No futebol em Portugal o resultado está no centro da gestão dos clubes e vale tudo para ganhar. Sendo o futebol um jogo defensivo em que os piores conseguem muitas vezes ganhar, em Portugal o objetivo do jogo confunde-se com a estratégia: não sofrer golos custe o que custar. Assiste-se a uma predominância de equipas a jogar muito perto da sua baliza, jogadores a simularem lesões, inúmeras faltas e treinadores a fazerem substituições já no tempo de compensação, o que faz com que o tempo de jogo útil a oferecer ao adepto seja muito reduzido.

Alimentamos esta cultura primitiva procurando associá-la à determinação e visão estratégica do treinador, escondendo a necessidade básica que este tem de manter o seu posto de trabalho, pois em Portugal o despedimento está sempre a 7 jogos de distância. Este é um futebol medieval de qualidade reduzida e ausência de ética, em que os diretores de comunicação semeiam o caos, os elementos do banco de suplentes gritam como estivessem na guerra e os árbitros são ameaçados de morte. Quando se ganha, o mérito é do processo de treino e parabeniza-se a equipa em público; quando se perde, a culpa é dos outros, não se cumprimentam os árbitros e/ou adversários, e falta-se à conferência de imprensa.

Este posicionamento, estratégico ou não, afasta os adeptos do futebol português. É necessário termos um código de conduta para todos os agentes do futebol que proteja o jogo. Precisamos de um maior equilíbrio competitivo na nossa liga, com maior incerteza nos resultados dos nossos jogos. Urge distribuir as receitas de transmissão televisiva de forma mais equilibrada, oferecendo mais capacidade às equipas pequenas de competir com as grandes, e convidar os nossos treinadores a apostar num futebol de ataque. Temos de reter mais adeptos e durante mais tempo. Da mesma forma que na década de 90 fomos capazes de criar um modelo de jogador português, e na década de 2000 fomos capazes de criar um modelo de treinador português, temos de ser capazes de criar um modelo de futebol português.

A manutenção do foco no resultado afeta também de forma decisiva as receitas operacionais das sociedades desportivas. Considerando que as suas três fontes fundamentais são direitos de transmissão televisiva, comercial e bilhética, e que estas estão intimamente ligadas à relação que os clubes estabelecem com os consumidores através da qualidade do seu produto (i.e., do futebol), o foco no resultado e não no adepto desvaloriza e desprestigia o negócio pois aumenta o fosso entre fornecedor e cliente.

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Hoje em dia Benfica, FC Porto e Sporting não disputam entre si somente a atenção dos adeptos portugueses de futebol. Numa era de globalização, a nossos millenials escolhem ser cada vez mais adeptos do Real Madrid ou do Manchester United. Com a chegada do 5G e a implementação das OTTs de forma decisiva no modelo de negócio dos melhores clubes da Europa, as distâncias entre ligas são cada vez mais curtas, e a fuga de fãs para o estrangeiro é uma realidade cada vez mais iminente.

Deslocar o foco do negócio do futebol do resultado para o adepto também é fundamental para os clubes obterem melhores resultados desportivos. Diz-nos a investigação que a variável que melhor prediz a classificação na liga no final da época é o orçamento dos clubes. Ou seja, potenciar as receitas operacionais do clube é capacitar a direcção desportiva de recrutamento de melhores jogadores, construção de planteis mais competitivos e obtenção de melhores resultados.

Continuar com o foco no resultado é continuar a depender de receitas extraordinárias proveniente de mais valias na venda de jogadores para pagar ordenados ao final do mês. Esta estratégia não é somente uma decisão de gestão de alto risco em absoluto desalinhamento com as recomendações da UEFA, como também um entrave ao alto desempenho desportivo. É impossível manter o desempenho da equipa em altos patamares vendendo (e não retendo) talento dos seus quadros ano após ano. É assim no futebol, como em qualquer outra área de negócio.