Existem dois tipos de pessoas no mundo: as que bebem água da torneira e as que se recusam a engolir uma única gota que não tenha sido engarrafada previamente. Gostos à parte, fique a saber que a primeira é, provavelmente, a pior para si. Não só por causa dos químicos indesejados (como o cloro, o flúor e os pesticidas) ou dos materiais pesados (como o alumínio e o chumbo) que encontramos neste tipo de água não filtrada, mas pela maior probabilidade de a água da torneira ser acídica. Mas não se surpreenda: a água engarrafada que anda a consumir provavelmente também o é. E sim, cada caso é um caso, mas pode não ser a melhor para si.

Acídica? O que é isso?

“É água com uma leitura de pH abaixo de 7, o que a torna ácida”, adianta a naturopata Cátia Antunes. “Sendo o pH uma escala que mede a acidez e alcalinidade dos alimentos, existem águas ácidas (que rondam um pH de 5-6,5), águas neutras (com um pH de 7) e águas alcalinas (que rondam um pH de 7,5-8,5). E é o nosso organismo que, independentemente da água que bebemos, tem a função de manter o sangue com um pH neutro de 7 valores.” No entanto, nem sempre é possível. “Quando bebemos água muito ácida, o organismo tem de ir buscar minerais (como cálcio e magnésio) para compensar os ácidos, fazer um efeito tampão e neutralizar o pH do estômago.” 

E se eu beber água ácida?

“Tal exige um maior esforço fisiológico por parte do organismo e um consumo prolongado de ácidos pode traduzir-se em obstipação, inchaçodigestão lenta, falta de energia e até osteoporose”, afirma a naturopata. O médico Stephan Domenig, no seu livro A Cura Alcalina, vai mais longe: a acidificação do pH do nosso organismo pode ser a grande responsável pela falta de concentração, uma vez que “os ácidos esgotam o oxigénio disponível no sangue e fazem com que o seu corpo se sinta mole”. 

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Só isso? Ou há mais?

Há mais: problemas de gengivas, cáries e mau hálito (as bactérias desenvolvem-se muito mais depressa), dores musculares e articulares (os minerais dos seus ossos e músculos são extraídos para neutralizar a acidez) e pele seca (porque o excesso de ácido é eliminado através da pele). No fundo, todas as células do corpo têm um desempenho menos eficiente num ambiente acídico e são incapazes de se libertarem das toxinas.

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Quando os ácidos esgotam o oxigénio disponível no sangue, o corpo ressente-se e o resultado é falta de energia e de concentração. (foto: EPA/WOLFGANG KUMM)

Quais são os benefícios da água alcalina?

“Uma pessoa que consome água neutra ou alcalina mantém mais facilmente o seu pH intercelular e sente mais energia”, diz Cátia Antunes. “Vai ainda alcançar uma maior longevidade e uma menor probabilidade de sofrer doenças inflamatórias e degenerativas porque um ambiente alcalino é menos propício à inflamação.” Para além disso, o stress do quotidiano, a ingestão excessiva de café e grande parte dos alimentos que consumimos provocam acidez. “A água alcalina pode ser usada para contrariar esses efeitos e neutralizar os ácidos do estômago.” Está explicado o porquê dos restaurantes que seguem a premissa de alimentação saudável só usarem água alcalina na confeção das sopas, sumos, chás e sobremesas.

Que marcas de água são alcalinas?

As águas minerais engarrafadas variam muito consoante a marca mas as mais populares são ácidas. Exemplos? Luso (5,7), Fastio (5,8) ou Vitalis (5,6). Já a água Monchique é considerada super alcalina por indicar no rótulo um pH de 9,5. A lista prossegue com as águas alcalinas Carvalhelhos (7,79) e Evian (7,2). Já a marca branca do Continente (6,66), a Cruzeiro (6,9) e a Fonte Viva (7) podem ser consideradas águas neutras. “O que eu recomendo é que se alterne todas as semanas entre uma água alcalina como a Monchique e uma água neutra como a do Continente para equilibrar o pH”, acrescenta a naturopata. 

