Ainda não é candidato, nem é certo que avance antes do prazo limite para que os ministros manifestem o seu interesse no cargo, mas Mário Centeno continua a contar espingardas e teve duas boas notícias para o eventual apoio que venha a ter da esquerda, e não só, com dois dos principais candidatos à presidência do Eurogrupo a afastarem-se da corrida: o italiano Pier-Carlo Padoan e o francês Bruno Le Maire.

Mário Centeno e a sua equipa continuam numa espécie de campanha não oficial a tentar medir as sensibilidades de cada um dos ministros para a votação para o novo presidente do Eurogrupo, no próximo dia 4 de dezembro em Bruxelas. Até ter a certeza que terá força suficiente, o ministro das Finanças português não deverá avançar.

No entanto, apurou o Observador junto de fontes com conhecimento do processo, esta semana Mário Centeno recebeu duas boas notícias no que à sua eventual candidatura diz respeito. O francês Bruno Le Maire, um dos favoritos ao cargo, não deve avançar. A candidatura do francês, apesar de ser bem vista pelos restantes partidos, tinha a dificuldade de implicar que fosse um grande país a assumir a presidência, que é mais um posto de gestão de sensibilidades e de procedimentos do que de decisão efetiva.

Além disso, Bruno Le Maire tem muito trabalho em França, onde acumula as difíceis pastas da Economia e das Finanças, e tem de implementar um vasta agenda de reformas económicas que se afiguram politicamente difíceis, para o governo de Emmanuel Macron.

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A segunda prenda que chegou mais cedo ao sapatinho de Mário Centeno é, talvez, a mais importante. O italiano Pier-Carlo Padoan, um dos ministros mais respeitados no interior do Eurogrupo e o favorito da esquerda, colocou-se de parte na corrida. Padoan era, ainda assim, uma escolha improvável devido à instabilidade do Governo italiano e às eleições que se avizinham no próximo ano, arriscando o Eurogrupo a ter de fazer nova votação ao final de um ano, e ao facto de haver vários italianos em posições de topo na Europa: o presidente do BCE, Mario Draghi, o presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, e a Alta Comissária para os Negócios Estrangeiros, Federica Mogherini.

Com a desistência da corrida de Pier Carlo-Padoan, Mário Centeno passa a ser, para já, o aparente favorito à esquerda, já que o outro candidato na corrida em representação desta área política, o eslovaco Peter Kazimir, está longe de ter o apoio da esquerda, pelo perfil pouco diplomático e pelas posições ortodoxas que tem assumido, apesar de fazer parte da família socialista europeia.

Eurogrupo. Centeno tem até dia 20 para decidir. E está em contactos intensos

Ainda assim, os socialistas europeus não indicaram qualquer candidato ao cargo e não o devem fazer. Mário Centeno tem a difícil tarefa de conseguir unir a esquerda do seu lado e ainda roubar alguns votos ao centro e à direita.

Para já, garantidos só estão os apoios da Grécia, Chipre e Espanha. Os ministros da Irlanda e da Eslovénia também terão mostrado alguma abertura, havendo agora a expetativa de que pelo menos Itália e Malta possam vir a acompanhar e talvez mesmo a França, que deixa de ter um candidato oficial.

Há ainda várias questões em aberto que podem mudar todas as expetativas, para além do alinhamento de forças políticas – o Eurogrupo é composto maioritariamente por ministros de direita e de centro direita. Uma delas é a escolha de outros lugares na Europa que estão a vagar, caso do poderoso Eurogroup Working Group, que é onde as decisões são negociadas e efetivamente tomadas.

Este grupo, ao nível dos adjuntos dos ministros, prepara as reuniões do Eurogrupo e quase tudo fica assente e acordado ainda antes de chegar à mesa dos ministros (até os comunicados finais da reunião). Thomas Wieser, que durante anos liderou o grupo, teve um papel fundamental durante os resgates e ao longo do período mais crítico da crise. Agora, irá reformar-se e deixa a eleição para o seu lugar exatamente para a mesma altura. Para esta vaga poderá ir mesmo um italiano, já que o cargo é na prática de diretor-geral e exercido em exclusividade.

Além disso, a negociação está a envolver outros lugares, como é o caso da eleição do vice-presidente do BCE. Vítor Constâncio deixa o cargo em maio do próximo ano e a eleição do futuro vice-presidente será decidida já em dezembro. Luis De Guindos é o principal candidato, mas o facto de ainda ser ministro das Finanças em Espanha está a fazer torcer alguns narizes na Europa, como explicou ao Observador uma fonte de Berlim.

Nesta altura, o principal potencial candidato que pode vir a estragar as contas de Mário Centeno é Pierre Gramegna. O luxemburguês é visto como uma escolha neutra e com a qual os países dos dois grandes blocos do Eurogrupo são capazes de viver. A letã Dana Reizniece-Ozola também está na corrida e o austríaco Hans-Jorg Schelling está, igualmente, a começar a medir apoios, apesar de as suas hipóteses serem reduzidas, já que não só representa a linha mais conservadora do Eurogrupo, como ainda não é certo que venha a fazer parte do próximo governo austríaco, que ainda não está formado, depois das eleições de outubro.

Como demonstra o passado, no que à eleição do presidente do Eurogrupo (e de outros cargos a nível europeu) diz respeito, até ao último segundo um acordo entre partidos, ministros ou países pode mudar a história.