Fez um ano desde que entrou em vigor o regime de proteção dos denunciantes, que trouxe consigo a obrigação da implementação de canais de denúncia nas empresas e organismos públicos com 50 ou mais trabalhadores. A pergunta que se coloca: será que ainda não interiorizámos esta obrigação ou estamos apenas a procrastinar?

Vejamos, a presente lei nº 93/2021, em vigor desde 18 de junho de 2022, estabelece o regime geral de proteção de denunciantes de infrações, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2019, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União. De acordo com a atual legislação, as organizações com 50 ou mais colaboradores devem estabelecer canais de comunicação internos que permitam aos trabalhadores denunciar, de forma confidencial e segura, situações de violação de normas legais ou regulamentares, incluindo casos de assédio, corrupção, fraude, branqueamento de capitais, entre outras práticas irregulares.

Um ano depois, ainda são muitas as organizações que não estão a cumprir a legislação, quer no setor privado, quer no setor público. Caso disso são algumas das instituições de ensino superior que apenas abriram concursos para a criação dos canais de denúncia, por força das ocorrências, altamente mediatizadas, registadas na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

A Compliance, isto é o cumprimento normativo relativo aos canais de denúncia, é um processo onde é manifesto o seu atraso relativamente aos prazos legais estabelecidos. A Lei nº109-E/2021 veio estabelecer a criação do Mecanismo Nacional Anticorrupção (MNAC), a quem cabe a vigilância da aplicação do diploma, a instauração de processos de contraordenação e aplicação de coimas – mecanismo este que deveria ter iniciado as suas funções em novembro de 2022, mas do qual ainda não vimos qualquer atividade prática.

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O MNAC está criado, foi-lhe nomeado um presidente, mas questiono: foram-lhe dados recursos humanos e materiais para o exercício cabal das funções que lhe são atribuídas? Ora, o suposto era que esta entidade verificasse se existem ou não os canais de denúncia nas empresas. Por outro lado, a Compliance é algo bastante complexo e abrangente, onde cabem os canais de denúncia, mas também códigos de ética e conduta, planos de prevenção de risco, formação, entre outras obrigações legais.

A aposta em soluções integradas de canais de denúncias tem sido, até então, a melhor forma de as organizações garantirem uma gestão mais eficaz destes processos. Além das vantagens que estas soluções trazem para as organizações, nomeadamente ao nível do acompanhamento da conformidade e supervisão das atividades, com vista a garantir um maior cumprimento do quadro normativo aplicável, por outro lado, também os colaboradores passam a ver na sua entidade patronal um maior compromisso quanto ao cumprimento normativo das regras, normas e procedimentos que os protegem enquanto potenciais denunciantes de boa-fé.

No caso da gestão dos canais de denúncia, é ainda garantido que são cumpridos os seis princípios que lhe foram atribuídos legalmente: confidencialidade, anonimato, exaustividade, integridade, conservação e imparcialidade. Ao implementarem uma plataforma integrada com uma solução completa as organizações reduzem as contingências jurídicas, financeiras e, sobretudo, reputacionais.

Em suma, a crescente complexidade das atividades desenvolvidas pelas instituições tornou premente a necessidade de implementação de mecanismos de boa governação que permitam a institucionalização de um conjunto de estratégias, sistemas, processos, políticas e procedimentos. Estes devem ser transmitidos de uma forma efetiva, clara e exemplificativa de situações, de forma que todos os colaboradores tenham a consciência da relevância fundamental do cumprimento da legislação em vigor.