade marinha, dos berçários, a luta e fiscalização contra ações de pesca ilegal, manutenção e reforço da tradição e cultura local, entre outros.
Perante este reconhecimento, este artigo de opinião fundamenta os seus princípios e valores em linha com medidas de sustentabilidade dos recursos e da questão humana, contudo, não pode tolerar a implementação desta área protegida, assim como se apresenta e na forma proposta ao longo das seis reuniões estimuladas por este quadro de intervenientes.
É demasiado abrupto e irresponsável condicionar de um momento para o outro uma área extensa, possuidora de diversos pesqueiros fundamentais para a sobrevivência das comunidades piscatórias locais e até de outros portos urbanos de alguma distância, tal como Quarteira, cujas embarcações se deslocam para estes mares mais rochosos pela existência de diversas espécies de peixes, entre as quais o Salmonete (uma espécie de elevado valor). Provando-se, sem sombra de dúvida, a importância maior deste pesqueiro no contexto regional-centro.
A ser aplicada esta AMPIC-BAP, ela reduziria consideravelmente a área de pesca e só permitiria a mesma a um determinado número de embarcações de “boca aberta”, em detrimento das embarcações de convés e artes licenciadas, entre as quais os covos (polvo), anzol e só autorizando embarcações até sete metros. Esta noção é altamente discriminatória, possuindo potencial para criar conflitos dentro das comunidades piscatórias que, logo, deverá ser tido em conta e acautelado.
Todavia, existem sempre alternativas e dentro de um espírito de abertura, cooperação e busca de soluções face a esta matéria, acreditamos que o CCMAR e demais parceiros deverão considerar a seguinte proposta:
Na (Fig.2) podemos vislumbrar um mapa da AMPIC-BAP dividido em três fases fundamentais.
A primeira fase, (a vermelho), seria considerada uma fase piloto, circunscrita entre a Senhora da Rocha e a Galé, a Norte do mar do Valado e das Celas, e dentro de um período de observação estipulado entre três a cinco anos para registar as alterações no dito ambiente marinho, a progressão da biodiversidade e respectivos berçários, e, em conjunto com os pescadores, determinar se nas áreas circundantes à primeira fase é registado um aumento do stock de pesca.
Perante esta forma faseada, paulatina, de entendimento com os profissionais da pesca e o saber científico, caminhar para uma melhor e mais equilibrada defesa deste recife natural. E só então, avançar, com conhecimento de causa para uma segunda fase (em azul) e, quem sabe, se for necessário, implementar a terceira fase (a verde), mas ciente, que em cada implementação das fases, terão que existir fundos e mecanismos apropriados para as respetivas compensações aos pescadores.
Há que prevalecer a noção da ancestralidade do Homem do Mar nestes territórios onde desenvolve a sua atividade, pois, décadas de pesca nesses locais, permitiu-lhe reunir um conhecimento inestimável, a nível do largar da rede, onde e quando, de forma a não destruir a sua arte de pesca nestes ambientes rochosos. Por isso, é de lamentar que em pleno período de pandemia, no atual segundo confinamento, quando os pescadores e as comunidades piscatórias lutam pela sua sobrevivência face aos malefícios da Covid-19, o CCMAR se encontre numa posição de levar a cabo uma sessão final por webinar (5 fevereiro), onde será apresentado, leia-se: “Estudo Mapeamento e valoração das atividades suportadas pela costa de Albufeira, Lagoa e Silves” e Apresentação da proposta final de criação da AMPIC (CCMAR)”, o qual terá um período entre 5 e 12 de fevereiro para respostas a eventuais pedidos de esclarecimento, considerando que até ao final do mês de fevereiro a proposta de criação da AMPIC-BAP será entregue para apreciação do Governo e respectiva consulta pública. Mas é importante questionar, se neste momento, em que os pescadores só estão focados em sobreviver, não será possível alterar este evento para uma data mais apropriada? Fica o desafio.
Em suma, perante este processo da AMPIC-BAP, concretizo a imperiosa necessidade da existência de um apoio científico e legal para os pescadores e respectivas comunidades, que lhes permita argumentar de igual para igual, de forma mais concreta e científica, as condicionantes associadas à sua atividade, não colocando em causa o bom intuito da proposta do CCMAR e respectivos parceiros, mas demonstrando de forma capaz a existência de outras alternativas, não tão imediatas e aparentemente revolucionárias como esta à qual se predispõe este projeto.