Os serviços da Segurança Social cometeram um “erro legal básico” na notificação dos trabalhadores independentes com contribuições em falta a partir de 2006. Segundo o vice-presidente do Instituto da Segurança Social, para ter efeitos legais a notificação da existência de dívidas deveria ter sido feita por carta registada e não por carta simples. Como isso não foi feito, explicou Paulo Ferreira em declarações à TSF, havia a impossibilidade de cobrar de forma coerciva os valores em falta, pelo que a então direção do Instituto decidiu não remeter as dívidas para o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, a quem compete executar as dívidas e efetuar penhoras.

Esta situação é o erro a que se referia o ministro da Solidariedade e Segurança Social a propósito das contribuições que Pedro Passos Coelho não pagou durante os cinco anos em que trabalhou exclusivamente a recibos verdes. Segundo Pedro Mota Soares, o primeiro-ministro teria sido “vítima de erros da própria administração”. Na prática, estes contribuintes acabaram por beneficiar dessa falha, na medida que os montantes em falta não foram objeto de execução ou penhoras.

Segundo Paulo Ferreira, a notificação seguiu por carta simples porque se procurava evitar a prescrição de dívidas à Segurança Social relativas ao período entre 2002 e 2004. Alguns contribuintes pagaram voluntariamente, e quem não o fez, também não foi penalizado, limitando-se a aguardar pela prescrição. Para além do ex-primeiro ministro, esta situação terá abrangido cerca de 107 mil contribuintes, não sendo contudo conhecidos os montantes das dívidas em causa. Na altura, o Instituto era presidido por Edmundo Martinho que, em declarações ao DN e à TSF, considerou que o está em causa é “evasão contributiva”, ou seja, o facto de Passos Coelho não ter pago à Segurança Social, desvalorizando a inexistência de uma notificação.

Pedro Passos Coelho assegura que nunca teve conhecimento de qualquer notificação de uma dívida. O primeiro-ministro diz que só teve conhecimento da existência destas contribuições em falta em 2012, quando foi questionado por um jornalista, altura em que foi informado que tinham prescrito. A notícia foi revelada este sábado pelo Público e foi na sequência da investigação que o Passos Coelho efetuou o pagamento.

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Pagamento mesmo depois de prescrição, conta para a reforma

O vice-presidente do Instituto da Segurança Social reafirma ainda o direito dos contribuintes de pagarem voluntariamente o valor em falta, mesmo depois de prescrever a obrigação, de forma a salvaguardar os direitos futuros. A mesma interpretação tem o fiscalista da Deloitte ouvido pelo Observador. Segundo Luís Leon, “mesmo em caso de prescrição, um contribuinte que cumpre voluntariamente a sua obrigação contributiva esse pagamento pode ser considerado para efeitos de benefícios sociais futuros, nomeadamente de reforma”. Esta possibilidade está prevista no artigos 254 do Código Contributivo:

“Excecionalmente, nas condições previstas na presente secção, pode ser autorizado o pagamento de contribuições com efeitos retroativos quando a obrigação contributiva se encontre prescrita ou não existiu por, à data da prestação de trabalho, a atividade não se encontrar obrigatoriamente abrangida pelo sistema de segurança social”. A lei permite ainda que do pagamento referido no número anterior “resulta o reconhecimento do período de atividade profissional ao qual a obrigação contributiva diga respeito”.

Com o cruzamento de dados informáticos entre a Segurança Social e a Administração Tributária, aumentou de forma significativa o número de situações detetadas de contribuintes com contribuições em falta. Até ao cruzamento das redes, o sistema era “mais amigo” do contribuinte, na medida em que dependia da declaração feita pelo próprio num centro da Segurança Social. Foi a partir de 2006/7 que começou a ser registada uma conta corrente dos trabalhadores independentes, que permitiu o registo dos devedores. A partir dessa data os contribuintes começaram a ser notificados.