Vale a pena começar por lembrar que a divulgação anual da média dos resultados obtidos em exames nacionais, seriados de forma decrescente por estabelecimento de ensino – os famosos rankings – são consequência de uma decisão da Comissão da Acesso aos Documentos da Administração que, em 2001, obrigou o Ministério da Educação a disponibilizar os dados dos exames, por escola. Uma decisão, portanto, que quebrou a exclusividade do Ministério da Educação no acesso aos resultados globais das aprendizagens dos alunos.

Apesar de hoje existir capacidade para produzir e analisar mais e melhor informação, a verdade é que a ditadura do politicamente correto, aliada a uma certa atitude de (suposta) superioridade moral, tem vindo aos poucos a tomar conta do sistema educativo e a impor um “novo padrão”, que pode e deve ser questionado. Se a escola é espaço de liberdade, então, por definição, deve ser palco de diálogo, de debate e de discussão, e não de imposição de visões estritamente ideológicas. Dir-se-á que a escola reflete o espírito do tempo, a ideologia de quem governa e o sistema e código de valores de quem é detentor do poder.

Ora, sendo verdadeira esta visão das coisas (a realidade tem-no demonstrado), o normal seria que, em democracia, se procurasse imunizar a escola do contágio ideológico e deixar à educação o que é próprio da educação. Se ao clima de conflitualidade existente entre professores e governo, por motivos salariais e de progressão nas carreiras, juntarmos as mudanças recorrentes, pouco estruturadas e estudadas que se têm sucedido, obtemos uma mistura explosiva.

A educação em Portugal parece um cocktail molotof, prestes a rebentar a qualquer momento. Às contestações e greves recorrentes (afinal a austeridade mantém-se!), sucedem-se alterações que deixam as comunidades educativas com os cabelos em pé. Desde que foi aprovada pela coligação parlamentar das esquerdas unidas o fim das provas finais do 4.º ano, a sucessão de trapalhadas avulsas não tem parado. Parece longe aquele ano letivo de 2015/16, mas quem o viveu nas escolas lembra-se bem do caos que foi criado com essa precipitação parlamentar da geringonça decidida logo no dia inaugural da nova maioria. A mais recente trapalhada tem poucos dias de vida e visa acabar com os exames do 9.º ano. Se isto continua, qualquer dia acabam também os exames no 12.º ano e todos os alunos frequentarão livre e gratuitamente (outra trapalhada monumental) o ensino superior estatal, no curso que bem entendam, também sem nunca chumbarem!

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É preciso travar este estado de coisas e esta precipitação sistemática, que afeta o sistema educativo como um todo, incluindo o Ensino Particular e Cooperativo, que foi quem ofereceu a inspiração necessária para aquela que é a medida verdadeiramente estrutural e positivamente consistente tomada pelo atual governo, com a publicação do decreto da autonomia e flexibilidade curricular. As boas práticas do ensino particular, aliás, a inovação que lhe é reconhecida e a qualidade dos projetos educativos e das propostas pedagógicas diferenciadas são um ativo importantíssimo do nosso sistema educativo, pela sua riqueza e diversidade de oferta. Fez bem a escola pública estatal em inspirar-se nos colégios. Mas, convenhamos, acabar com os exames em final de ciclo é um expediente para acabar com os rankings.

Ora os rankings, ao contrário do que os seus fervorosos detratores defendem, não servem para mostrar quais são as melhores, ou as piores, escolas. Os rankings servem, tão só, para mostrar quais as escolas que melhor e pior pontuaram nos exames nacionais em dado ano letivo. Felizmente, existem outras fontes de informação sobre as escolas, designadamente sobre o indicador de percurso de sucesso dos alunos, um ranking complementar e útil. Se os rankings oferecem uma fotografia, o indicador de percurso oferece um filme. Ambos são muito importantes e não se excluem, antes se complementam. Ao contrário de quem desvaloriza e quer acabar com os exames nacionais e com os rankings, eu acredito no valor da informação como fonte de liberdade. Esta, para os que têm menos recursos económicos, é infelizmente pouco relevante, pois ficarão circunscritos à escola da sua área de residência. E, pelas notícias que todos lemos sobre as “moradas falsas”, percebemos como os pais e os encarregados de educação se esforçam para encontrar a melhor educação para os seus filhos. Baseados, claro, nas informações que existem e que por estes dias ocupam o espaço das notícias. Mas sem recursos económicos, de pouco lhes serve a informação! Assim, acaba-se com a informação e aperta-se a malha aos que ousam tentar uma escolha diferente da que é imposta pelo Estado.

Acredito, verdadeiramente, que a Educação é o mais importante nivelador social. É a escola que, em boa parte, permite libertar o potencial de cada criança e jovem e abrir-lhe um novo destino e um futuro com mais esperança. Ao acabarmos com os exames, ao extinguirmos os rankings, ao criarmos ghettos educativos onde o local onde se vive se sobrepõe a uma escolha consciente, livre e informada da escola, estamos a ceder aos grilhões de uma ideologia sem sentido e a consentir a perpetuação de um sistema que muito pouco, ou quase nada, vai ao encontro do que o país precisa.

Como já escrevi, os rankings não devem ser, e não são, um fim em si mesmo, mas são um indicador nacional que importa compreender e valorizar. Para tanto, é preciso obter e cruzar, com rigor e método, muitas outras informações, algumas que já existem (origem socioeconómica dos alunos, taxas de retenção), outras que nem por isso – nomeadamente a avaliação dos professores, que é inexistente nas escolas estatais. E, no fim, ser capaz de interpretar a informação, sem desvio ou condicionante ideológica, pondo os alunos e as famílias como a verdadeira prioridade do sistema. No dia em que isto acontecer, teremos um sistema educativo – e, por conseguinte, um Portugal – muito melhor.

Vice-Presidente – Associação Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP)