Elisabeth Kubler-Ross foi uma psiquiatra Suíça pioneira no estudo da morte, tendo recebido reconhecimento científico pelo modelo que identificou as fases no processo da morte (da negação à aceitação), e pelos métodos para médicos e familiares que vieram ajudar a amenizar o sofrimento dos últimos dias das pessoas.

Elisabeth teve a oportunidade única de se sentar ao lado da cama de milhares de pessoas à beira da morte e ouvir como é a vida quando se está prestes a deixar este mundo. Percebeu que as pessoas aprendem muito no final da vida. Descobriu que, à beira da morte, fingimos menos e revelamos as nossas verdades mais profundas sobre o que realmente importa. Pensamos sobre os nossos arrependimentos, o que teríamos feito de maneira diferente e o que teve real significado enquanto vivemos. Vemos a vida mais claramente. É por isso que quem se aproxima do final da vida pode ser um grande professor. Sempre me interessou o trabalho desta psiquiatra, não tanto pelo que ensinou sobre a morte, mas pelo que ensinou sobre a vida.

Alexandre Soares dos Santos venceu três cancros e combateu o quarto. Sobre este último, disse que já não o afetava morrer. ‘Já fiz o que tinha a fazer’, disse. No modelo de Kubler-Ross, estaria na fase da aceitação. Terá partido em paz. Dizia que as fundações eram das coisas que mais o faziam sentir realizado. Ia a caminho da terceira, na área da educação. Entre a família e o grupo Jerónimo Martins gastava 35 milhões de euros por ano em responsabilidade social. Apoiava 170 crianças no Arco Maior, no Porto, a quem queria, mais que ensinar a ler e a ter um lugar na sociedade, ensinar valores. Queria perceber os temas a fundo e falou mesmo com o padre Tolentino de Mendonça para saber como conseguir isso.

Portugal perdeu um grande filantropo. Pela dimensão da sua fortuna e das suas doações, com certeza será um dos maiores filantropos das próximas décadas. Não irá ser fácil rivalizar. Alexandre Soares dos Santos fazia não só filantropia estratégica, com a fundação Francisco Manuel dos Santos e a fundação Oceano Azul e a nova fundação na área da educação, como também fazia filantropia de compaixão. Conheci uma vez um médico a quem Alexandre Soares dos Santos requisitava aconselhamento técnico sobre pedidos de ajuda que lhe chegavam para situações de saúde, algumas delas para tratamentos no estrangeiro. Não eram poucos pedidos. Haverá muita gente anónima por Portugal fora agradecida a Alexandre Soares dos Santos.

Na última parte da sua própria vida, Elisabeth Kubler-Ross interessou-se por estudar milhares de relatos de pessoas que viveram experiências próximas da morte e que tiveram a sorte de sobreviver para as descrever (como vítimas de paragem cardíaca). Percebeu que as experiências de quase morte mudam dramaticamente a vida das pessoas e o seu sistema de crenças. As pessoas relatam ter recebido um novo entendimento sobre os seus propósitos terrestres e começam a operar mudanças progressivas nas suas vidas. Quanto mais eles vivem, mais percetíveis são essas mudanças.

Alexandre Soares dos Santos mostrou ter sido inteligente no negócio da vida. Não precisou deixar chegar o último momento para perceber o que é realmente importante. A maneira como ele viveu a vida poderá ajudar o resto de nós, cada um na sua missão e possibilidade, a refletir sobre como viver a sua também. Aos ricos, particularmente, deixa o exemplo e a fasquia bem alta não só relativamente ao que se consegue ganhar numa vida, mas também ao que se consegue dar durante essa vida. Quando parte um homem como Alexandre Soares dos Santos, fica a lição da filantropia.

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