Passada as campanhas eleitorais, momentos utópicos ou distópicos, podemos voltar a meter algum racional no tema “habitação”. Para que volte a haver paz neste mercado importa que:
- O preço das casas baixe
- O rendimento das famílias aumente
- Ou ambas as coisas
Em nenhuma das propostas feitas em campanha foram abordadas estas questões menores. Uma das propostas (do livre) era de criar 600.000 fogos públicos, ora o custo de produção de a um valor médio de 180.000€ / fogo (120m2*1500€ sem considerar o valor da terra e os custos incorpóreos) dá 108 mil milhões de euros, qualquer coisa como metade do PIB anual. Mesmo sendo “no longo prazo” parece uma certa falta de realismo.
Também importa tirar o populismo de propostas ocas, eliminar as banheiras e os bidés não reduz o custo das casas, ou não reduz em mais de 400€ da banheira e 80€ do bidé. 480€ num custo global de centenas de milhares de euros é irrelevante.
Os custos com a construção de habitação podem ser divididos, simplificando, em: terreno e construção (os corpóreos), projectos, taxas e impostos (os incorpóreos). Até aqui todos quantificáveis, diríamos “constantes”, finalmente temos uma variável, o tempo, que influencia o custo pelos juros aplicáveis aos custos e pela inflacção que decorre do tempo. Estes custos são aplicáveis a cada metro quadrado de habitação, com uma relação directa, o acréscimo de área implica um acréscimo directamente correspondente do custo.
Se o objectivo é, tem de ser, baixar o custo (e espera-se o preço) da habitação, a primeira atitude tem de ser reduzir a área das nossas casas, comparemos as áreas das habitações construídas há 50 anos e as de hoje e vemos uma inflacção de áreas nunca inferior a 30%.
Ao reduzirmos a área da construção e consequentemente a área (necessária) para a implantação, também estaremos a reduzir os custos, mas podemos ir mais longe. O valor do terreno, fora das zonas premium, situa-se normalmente no intervalo entre os 15 e os 25% do custo da construção. Se o terreno fosse oferecido o custo podia baixar até 25%. Isto é possível e já foi feito, nos anos em que parte da solução da habitação passou pelas cooperativas. Os municípios cediam os terrenos em direito de superfície (que mais tarde acabariam por ser adquiridos). Considerando que quer as Câmaras quer o Estado Central, não tem conseguido construir e dar resposta, é altura de recuperarmos esta solução, mas optimizada. A primeira atitude é a de inverter as normas que, ao arrepio da realidade actual, têm vindo a reduzir a oferta de terrenos “urbanizáveis”, termo que até foi “extinto”, por imposição dos novos PDM. Eu proporia duas modalidades, numa o “clássico”, por um prazo a definir, o segundo na versão de aquisição no tempo, ou seja, considerar um período de 50 anos e um pagamento de 2% ao ano. Se considerarmos o valor mediano (20%) e um valor de construção actual de 1500€/m2, teremos um custo de terreno por m2 de 300€ e uma possível amortização anual de 6€ também por m2.
O valor padrão da construção, que por razões exclusivamente fiscais, é definido por portaria (nº16/2024 de 23 de janeiro) em 532€/m2 tem sido assumido na prática em 1500€/m2 para efeitos de estudos de investimento. É este segundo valor que temos que reduzir se queremos baixar o custo da construção / habitação. Tendo por base as fórmulas de revisão de preço de obras públicas, o custo de um edifício é divisível da seguinte forma: mão de obra 44%, materiais 44% equipamento de apoio 2% e uma “constante” de 10%. Ora ignorando o equipamento e a “constante”, sobram 88% do custo para serem pensados. Destes 30% é o custo da estrutura, não negociável, teremos que “inventar” materiais de menor custo. Sendo improvável a redução do valor hora / homem, só melhorando a produtividade se conseguirá reduzir o custo e esse aumento de produtividade só se conseguirá aumentando a vertente de pré-fabricação.
Nas componentes incorpóreas, nomeadamente nas taxas, pode (mais uma vez, deve) o governo reduzir a taxa de iva da construção de habitação para 6%.
Last but not the least: não haverá habitação sem investidores, hoje, os investidores reduziram-se ao mercado de luxo, por ser o que apresenta menor risco e as margens são maiores. Um investidor precisa basicamente de duas coisas: uma expectativa de um retorno positivo e segurança durante a operação. Ora não têm sido dadas essas garantias, ou pelo menos sinais neste sentido. Quando se ouvem eleitos a pedir expropriação de habitação, ou arrendamentos forçados, ou congelamento de rendas, os investidores fogem porque, diz o povo, não é com vinagre que se apanham moscas.
Naturalmente que o rendimento dos prédios deve ser sujeito a imposto, mas numa altura de forte carência, o que é mais importante? A receita do Estado neste particular ou a promoção de habitação? Se a segunda ganhar, podiam (deviam?) reduzir o imposto a valores reduzidos, marginais mesmo, para quem tivesse retornos não superiores a 4%, menos reduzido até aos 8% e “normal” acima deste valor.
Em valores, considerando as áreas mínimas permitidas pelo RGEU, e um valor de 1500€/m2 (desprezando os custos incorpóreos), vemos que o valor anual do custo do terreno é idêntico ao do IMI.
Resumindo, o sector público ter de disponibilizar terrenos, para construção a preços balizados. Os potenciais compradores poderão pagar de forma diferida. Os investidores têm de ter uma garantia de segurança, num tempo suficientemente longo que lhes permita rentabilizar o investimento. As diversas taxas, das municipais ao IVA têm de ser amigas da habitação.