É verdade que ter nascido nos anos noventa tem uma série de vantagens: à partida, tem mais anos para viver (com ou sem reforma); cresceu com as animações da Pixar e um acesso quase ilimitado a toda a música e séries de televisão do mundo; e não teve de ver o seu pai de tanga na praia ou a sua mãe com aquele penteado volumoso e chumaços nos ombros.

Mas vejamos também o outro lado da moeda: faltam-lhe algumas memórias interessantes (embora nem todas boas) que marcaram a vida dos seus pais ou irmãos mais velhos, algures entre o PREC e o auge do cavaquismo. O Observador deixa-lhe aqui (e na fotogaleria) algumas coisas de que certamente não se lembra se nasceu em 1990.

1. A Carris teve autocarros de dois andares

Até ao início dos anos oitenta, não era preciso ir a Londres para ver circular autocarros de dois andares. Podia gozar a vista sobre as ruas de Lisboa no piso superior dos autocarros laranja (em décadas anteriores, tinham sido verdes). No Porto, havia autocarros impulsionados por cabos elétricos no seu topo — os tróleis — , que circularam até 1997; em Coimbra, ainda existem.

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2. As gemadas faziam as crianças mais fortes (dizia-se)

Nos anos oitenta, muitas mães recorriam ao poder milagroso de uma gemada (mistura de gemas com açúcar) para fortalecer os seus filhos. Apesar de o ovo conter, de facto, vários nutrientes saudáveis, o risco de salmonelas nos ovos crus e alguma contenção no açúcar baniram esta prática.

3. Manuela Moura Guedes fez sucesso na música

A conhecida apresentadora teve uma curta carreira musical entre 1979 e 1982, tendo editado três singles e um álbum. O seu maior êxito foi “Foram Cardos, Foram Prosas”, que viria a ter versões dos Ritual Tejo e dos Amor Electro; a letra era de Miguel Esteves Cardoso.

4. Miguel Esteves Cardoso foi cabeça-de-lista ao Parlamento Europeu pelo PPM

Por falar em MEC, o fundador d’O Independente foi candidato independente às primeiras eleições para o Parlamento Europeu em Portugal, em 1987, nas listas do Partido Popular Monárquico. Os 156 mil votos que obteve (2,77%) não foram suficientes para ser eleito.

5. As crianças punham um penso nas costas no início do verão

Alguns pais simplificavam a explicação, dizendo aos filhos que aquele adesivo servia para ver se podiam ir à praia. Na verdade, o penso que fazia comichão nas costas era um teste de exposição à tuberculina, para saber se a criança continuava imune ou precisava de uma nova dose da BCG. Mais tarde, a prova anual passou a ser feita com uma injeção no braço. Hoje, as crianças só são vacinadas à nascença.

6. Havia uma União Soviética, uma Jugoslávia e duas Alemanhas

A geografia política europeia mudou muito no início da década de noventa: a Alemanha foi reunificada em 1990, após a queda do muro de Berlim; as 15 repúblicas soviéticas separaram-se entre 1990 e 1991, na sequência da perestroika de Gorbatchev; a Jugoslávia dividiu-se em sete países no conflito sangrento que marcou a década de noventa.

7. O incêndio no Chiado foi um marco para o jornalismo nacional

A 25 de agosto de 1988, o País acordou com a notícia do grande incêndio que atingiu o coração da zona do Chiado. A RTP e as rádios fizeram uma cobertura em direto sem precedentes, com repórteres em cima do acontecimento durante várias horas.

8. A Fórmula 1 passava por Portugal

Ok, o último Grande Prémio disputado no Autódromo do Estoril foi em 1996, mas é pouco provável que se lembre de assistir. O Estoril recebeu a modalidade mais popular de automobilismo entre 1984 e 1996 (nos anos 50 tinha havido corridas em Monsanto e na Boavista), e os pilotos com mais sucesso no nosso País foram Nigel Mansell e Alain Prost, ambos com três vitórias.

9. As crianças passavam as manhãs de fim de semana na companhia do Lecas

José Jorge Duarte foi o apresentador de serviço da programação infantil da RTP, na segunda metade dos anos oitenta. Mais conhecido por Lecas, introduzia os desenhos animados e respondia às cartas do público mais novo, num estilo irreverente para a época. Nos últimos anos, dedicou-se à direção de dobragens e à medicina tradicional chinesa.

10. O navio Tollan esteve encalhado no Tejo durante três anos

O porta-contentores Tollan naufragou em frente ao Terreiro do Paço, em fevereiro de 1980, após uma colisão com um cargueiro sueco, tendo morrido quatro dos seus tripulantes. Dada a dificuldade na sua remoção, acabou por continuar ali encalhado, a centenas de metros do Cais das Colunas, com o casco virado para cima, até dezembro de 1983. Passou a fazer parte do anedotário nacional e deu nome a vários estabelecimentos.