O Ministério Público (MP) descobriu dez esquemas que terão sido usados pelo ex-primeiro-ministro, José Sócrates, e pelo amigo Carlos Santos Silva para camuflarem transferências de dinheiro do empresário de construção civil para Sócrates. Ao todo, entre o início de 2012 e novembro de 2014, o MP contou 1,5 milhões de euros só em viagens, férias pagas, transferências bancárias indiretas e em dinheiro vivo.

Segundo conta o Expresso, mais de metade dessa verba está documentada com ordens de transferências e faturas. Outros 650 mil euros terão sido entregues diretamente em mão, faseadamente e cujos indícios foram identificados através de escutas coincidentes com levantamentos de uma conta do empresário de construção civil. Nas escutas, Sócrates foi apanhado a pedir dinheiro, referindo-se sempre a “fotocópias”, “livros” e “folhas de dossiê”, antes de cada uma dessas 40 entregas. E o tom, ao que conta o semanário, era de quem exigia, e não de quem pedia emprestado.

Nas entrevistas que já deu, Sócrates explicou que estes empréstimos, sem nunca os quantificar, se deviam ao facto de sentir “algumas dificuldades de liquidez”. Porém, o MP tem muitas dúvidas. Se foram empréstimos, porque não controlavam os montantes? E se eram empréstimos porque não houve ainda qualquer devolução?

Além destes esquemas, Santos Silva fez, ainda, transferências para pessoas próximas de Sócrates, como uma mulher que vive na Suíça e que se costumava encontrar com Sócrates e que recebeu mais de 90 mil euros em seis anos. Também a ex-mulher de Sócrates, Sofia Fava, manteve relações financeiras com o empresário. Fava chegou mesmo a pedir um empréstimo de 760 mil euros para comprar uma propriedade no Alentejo e o fiador foi Santos Silva, que além disso, entre 2013 e 2014, lhe pagou cinco mil euros por mês, num total de 90 mil euros, quando a prestação do empréstimo era 4700 euros por mês. Antes disso era Sócrates que pagava a prestação.

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Indícios justificam manter Sócrates em prisão preventiva

Estes factos descobertos durante a investigação terão sido suficientes para que o procurador Rosário Teixeira considerasse que Sócrates deveria permanecer em prisão preventiva, sob pena de o ex-governante vir a criar novos documentos para justificar movimentos financeiros ocorridos no passado. É que o procurador parece não duvidar da “capacidade criativa” de José Sócrates, tendo em conta todas as artimanhas usadas por ele e pelo amigo Santos Silva para camuflarem a passagem de dinheiro, como por exemplo a assinatura de contratos que não correspondiam à verdade.

O MP acha que os arguidos foram ao longo dos tempos produzindo documentos para justificar as movimentações financeiras. Esquema alegadamente usado, por exemplo, pelo Grupo Lena e uma empresa fantasma sediada em Londres, cujo dono é Lalanda e Castro, administrador da farmacêutica suíça Octapharma, que contratou Sócrates em 2013 como consultor em troca de 12 mil euros por mês.

Além disso há ainda a casa de Paris, comprada em 2012, por 2,8 milhões de euros e que o MP alega ser na verdade do primeiro-ministro, pois o contrato de arrendamento entre Sócrates e Santos Silva apesar de datar de dezembro de 2012, só foi produzido em fevereiro de 2014.

Os vários esquemas que foram descobertos constituem”fortes indícios” de que os dois amigos terão cometido crimes de corrupção. Sobretudo quando se veem esses esquemas à luz de outros factos como o de o Grupo Lena ter ganho mas de 200 milhões de euros em adjudicações em Portugal, e beneficiado de um acordo para a construção de mais de 50 mil casas na Venezuela por quatro mil milhões de dólares, quando Sócrates era primeiro-ministro.