Já se conhece o extenso recurso da defesa de José Sócrates contra a prisão preventiva, que deverá dar entrada no Tribunal da Relação de Lisboa esta semana. São mais de 70 páginas de argumentação onde a defesa do ex-primeiro-ministro, sem nunca negar os factos, procura mostrar que as provas de que o procurador titular do processo estará à espera são “provas proibidas” e, por isso, não poderão ser usadas em tribunal, avança o jornal Público. A defesa está otimista. “[O recurso] tem ótimos fundamentos e vai resultar”, disse o advogado João Araújo à Renascença.
No recurso, que é subscrito pelos dois advogados, João Araújo e Pedro Delille, a defesa não procura analisar concretamente os factos que imputam a Sócrates os crimes de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais, porque, segundo explica o Diário de Notícias numa correção publicada na edição desta quinta-feira, se baseia no argumento central de que o dinheiro pertencia ao empresário e amigo de infância Carlos Santos Silva e não a Sócrates. Este só se terá limitado a pedir empréstimos pessoais, diz.
Por isso o recurso centra-se mais na forma, legal ou não, como decorreram as diligências do processo. Em causa estão as informações bancárias com origem no estrangeiro que as autoridades suíças deverão enviar para Portugal e que o procurador titular do processo, Rosário Teixeira, acredita serem uma peça-chave para desvendar o rasto do dinheiro que permitiria a Sócrates ter uma vida luxuosa. Uma prova que, segundo diz a defesa, choca com legislação existente, nomeadamente com o Regime Extraordinário de Regularização Tributária (RERT I, II e III), que visa a amnistia fiscal, e ao qual aderiu o amigo de infância de Sócrates Carlos Santos Silva em 2009.
Segundo notícias que têm sido veiculadas pelos vários media, os investigadores a cargo da Operação Marquês terão descoberto milhões de euros que estariam depositados em várias contas do banco suíço UBS em nome de contas offshore. São as informações relativas a essas contas, que seriam controladas por Carlos Santos Silva, que a defesa alega não poderem servir de prova por estarem protegidas ao abrigo do RERT, que diz que quem transfere dinheiro depositado no estrangeiro para Portugal ganha uma espécie de perdão fiscal e não pode ser responsabilizado criminalmente por isso.
Os regimes de regularização tributária, que já tiverem três versões legislativas, o I, II e III, foram criados inicialmente pelo próprio José Sócrates durante o seu primeiro Governo, o segundo foi criado em 2010, já na segunda legislatura de Sócrates, e o terceiro repetiu-se em 2012, já com Pedro Passos Coelho na chefia do Executivo. Segundo lembra o Público, no mês passado, por exemplo, foi arquivado o inquérito sobre o caso do negócio da venda dos dois submarinos pelos mesmos motivos.
Além dos argumentos das “provas proibidas”, a defesa de Sócrates critica ainda severamente o juiz Carlos Alexandre por ter determinado a prisão preventiva do ex-primeiro-ministro sem fundamentar a decisão. E alega, segundo o DN, que a expressão usada pelo juiz de que a decisão, a pecar, não pecava por excesso. “Tempos perigosos em que um juiz se permite julgar insuficiente a prisão de um presumido inocente”, diz a defesa, que acrescenta que “prender Sócrates, julgar e condenar Sócrates passou a ser o projeto, a obsessão, o entalhe final da judiciarização da luta política”.