Nas áreas da Gestão e da Estratégia das Organizações, é conhecido o dilema que coloca em oposição a hipótese de ser a Estratégia que determina a Estrutura de uma organização, ou de ser a sua Estrutura que determina (e condiciona) a Estratégia que ela pode prosseguir. As conclusões variam de abordagem para abordagem, ou de Escola para Escola, e dependem muito do foco de quem discute o tema. Vem esta referência a propósito do que penso que deveriam ser as competências do futuro Ministério da Agricultura. Neste caso, é para mim claro que serão as competências a determinar, pelo menos em parte, a estrutura do Ministério. Mas não é menos claro que, num Ministério incompetente (literalmente, sem competências), é quase irrelevante qual venha a ser a sua estrutura.

O que defendo em matéria de competências a atribuir a um Ministério da Agricultura dos tempos modernos não é, certamente, pacífico. Tenho mesmo muitas dúvidas que recolha o apoio de algum dos partidos ou coligações que se candidatam a governar o País depois das eleições do próximo dia 10 de março. Mas as boas surpresas podem sempre acontecer. Defendo que o próximo Ministério da Agricultura retome uma abrangência bastante maior do que aquela que tem neste momento (quase uma caricatura de Ministério) e maior, também, do que aquela que alguma vez teve (com exceção do então Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, liderado por Assunção Cristas). Passo a explicar-me, para que possam avaliar a razoabilidade deste meu devaneio.

Assumindo que os temas da Agricultura e da Alimentação são dados como adquiridos neste Ministério qualquer que seja a solução política de Governo (exceto se alguma destas soluções tiver em mente continuar com a desarticulação vivida nos últimos anos, culminando com a sua extinção, algo em que também não acredito), começo pelas Florestas. Continuo a pensar que foi um erro colocar a tutela política das Florestas fora do Ministério da Agricultura. Desde logo porque, em quase todo o território nacional, a separação entre agricultura e floresta está longe de obedecer a uma fronteira clara. Os seus agentes são tendencialmente os mesmos, e desenvolvem atividades que, com frequência, se financiam de forma cruzada em diferentes momentos do tempo. Finalmente, e em conjunto, os espaços agricultados e os espaços florestais são as duas tipologias de atividade que ocupam a maior parte do território nacional.

Em particular, a inclusão das florestas no Ministério do Ambiente, tendo um racional que se compreende (mas com o qual estou em total desacordo) colocou sobre elas um foco exclusivamente centrado em algumas questões ambientais. Não em todas e, seguramente, excluindo desse foco as questões sociais e económicas. De facto, desde esta separação, e sem qualquer ganho aparente, a floresta resumiu-se a sequestro de Carbono e pouco mais. É verdade que a questão do Carbono é relevante, mas tudo o que se fez nesta matéria poderia ter sido feito sem que a tutela da Floresta fosse do Ministério do Ambiente. O exemplo disto mesmo é o recente Decreto Lei que institui os “mercados voluntários de carbono”: poderia ser (como é) um Decreto Lei da responsabilidade do Ministério do Ambiente e Ação Climática, sem que a floresta estivesse sob a sua tutela.

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Este exemplo leva-me à porta de um outro argumento para o que defendo. O Ministério do Ambiente (e das demais competências que se entenda que deva ter) é cada vez mais um Ministério que legisla, regulamenta e fiscaliza os negócios do ambiente (sem que o termo negócio tenha aqui qualquer sentido pejorativo): a água, a energia, o carbono, o lítio, são exemplo disso mesmo. Começa, assim, a ser claramente conflituante o mesmo Ministério ter (e muito bem!) um foco regulamentar nestes negócios, que se sustentam em recursos diversos e, em simultâneo, definir e gerir políticas de fomento das atividades que os utilizam. Mais ainda, quando essas atividades têm, porque tal lhes é intrínseco, uma dimensão económica e social muito relevante.

Assim sendo, defendo que a Conservação da Natureza, que é sobretudo um “produto” das atividades agrícolas e florestais que se desenvolvem no território (em termos de mercado, este “produto” corresponde aos “serviços dos ecossistemas”, que configuram verdadeiros bens público), sendo tutelada pela Autoridade Florestal Nacional (o ICNF) deverá igualmente passar para a tutela deste Ministério de banda larga. Nada como ter o Ministério que tutela as atividades que interagem direta e diariamente com a Natureza (a Agricultura e a Floresta) a integrar nas suas Políticas Públicas as dimensões relevantes para a sua Conservação, remunerando de forma adequada os bens públicos que isso configura. Aliás, estas dimensões já estão integradas na Política mais relevante que Portugal tem para o território e para a Natureza que é a Política Agrícola Comum. Em tempos alguém me apresentou como razão para que a Conservação da Natureza não fosse tutelada pelo Ministério da Agricultura que o “Ambiente” jamais aceitaria perder aquela que, politicamente, foi a sua primeira bandeira. Como argumento acho-o fraco. Prefiro pensar que o racional que apresentei atrás faça algum sentido.

Ficam, assim, indelevelmente ligadas a Agricultura e a Alimentação (assumidas de início), as Florestas e a Conservação da Natureza. Por razões muito semelhantes, e pelos bons resultados que no passado daí decorreram, juntaria ainda a este rol o Mar e as Pescas.

É muito para um só Ministério? Não acho. A conjugação destas áreas sob o mesmo comando Político permitirá ganhos óbvios de eficiência e, o que em Política á muito importante, consideráveis ganhos de eficácia. Necessitaria de um(a) Ministro(a) competente e ousado(a), e de uma equipa de Secretários(as) de Estado à altura.

É tudo? Para mim não seria. Recolocaria as ex-DRAPs (Direções Regionais de Agricultura e Pescas) fora das CCDR e sob coordenação direta deste Ministério. Mas se acredito pouco que a minha ideia de Ministério colha junto dos partidos políticos, muito menos acredito que os poderes locais desses mesmo partidos aceitem largar mão de tanto poder. Mas às vezes, como atrás referi, há boas surpresas…