O ex-presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Luís Noronha Nascimento, defendeu, num artigo publicado na internet (chamado “O elogio da loucura ou variações sobre um tema recorrente”), que um processo com as características das de José Sócrates deve ser julgado no Supremo Tribunal de Justiça.
Como avança o Jornal de Notícias na sua edição impressa desta quinta-feira, Noronha Nascimento, sem nunca referir diretamente o nome do antigo primeiro-ministro ou da Operação Marquês, dá o exemplo do Presidente da República que tem o foro especial de julgamento no Supremo previsto no artigo 130º da Constituição, num regime que é alargado no Código de Processo Penal ao primeiro-ministro e ao presidente da Assembleia da República. Ou seja, o antigo presidente do Supremo não concorda com aqueles que defendem que só o Presidente da República tem o direito de ser julgado no Supremo Tribunal de Justiça, mesmo que ainda o seja no momento do próprio julgamento. Isto é, que o político se já não ocupar este cargo no momento do julgamento deve ser julgado num tribunal de primeira instância.
Noronha diz que não é assim, e no mesmo artigo publicado no Portal Verbo Jurídico, explicou que “esta interpretação jurídica é um convite à fraude à lei, deixando na mão de terceiros a escolha arbitrária – consciente ou não – do tribunal competente e remetendo para o vão de escada o princípio do juiz natural”.
Quem vai decidir, nesta interpretação, qual o foro competente é o investigador do crime: sendo mais lento ou mais lesto, acelerando ou atrasando o inquérito, tendo entre mãos uma investigação fluida ou complexa que permite velocidades diametralmente divergentes, ou – no limite do inadmissível – manipulando os ‘timings’ investigatórios, é ele quem vai decidir, afinal, qual o foro competente para julgar o PR ou o antigo PR”
Recorde-se que os advogados de José Sócrates já argumentaram algumas vezes que o Departamento Central de Investigação e Ação Penal do Ministério Público e o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal, os dois de primeira instância, não deviam nem podiam ter iniciado a investigação porque esta centra-se em crimes alegadamente cometidos enquanto primeiro-ministro. Ou seja, a competência é do Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça, segundo os advogados. Noronha Nascimento parece agora dar razão aos argumentos da equipa de juristas que defende Sócrates.
O antigo presidente do Supremo esteve ligado a um caso que envolveu José Sócrates quando, e enquanto ocupava esse cargo, destruiu, por ordem do então procurador-geral da República Pinto Monteiro, as escutas telefónicas entre Sócrates e Vara intercetadas pelo Ministério Público no âmbito do processo Face Oculta.