A TVDE anunciou há uns meses a introdução da plataforma Pinker. A Pinker será uma plataforma semelhante à Uber ou Bolt, porém apenas será utilizada por e para mulheres. Desta forma só aceitará motoristas e clientes do sexo feminino. A Pinker surge para garantir a segurança das mulheres ao usar este tipo de plataformas, uma vez que, têm aumentado as queixas de mulheres relativamente aos motoristas de veículos descaracterizados. As queixas são principalmente relacionadas com a não correspondência das fotografias da aplicação com a realidade, com motoristas que mudam o trajeto sem aviso ou até motoristas não deixam as passageiras sair do carro.
É de realçar também que os números de violência doméstica têm aumentado ao longo dos últimos anos, o que contribui para um maior medo na utilização dessas plataformas. Segundo dados da PJ, entre janeiro e setembro deste ano, cerca de 344 mulheres foram violadas, um número assustador. Contudo, e não podendo esquecer, a violência e a violação contra homens também tem aumentado (ou então a coragem para fazer queixa é que tem aumentado, e bem) sendo registados nestes meses cerca de 177 violações. Estamos a falar de um país com cerca de 10,5 milhões e cerca de 2 violações por dia. Desde o momento em que estou a escrever este artigo e o momento da sua publicação, sei, infelizmente, que pelo menos duas pessoas foram violadas.
Olhando para estes dados, compreende-se, de modo bastante esclarecedor, que uma mulher não queira correr riscos e sinta-se mais segura quando uma motorista é uma mulher. Eu, após observar estes números, sentir-me-ia mais seguro, se a minha mãe ao chamar um Uber fosse conduzida por uma motorista. Contudo, a criação desta aplicação, por mais compreensível que seja, suscita (e ainda pode suscitar) grandes problemas.
Recorrendo a uma comparação, imaginemos que um ginásio tem sido constantemente assaltado entre as 17:00 e as 18:00. E, para combater isso, invés de investirmos no combate à criminalidade, a solução seria fechar o ginásio das 17:00 às 18:00, oferecendo aos clientes a possibilidade de frequentar outro ginásio a essa hora. Basicamente, é o que a plataforma Pinker vem oferecer. Uma alternativa, uma viagem, em que a mulher “não deverá” ser abordada, pois nem sequer existe um homem. Parte-se, aliás, do pressuposto que uma mulher não poderá cometer um ato violência contra outra e de que todos os homens cometem atos de violência.
Poderá ainda surgir outro problema. Imaginemos que uma grande maioria dos portugueses afirma que não se sente seguro caso seja um indivíduo de outra nacionalidade a ser motorista. Iremos criar uma plataforma da TVDE apenas para motoristas e clientes portugueses? E depois, por exemplo, as pessoas de nacionalidade brasileira só sentem seguras caso o motorista seja também brasileiro. Criaremos outra “alternativa”?
No meu ver, já vivemos numa sociedade tão individualista, tão egoísta, onde reina o interesse próprio e onde existe uma falta de preocupação para com o outro, que este tipo de divisões não ajuda nada para tentar melhorar a situação preocupante da sociedade.
Temos, sim, de ajudar no combater à violência contra os homens e mulheres, de modo, aquando uma pessoa entrar num Uber ou Bolt não tenha qualquer tipo de receio, ou medo. A justiça e o direito têm verdadeiramente de repensar no tema da violência, é necessária uma alteração ao sistema. Temos de aumentar as penas para estes casos, facilitar os meios de prova para estas queixas, aumentar as indemnizações às vítimas e, sobretudo, educar as crianças mais novas que a violência não é nunca a solução.
Caso se cumpram e façam acontecer as medidas supraindicadas, acredito que a violência desça drasticamente. Com a descida, também será possível prescindir deste tipo de plataformas e continuarmos a usar as plataformas como usamos atualmente com um sentimento de segurança. Caso não ocorram este tipo de medidas, podemos preparar-nos para uma sociedade cada vez mais dividida (com ou sem razão) e um retrocesso nos princípios da igualdade e da não discriminação.