Não é um tema novo, mas sabemos que vai continuar a acompanhar-nos durante o próximo ano. Se achávamos que, em julho, o valor da inflação já tinha atingido o recorde, estima-se que terá, em outubro passado, ultrapassado os 10 %, alcançando, assim, a taxa mais alta desde 1992. Ao longo dos últimos meses, estes aumentos sucessivos têm sido a causa do agravar da situação financeira das famílias portuguesas, que se veem, diariamente, com cada vez mais dificuldades. Paralelamente, setores essenciais ao funcionamento da economia enfrentam desafios acrescidos, e a Construção Civil e o Imobiliário não são exceção.

A dificuldade no acesso à habitação continua a afetar gravemente os portugueses e, à medida que os orçamentos familiares vão sofrendo cortes significativos, também os players da Construção se deparam com verdadeiros obstáculos. Os custos de construção aumentaram, no último ano, 12,9%. Tanto o preço dos materiais como o da mão de obra contribuem, naturalmente, para a subida do preço final das casas, que, infelizmente, não se faz acompanhar pelo aumento dos salários. Como tal, comprar uma casa é cada vez mais difícil. Por sua vez, uma família que pretenda arrendar um imóvel também enfrenta grandes dificuldades neste momento, uma vez que o coeficiente de atualização das rendas definido para 2023 (1,02) é o mais alto dos últimos nove anos.

Também o aumento das taxas de juro, que, à partida, se apresenta como uma medida capaz de manter a inflação sob controlo, traz desafios adicionais às famílias, principalmente às que têm empréstimos, e, se a situação se mantiver, as empresas continuarão a ser afetadas, pela indisponibilidade financeira e pela incerteza que estes aumentos constantes geram. Mesmo que consideremos que quem tem maior poder de compra vai continuar a investir no setor, a verdade é que a instabilidade nunca funciona como um impulsionador dos mercados.

Sempre defendi que são necessárias estratégias que mantenham a inflação controlada, que ofereçam estabilidade financeira às famílias e condições de trabalho mais favoráveis aos trabalhadores, tendo o Estado, aqui, um papel fundamental.

Felizmente, começam a surgir boas notícias, como as novas medidas do Orçamento do Estado para 2023. O acesso à habitação encontra-se no centro das prioridades e, como tal, estão previstos descontos no IRS para as famílias com crédito habitação, assim como um novo regime de renegociação dos contratos de crédito à habitação com os bancos. Além disso, foi também aprovada uma lei que estabelece um “travão” de 2% ao aumento das rendas, bem como uma nova proposta no âmbito do programa nacional de habitação, que prevê um investimento de 2.377 milhões de euros no parque habitacional até ao final de 2026.

No que diz respeito à fileira da Construção e do Imobiliário, o incentivo fiscal à subida dos salários apresenta-se como uma das medidas mais promissoras, uma vez que a escassez de mão de obra, provocada pelas condições de trabalho pouco apelativas, tem sido um dos maiores problemas do setor. Espera-se que medidas destas realmente se concretizem e que os players do setor tenham meios para conseguir continuar a “dar cartas”. Se nada se fizer e se continuarmos a ser confrontados com obstáculos, como conseguirá a Construção manter-se tão relevante como até aqui?

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