De há um mês a esta parte que tenho dedicado estas notas à questão da produtividade. Na verdade, não se trata de uma teimosia peculiar, mas antes da importância que atribuo à questão e ao desapontamento com a falta de um compromisso concreto na resolução deste óbice à promoção de maior crescimento económico para Portugal. Como tenho referido e é conhecimento generalizado, o crescimento da produtividade influencia o desempenho económico de vários modos, afetando variáveis como, entre outras, o Produto, o emprego e os salários, temas que têm estado no centro do debate público nos últimos tempos.

Como já ilustrei em artigo anterior, no caso português, o crescimento da produtividade tem sido dececionante ao longo deste século, evidenciando mesmo uma redução após a crise financeira. De facto, e se nos cingirmos ao período pós-Troika, podemos constatar que o PIB real por hora trabalhada cresceu a uma taxa anual de apenas 0,02 por cento entre 2014 e 2018, 82 pontos base menos que a média da OCDE, alargando o gap de produtividade com a generalidade das economias desenvolvidas. Ora, estando Portugal numa situação de relativo atraso, temos inevitavelmente de nos concentrar nas políticas que possibilitarão alterar a tendência pré-pandemia, sob pena de acentuarmos a divergência face aos países que queremos alcançar.

Muitos analistas têm apontado o baixo grau de escolarização da nossa força de trabalho como a razão deste resultado. Não será certamente “a” razão, mas é um fator determinante a par dos habitualmente identificados: pequena dimensão empresarial, dificuldade em criar e manter instituições adequadas, funcionamento deficiente de certos mercados, descapitalização empresarial, funcionamento lento e errático da justiça, baixa qualidade da gestão, etc.. Por outro lado, as referências dos analistas estão em linha com a vasta literatura empírica que aponta no sentido de que investir em educação seja crucial para o crescimento económico (e, também, da produtividade do fator trabalho). Mesmo os estudos mais recentes, que incorporam de forma mais correta a educação inicial e ao longo da vida, assim como medidas da sua depreciação, são praticamente unânimes ao mostrar que aumentos do stock de capital humano levam a melhorias da produtividade dos fatores e do crescimento económico. Não se trata de uma mera correlação, isto é, os países mais desenvolvidos têm maior stock de capital humano, mas sim de uma verdadeira causalidade, no sentido de que o investimento na educação e na formação ao longo da vida conduzem, ceteris paribus, a maiores níveis de crescimento e bem-estar.

Alguns estudos recentes como, nomeadamente, o trabalho da OCDE “A New Macroeconomic Measure of Human Capital Exploiting PISA and PIAAC: Linking Education Policies to Productivity”, de Balázs Égert, Christine de la Maisonneuve e David Turner, mostram que o impacto na produtividade a prazo é muito maior quando há melhorias na qualidade da educação e formação e esta se reflete na melhoria da qualidade do capital humano do que quando há apenas melhorias na dimensão quantidade. A conclusão a tirar é intuitiva: cada euro investido em educação e formação terá maior impacto na produtividade e crescimento a prazo se se tratar de educação de qualidade, com maior impacto nas competências e capacidades dos indivíduos. Esta conclusão pode parecer trivial, mas a verdade é que nem todo o ensino se pauta pelos melhores índices de qualidade e muita da formação profissional não é sequer adequada às capacidades de base dos formandos ou aos seus interesses profissionais. Não basta investir mais, é crucial que se invista melhor.

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Outro resultado importante do estudo acima citado, e com implicações óbvias em termos de políticas públicas, consiste no facto de que os ganhos de produtividade obtidos pelo canal do aumento do stock de capital humano poderem ser de magnitude equivalente aos da melhoria no funcionamento e regulação dos mercados (medindo face à referência dos 3 melhores desempenhos entre os países da OCDE). Só que os ganhos obtidos pela primeira via ocorrem muito mais tarde do que os resultantes da segunda. Ou seja, ainda que de dimensão comparável, aumentos da produtividade serão obtidos muito mais rapidamente no caso de melhoria no funcionamento dos mercados do que no caso dos investimentos em educação.

Do resultado anterior não se deve concluir que os investimentos em educação são menos relevantes ou que há alguma substituição entre umas e outras medidas. Não só os efeitos são cumulativos como os resultados não constituem uma subordinação dos investimentos no aumento do stock de capital humano. É porque os seus efeitos demoram tempo que os países que, como Portugal, investiram acumuladamente menos e começaram mais tarde têm de perseverar, mantendo simultaneamente todo o empenho possível na intervenção sobre os outros canais que conduzem ao desempenho medíocre da nossa produtividade. Só que, como os dados indicam, perseverar no investimento não é apenas gastar. O sucesso das politicas não se mede pelos montantes despendidos mas antes pelos seus resultados: e estes dependem da qualidade do ensino e da formação ao longo da vida que for oferecida. Perseverar no esforço, sim, mas com maior critério e exigência.