A temporada é 1998/1999. Faltava um jogo apenas para que a mesma terminasse de forma oficial: a final da Taça de Portugal. Foi a última vez que o vale do Jamor recebeu adeptos que apoiavam duas equipas que não a do Benfica, FC Porto ou Sporting: faz agora 22 anos. Beira-Mar e Campomaiorense haviam justificado a presença na final da tal prova rainha ao longo do ano, fruto de um percurso imaculado na prova, rumo ao Jamor.
Era uma tarde tórrida, abafada e inóspita para os mais intolerantes àquele clima próximo do fim do mundo. Nesse sábado de outrora, acordei pelas 9 horas, algo impensável nos tempos actuais. A viagem desde Aveiro fez-se bem. Durou e durou, mas fez-se bem, ao ritmo de Da Weasel, Offspring e Nirvana. Parámos em todas as estações de serviço para que a malta – hidratada com as “loirinhas” que perduravam numa arca com gelo que à passagem por Coimbra ou Pombal não era mais do que água conspurcada – pudesse fazer chichi (era permitido fumar dentro do autocarro). Eu era um puto dividido entre o dia mais importante da minha vida no que à bola dizia respeito e as provas globais lá da escola (o exame de Métodos Quantitativos, marcado para a terça-feira seguinte, correu-me tão mal que só tive coragem de dizer o resultado à minha mãe já no meu último ano de faculdade).
19/06/1999 foi o dia. Depois da festa e do arraial habitual na mata que ilustra os arrabaldes do Estádio Nacional, o povo entrou no recinto. De um lado, a massa humana oriunda da raia de Campo Maior, minuciosamente trajada com vestes patrocinadas pela Delta, empresa que mantinha os alicerces do Campomaiorense sólidos. Do outro, uma bancada pintada de amarelo e negro, com um travo a Ria e a mar. Bonito foi ver um estádio a receber uma final entre duas equipas de primeira divisão diferentes das habituais, daquelas que lutam para nela ficar por muitos anos, daquelas de “bairro”, onde as pessoas se conhecem todas umas às outras e, salvo alguma excepção, até os casais desavindos se falam.
A sorte sorriu-nos! A glória saiu da robustez do quadríceps esquerdo de Ricardo Sousa, agora treinador do Mafra, instituição desportiva que se localiza na cidade que alberga o convento mais conhecido do país: podia ter sido uma espécie de mais-valia para que o Ricardo se tornasse menos depravado e mais assexuado. Mas não, mas não. Adiante.
O troféu veio para Aveiro e todo aquele conto tornou-se real. A “ficha” demorou-nos a cair, tal era o sonho tornado realidade, anestesiando a alma de uma comunidade faminta por uma conquista do género. Passavam 10 minutos das 19 horas quando Fusco, capitão de uma equipa em êxtase, em polvorosa – como aquele sentimento que o José Cid tem quando janta favas com chouriço -, recebia das mãos do Presidente da República, Jorge Sampaio, a Taça de Portugal de 1999. Ali ao lado, mesmo, mesmo, mesmo ao lado, a ajudar a distribuir as medalhas, estava um ministro-adjunto qualquer. Acho que se chamava José Sócrates. Acho. Sem certeza. Mas acho que sim.
Viva o Beira-Mar! Um abraço à malta de Campo Maior! Um abraço ao meu antigo professor de Métodos Quantitativos!