Com a popularização da Inteligência Artificial (IA), surgiu a preocupação, sobretudo por parte dos professores, com o facto de os estudantes poderem utilizar o tão badalado “ChatGPT”.
Tudo leva a crer que a IA seja decisiva para o futuro da humanidade, importando compreendê-la e prever o seu impacto. No tocante ao ensino, como os sistemas de IA são desprovidos de emoções e desejos, respondendo apenas a perguntas e realizando tarefas unicamente baseadas no treino recebido, sem qualquer intenção ou motivação própria (pelo menos por enquanto), aproveitei essa “honestidade desinteressada” para saber qual a opinião do ChatGPT acerca do seu próprio valor pedagógico.
Para tal, comecei por colocá-lo na pele adequada ao efeito pretendido:
Eu: “Você é um pedagogo interessado no sucesso da evolução académico-profissional dos estudantes e deverá responder nessa qualidade.
Tendo em conta a acessibilidade do ChatGPT, estamos perante um sistema de inteligência artificial que pode ser usado para os estudantes copiarem. Qual a sua opinião sobre isso?“
ChatGPT: “Como pedagogo, acho que a possibilidade de os estudantes usarem o ChatGPT para copiar é preocupante, pois prejudica a sua evolução académica e profissional. A capacidade de realizar pesquisas, resolver problemas e desenvolver habilidades de pensamento crítico são habilidades importantes que os estudantes devem desenvolver para serem bem-sucedidos em sua carreira acadêmica e profissional. Se os estudantes estão apenas copiando respostas do ChatGPT, eles não estão aprendendo a realizar pesquisas e desenvolver suas próprias ideias.
Portanto, é importante que os pedagogos ajudem os estudantes a entender que o ChatGPT deve ser usado como uma ferramenta de pesquisa complementar, mas não como uma fonte exclusiva de informações. É importante incentivar os estudantes a desenvolver habilidades de pensamento crítico e resolução de problemas, buscando fontes adicionais e avaliando a informação de maneira crítica antes de usá-la.
Em resumo, a utilização do ChatGPT pode ser útil para os estudantes, mas é importante que eles saibam como usá-lo de maneira apropriada e evitem usá-lo para copiar respostas.”
Concordo com esta opinião e julgo que a utilização do ChatGPT só deve ser interdita na academia durante as provas de avaliação. Assim, decidi ir um pouco mais longe e perguntar-lhe qual o tipo de utilização que recomendaria aos estudantes:
Eu: “Ainda na qualidade de pedagogo, refira a forma mais apropriada de utilização do ChatGPT pelos estudantes.“
ChatGPT: “Como pedagogo, acredito que a forma mais apropriada de uso do ChatGPT pelos estudantes é como uma ferramenta complementar de pesquisa, e não como fonte exclusiva de informações. Os estudantes devem ser incentivados a usar o ChatGPT como um meio de obter informações iniciais sobre um assunto, mas devem sempre buscar fontes adicionais e avaliar a informação de maneira crítica antes de usá-la.
Além disso, é importante que os estudantes sejam incentivados a desenvolver suas próprias habilidades de pensamento crítico e resolução de problemas, e que usem o ChatGPT para reforçar e complementar o que já aprenderam. O ChatGPT pode ser uma ferramenta útil para ajudar os estudantes a entender conceitos complexos, responder a perguntas específicas ou para apoiar a realização de projetos de pesquisa.
Em resumo, o uso do ChatGPT deve ser visto como uma oportunidade para os estudantes desenvolverem suas habilidades de pesquisa e pensamento crítico, e não como uma solução fácil para obter respostas sem esforço.”
Já esperava a rapidez e objetividade das respostas do ChatGPT, reforçando a minha convicção de que a popularização da IA irá alterar o mundo, tanto no ensino como em muitas outras áreas, senão vejamos: O conhecimento humano avança por dois caminhos: (i) através da formulação de leis gerais que explicam ocorrências particulares (dada a lei da gravidade, concluímos que um determinado objeto irá cair); (ii) através da observação de ocorrências particulares para delas tirar conclusões gerais (observando muitas zebras listradas, concluímos que todas o são). Assim, enquanto o método dedutivo se baseia em conclusões gerais para explicar casos particulares, o método indutivo baseia-se em casos particulares para chegar a conclusões gerais. Nesta última situação, os dados observados chamam-se “conjunto de treino”, sendo este o método seguido pela IA.
