O proprietário de uma farmácia do Porto vai pagar 56.250 euros de indemnização à ex-diretora adjunta do estabelecimento por assédio moral (“mobbing”), após descobrir que ela pretendia engravidar, decisão alcançada após acordo no Tribunal do Trabalho de Valongo.
Entre 2012 e 2014, a farmacêutica – que entretanto foi mãe – alega ter sido insultada, humilhada, gozada pelo patrão e colegas e colocada, durante sete meses, sozinha na cave da farmácia onde não havia luz, ventilação, janelas ou cadeira e a fazer a contagem física de ‘stocks’ (encomendas com 17 quilos).
“A condenação de um empregador por assédio moral é um caso raro e excecional” afirmou hoje à Lusa o advogado Nuno Cerejeira Namora, que representava a ex-diretoria adjunta e é especialista em Direito do Trabalho.
Além da indemnização, o dono da farmácia retirou os três processos disciplinares à ex-diretora adjunta e fez-lhe um pedido de desculpas público.
O proprietário da farmácia frisou não ter tido a intenção de adotar qualquer tipo de atitude ou comportamento discriminatório relativamente à ex-funcionária, mas admite que algum ou alguns dos factos descritos nas peças processuais são verdadeiros e suscetíveis de terem causado algum tipo de dano, incluindo psicológico.
Os problemas da ex-trabalhadora, de 41 anos, ter-se-ão iniciado após o proprietário da farmácia ter descoberto que ela tinha feito análises ao sangue para se submeter a tratamentos de fertilidade.
“Assim que tomou conhecimento [dono da farmácia] encetou uma perseguição que passou pela destituição do cargo de diretora adjunta, tentativa de redução de salário e extinção do posto de trabalho, tal como a instauração de processos disciplinares para me desgastar”, explicou à Lusa a ex-trabalhadora, Susana Morais.
O procedimento de extinção do posto de trabalho viria a ser “chumbado” pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE).
Quando regressou da licença de maternidade, depois de ter estado de baixa por gravidez de risco, a ex-diretora adjunta terá feito horário noturno, sem direito a folgar no fim de semana.
A diretora da farmácia, antes do seu regresso, terá realizado uma reunião com todos os funcionários proibindo-os de falarem com a trabalhadora, sob pena de serem punidos.
Por causa desta “tortura”, a farmacêutica começou a ser acompanhada por um psiquiatra por ter desenvolvido uma depressão e um ortopedista devido a uma hérnia discal, causada pelo peso das caixas que diariamente carregava.
Segundo o advogado, autor de uma tese de mestrado sobre o assunto, uma das medidas para combater este fenómeno de “mobbing” passa pela criminalização dos empregadores, bem como a condenação pessoal dos colegas que, em cumplicidade com o empregador, participam no “psicoterror”.
“O assédio moral é um flagelo social que tem vindo a aumentar nos países do sul da Europa a que importa alertar para sensibilizar as autoridades competentes para as gravíssimas consequências económicas, sociais e empresariais do mesmo”, disse.
A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) já havia instaurado uma contraordenação à farmácia que ainda não está concluída.
A ex-diretora adjunta admitiu estar “muito satisfeita” com o desfecho porque “limpou o seu nome”, repôs a verdade e ouviu um pedido de desculpa.
“Este é um exemplo para as outras trabalhadoras saberem que é possível resistir e lutar contra estas situações”, disse.
Susana Morais lembrou ainda ter vivido um “inferno” e aquilo que seria o sonho de uma vida — ser mãe — transformou-se num pesadelo.
Neste momento, Susana Morais tem a sua própria parafarmácia, empregando mais pessoas.