Nem a notícia de que tinha escapado a um plano que conduziria à sua morte livrou Theresa May das críticas da oposição. No dia em que o senhor Brexit do Governo britânico, David Davis, esteve no Parlamento para explicar o estado em que se encontram as negociações com a Comissão Europeia, os deputados ficaram a saber que o executivo de May não fez qualquer análise global sobre o impacto que a saída do projeto europeu teria na economia nacional.

Downing Street não fez uma “previsão económica quantitativa” do impacto do Brexit em Inglaterra. “Isso não existe. Não fizemos isso. O que existe [nas análises feitas] é a dimensão [do impacto] na indústria, no emprego e por aí fora”, disse Davis. “Não há uma avaliação sistemática do impacto”, concretizou. Não se conhece o potencial impacto sobre o setor aeroespacial, sobre os serviços financeiros, sobre o setor automóvel. Não eram as informações que os membros da comissão do Brexit da Casa do Comuns esperavam ouvir.

No início de novembro, a Casa dos Comuns aprovou uma moção que forçava o Governo a apresentar uma “avaliação do impacto do Brexit” no Reino Unido. Davis explicou esta quarta-feira que apenas dispunha de uma série de avaliações parcelares (57, ao todo) e não uma avaliação global. “Isto é um verdadeiro caos”, comentou Jeremy Corbin, líder dos Trabalhistas.

Com as respostas de Davis na comité do Brexit, começou a ganhar força a ideia de que o Governo de Theresa May não estava preparado para lidar com o fardo de um “sim” dos britânicos à saída do Reino Unido. O próprio secretário de Estado para o Brexit corre o risco de ter de responder perante os Comuns por alegada desobediência à câmara — uma vez que as informações apresentadas esta quarta-feira não correspondem ao texto aprovado há cerca de um mês.

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Davis começou a delinear a sua defesa durante a avalanche de perguntas com que foi confrontado na comissão sobre o Brexit. Disse aos deputados que uma avaliação global teria uma utilidade “perto de zero” uma vez que a realidade pós-Brexit é dinâmica. “Não sou um fã de modelos económicos porque todos eles provaram estar errados. Quando temos uma mudança de paradigma — como aconteceu em 2008 com a crise financeira — todos os modelos estavam errados. Ficou conhecida a questão da Rainha, quando perguntou porque não sabíamos”, começou por explicar o governante.

De igual modo, aquilo com que estamos a lidar aqui em todas as saídas — quer seja um acordo de comércio livre quer seja um resultado ao estilo Organização Mundial de Comércio ou seja algo no meio destes dois modelos — é uma mudança de paradigma. Não conhecemos a dimensão, mas a ordem de magnitude do impacto”, procurou explicar David Davis.

Irlanda do Norte. O parceiro a que May não pode falhar

A presença de Davis na comissão sobre o Brexit ocorre apenas alguns dias depois de se saber que a fatura a pagar pelo Reino Unido para que se desvincule da União Europeia andará entre os 45 e os 55 mil milhões de euros. Também esta quarta-feira, o secretário do Tesouro britânico esteve a prestar esclarecimentos aos deputados sobre o tema do dia.

Reino Unido e UE chegam a acordo sobre fatura do Brexit

Confrontado sobre o preço a pagar para abandonar o barco comum, Phillip Hammond disse que as obrigações que venham a pesar sobre Londres serão cumpridas. Falhar esse compromisso seria “má reputação” para o país, sublinha. Mas a conta não está fechada, assegura.

Há mais pontas soltas neste processo. A Irlanda do Norte é uma delas. Os líderes da DUP — o partido dos Unionistas para que May se voltou para formar a maioria que suporta o atual Governo — manifestaram esta quarta-feira preocupações quanto ao “alinhamento regulatório” que o país terá de respeitar e que, temem o Partido Democrático Unionista, abra diferenças entre as regras a aplicar em Inglaterra, na República da Irlanda e na Irlanda do Norte. “Temos de sair nos mesmos termos que o resto do Reino Unido”, disse Nigel Dodds, responsável do partido. “A integridade do Reino Unido vem primeiro.”