É por isso que o ChatGPT e outros sistemas de IA se vão tornando mais inteligentes à medida que o volume de dados processados aumenta. É esse treino incessante que determina a inteligência de máquinas tão “estúpidas” como simples interruptores, só capazes de distinguir dois sinais e perceber unicamente se estão “ligadas” ou “desligadas”. No entanto, mesmo sabendo interpretar apenas o descomplicado código binário, os computadores têm a enorme vantagem competitiva de lidar com a informação à velocidade da luz; como sugestivamente referiu Steve Jobs, cofundador da Apple, um processamento de dados muito rápido aparenta realizar magia.
Sendo assim, não admira que os utilizadores do ChatGPT fiquem espantados ao verem as suas perguntas respondidas depressa e bem (ao contrário do ditado popular). Mas nem tudo são rosas, e não é impunemente que se abdica do raciocínio dedutivo. Por vezes, as respostas de mão beijada pelo ChatGPT são pouco rigorosas ou até erradas, defeito que eu não poderia deixar passar em claro no curto diálogo com a inteligência artificial.
Eu: “Quais as principais fragilidades da dependência exclusiva do método indutivo na construção do conhecimento que vai sendo articulado nas respostas do ChatGPT?“
ChatGPT: “A dependência exclusiva do método indutivo na construção do conhecimento pode levar a conclusões incorretas ou inadequadas, já que ele se baseia em exemplos anteriores para prever o resultado futuro. Além disso, o método indutivo não é capaz de fornecer provas conclusivas e definitivas para uma teoria ou hipótese. Por fim, a dependência exclusiva do método indutivo pode limitar a capacidade de se descobrir novos conhecimentos ou perspectivas inovadoras.”
São, pois, várias as limitações da IA. Na verdade, mesmo que os problemas derivados da falta de rigor se atenuem com o expectável aumento da capacidade de computação e a crescente dimensão dos referidos “conjuntos de treino”, a inibição do desenvolvimento do pensamento crítico e subsequente atrofia da capacidade de identificação e resolução de problemas, aconselham a que os estudantes usem o ChatGPT criteriosamente e nunca como fonte exclusiva de informações. Mas daí a considerar o ChatGPT inadequado para coadjuvar o estudo e a investigação, vai uma grande distância (já para não falar nos investigadores com o pensamento crítico bem desenvolvido…).
Finalmente, convém lembrar que o ChatGPT está disponível 24 horas por dia, 7 dias por semana, oferecendo respostas imediatas às perguntas que lhe são colocadas, o que pode aumentar a motivação e o envolvimento dos estudantes na investigação, encorajando-os e contribuindo para a sua autoconfiança e vontade de aprender.
Seja como for, o futuro está ao virar da esquina; a Big Data disponibiliza “conjuntos de treino” cada vez maiores, e não faltará muito para atingir o ponto singular e imprevisível em que a IA suplantará o desempenho da própria inteligência humana. Esta realidade torna a IA tão decisiva para o futuro da humanidade como a tecnologia blockchain. Como tenho alertado, certas tecnologias digitais têm implicações político-económicas cruciais, sendo essencial interiorizar que elas não se classificam pela sua “bondade”, mas sim tendo em conta a respetiva eficácia. As tecnologias não são boas nem más, exigindo-se redobrada atenção quando são especialmente eficazes.
Por isso, não se justificam atitudes hostis para com a IA ou qualquer outra tecnologia, por maior que seja o seu potencial disruptivo. À semelhança da tecnologia blockchain, que veio alterar a génese da confiança e modificar a natureza do próprio dinheiro, a IA é uma tecnologia que exige forte consciencialização política face às respetivas repercussões. É indispensável que a adoção de inovações tecnológicas capazes de influenciar a vida de todos não seja decidida só por alguns. A IA não se compagina com espertezas saloias… Na ausência de uma reforma política profunda, é muito provável que a subordinação de tão poderosas tecnologias aos interesses do costume signifique o fim da democracia e da liberdade.