Só tenho água com um pH ácido. Não devo beber?

“Claro que deve”, responde Cátia. “A água, seja alcalina ou ácida, ajuda a limpar o corpo e mantém-nos hidratados.” Por isso, deverá beber cerca de dois litros de água natural por dia, uma vez que ajuda a fazer circular os nutrientes pelo corpo e a libertar toxinas. “Se não tiver água alcalina, a água que tem pode sempre ser alcalinizada ao acrescentar um pouco de bicarbonato de sódio ou espremer algumas gotas de limão ou lima para um copo de água quente”, explica a naturopata, concluindo: “A verdade é que pode fazer toda a diferença e, se não conseguimos dar à volta ao stress e controlar tudo o que comemos, podemos sempre mudar pequenas coisas como começar a beber água alcalina.”

Qual é a versão da medicina? 

As opiniões dividem-se e ainda não existem estudos científicos que comprovem, de facto, os benefícios da água alcalina. Os médicos alertam para a necessidade de se fazer uma análise caso a caso. “Só aconselho água alcalina às pessoas que têm problemas gástricos para combater a acidez do estômago. No entanto, atualmente existem fármacos que inibem a produção dos ácidos e têm a função de os combater”, explica o médico Silva Henriques, presidente do Colégio da Especialidade de Medicina Geral e Familiar. “Se uma pessoa conseguir combater o stress do quotidiano e viver um estilo de vida saudável, com prática regular de exercício físico e com uma alimentação equilibrada, não precisa de beber água alcalina (até porque esta é normalmente mais cara). O mais importante é beber água e até pode ser da torneira”, conclui.

Nota da redação: no seguimento de alguns comentários e dúvidas levantadas pelos leitores, este artigo foi atualizado às 15h00 do dia 23 de outubro. Depois dessa hora recebemos ainda um Esclarecimento da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), que reproduzimos de seguida:

A afirmação que a água da torneira é a pior opção para as pessoas é totalmente desprovida de sentido, revela desconhecimento técnico sobre o assunto e coloca em causa o conhecimento de instituições como a ERSAR.

A real qualidade da água da torneira em Portugal é amplamente divulgada e os resultados podem ser consultados de forma transparente no sítio da ERSAR em www.ersar.pt.

O próprio Observador divulgou recentemente os resultados do último relatório da qualidade da água para consumo humano.

Em relação à notícia intitulada “A água que anda a beber talvez não seja a melhor para si” convém esclarecer o seguinte:

1. O cloro é adicionado à água para garantir preventivamente a sua contaminação com microrganismos que podem ser efetivamente prejudiciais à proteção da saúde humana. No entanto, existem valores recomendados para as dosagens e são controlados os subprodutos da desinfeção de modo a garantir que não há “efeitos secundários” da desinfeção.

2. A percentagem de água segura relativamente ao flúor na água da torneira em Portugal é de 99,49 %, ou seja, não há flúor na água da torneira.

3. Relativamente ao chumbo e alumínio, as percentagens de água segura são de 97,33 % e 98,00 % respetivamente, ou seja, elevados níveis de cumprimento.

4. De todos os pesticidas que são controlados na água da torneira, a percentagem de água segura é sempre superior a 99,60 %. A água da torneira não tem pesticidas.

Importa ainda dizer que a afirmação que a água da torneira pode causar inchaço, digestão lenta, obstipação, falta de energia e até osteoporose, é, no mínimo, desinformação, que carece totalmente de fundamentos técnicos.

Mais de meio milhão de análises realizadas em 2014 a cerca de 50 parâmetros resultaram numa percentagem de água segura de 98,41 %, ou seja, em Portugal a água da torneira é claramente de muito boa qualidade.