É urgente que o Governo estipule a partir de que data termina o Programa Golden Visa Portugal e igualmente quando prevê que as renovações de autorizações de residência obedeçam aos critérios propostos pelas medidas Mais Habitação.

A ausência de uma referência temporal no momento em que foram apresentadas estas medidas serviu exclusivamente para lançar o pânico entre os investidores e entidades relacionadas com este Programa, nomeadamente promotores imobiliários, fundos de investimento e empresas ligadas à imigração. Quantos dias são necessários para que o Governo clarifique estas matérias?

O princípio da segurança jurídica pressupõe um mínimo de previsibilidade, estabilidade e certeza na aplicação das normas jurídicas visando, assim, proteger a confiança dos cidadãos no Estado de Direito Democrático e censurando alterações súbitas ou arbitrárias de normas em cuja continuidade os cidadãos tenham depositado expectativas legítimas.

No entanto, o Governo “esqueceu-se” deste princípio e além de – volvidos tantos dias –  não apresentar qualquer data para o fim da concessão de novos Vistos Gold faz algo ainda pior: refere que os titulares autorizações de residência emitidas com base num investimento imobiliário, só poderão renovar os seus cartões de residência quando utilizem o imóvel como sua residência própria (o mesmo se aplica quando sejam os seus descendentes); ou quando a sua propriedade seja colocada no mercado de arrendamento duradouro (não clarificando o que isto significará na prática).

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Pergunto: Quem quer investir num país em que as regras do jogo podem mudar a qualquer momento?

Este Programa existe desde outubro de 2012 e as regras relativamente à sua estrutura nunca deveriam ser alteradas, pois o mesmo pressupõe a manutenção da propriedade por parte dos investidores por um período mínimo de cinco anos. Um cidadão de nacionalidade estrangeira ou não-residente, adquire um imóvel em Portugal e para ter  acesso a uma autorização de residência, compra uma casa, paga todas as taxas (escritura, condomínio, seguros), emolumentos do SEF e impostos inerentes ao “estatuto” de proprietário (IMT, IS e IMI), mais as obras que eventualmente faça;  tem uma casa que é sua há anos, não possui dívidas ao Estado e agora o Governo diz: ou vem viver para cá ou coloca a casa a arrendar por mais de um ano, uma vez que tudo o que vigorava até ontem, hoje já não se aplica, caso contrário o seu cartão de residência é cancelado.

Note-se que o Programa pressupõe, que o investidor permaneça, no mínimo, 7 dias por ano em Portugal. Ora, a aplicar-se esta nova regra, o mesmo não poderá sequer utilizar o seu próprio imóvel, pois estará arrendado.

O Governo criou assim um novo “jogo”, sem manual de instruções, mas cujo objectivo final é simples: o investidor compra uma casa em Portugal e durante cinco anos não a pode usar sequer para cumprir com os mínimos de permanência, obrigando-o a reservar um hotel ou um qualquer alojamento de curta-duração se até então o Alojamento Local existir.

Segundo os dados apresentados em novembro de 2022 no Relatório de Estabilidade Financeira, do Banco de Portugal, o volume de negócios no mercado imobiliário envolvendo cidadãos não-residentes atingiu quase 30 mil milhões de euros até junho de 2022. O valor captado de investimento direto estrangeiro em Portugal por via do Programa Golden Visa é de quase 7 mil milhões de euros. Creio que estaremos todos de acordo quando se constata que o investimento estrangeiro em Portugal é absolutamente necessário para o normal funcionamento da nossa economia. Uma medida desta natureza, estruturalmente disruptiva, configura-se muito negativa para a imagem do País e podemos vir a assistir a um efeito contagiante noutras formas de investimento além do imobiliário.

Acredito que esta é uma medida inconstitucional, que não deverá chegar a vigorar, mas a mera sugestão é verdadeiramente assustadora.

O Governo quer “esquecer” os princípios que regem a nossa Constituição, “não tem memória” do que prometeu aos investidores estrangeiros e propositadamente, “não tem presente” as milhares de pessoas que estão envolvidas neste Programa e cujos empregos podem estra em risco; no meio disto esquece-se que existem outros interessados (portugueses ou estrangeiros) a olhar para tudo isto e a pensar muito bem se ainda valerá a pena investir o seu dinheiro num País que não cumpre com a sua palavra.

Outro aspeto que convém esclarecer é o seguinte: vamos imaginar que o investidor coloca o seu imóvel no mercado de arrendamento de longa duração, a fim de conseguir renovar o seu cartão de residência, mas não o consegue arrendar, pois ninguém se mostrou interessado. Perde o direito a ter um cartão de residência em Portugal? Ou é obrigado a ter como inquilino o Estado que por sua vez o poderá subarrendar?  Onde é que queremos chegar exactamente?As medidas propostas são perigosas a nível jurídico, ético e moral.

Vamos entrar num momento de “discussão pública” e o Governo ouvirá algumas “entidades” e “especialistas”.  Seria interessante que ouvisse os mais de 10 mil investidores e os milhares de portugueses que direta ou indiretamente trabalham estas matérias que vão ser prejudicados  e perceber o que têm a dizer sobre o País e de que forma o vão publicitar futuramente. Eu preferia esconder-me para não ouvir.