A produção de SuperNanny, programa emitido pela SIC que esta sexta-feira anunciou a sua suspensão, contactou IPSS para que estas referenciassem famílias para participarem no reality show.

Fonte de uma IPSS no distrito de Santarém revelou ao Observador que a produtora Warner Bros. TV Portugal enviou um email em meados de novembro a pedir não só ajuda na divulgação do programa, mas também o encaminhamento de famílias que integrassem o perfil do programa:

Venho ao encontro da vossa instituição para que nos possam ajudar na divulgação deste projeto e referência de famílias com filhos dos 2 até aos 14 anos que possam estar interessadas em entrar neste desafio”.

O email foi enviado numa altura em que a produtora ainda estava a desenvolver o “novo projeto direcionado para famílias”, mesmo depois de a Ordem dos Psicólogos Portugueses ter emitido um parecer negativo sobre o formato de SuperNanny — parecer esse que foi pedido pela própria Warner Bros. TV Portugal. O Observador sabe que outras IPSS foram igualmente contactadas no mesmo sentido.

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Fonte oficial da estação de Carnaxide esclarece que “A SIC não tem qualquer conhecimento dessa prática, com a qual não se revê, cabendo à produtora Warner prestar os esclarecimentos necessários”.

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O programa, cujo nome não chega a ser referido no email, embora haja referência “à nossa Nanny”, “tem como objetivo ajudar as famílias a voltar a adquirir a sua harmonia com base na comunicação e reforços dos laços afetivos”, sendo que “as dicas e ferramentas usadas pela nossa educadora, ainda que direcionadas para cada caso, podem ser aplicadas a qualquer família com uma situação semelhante”. Segundo a produtora dizia no email, “o formato é cuidadosamente pensado”.

A nossa Nanny irá observar e diagnosticar quais as dificuldades de cada família e definir uma estratégia para auxiliar os pais neste processo de aprendizagem com os filhos”, lê-se ainda no e-mail.

A IPSS no distrito de Santarém não respondeu ao apelo da produção, uma vez que é política daquela instituição não revelar qualquer tipo de dados — esta IPSS em particular trabalha com mais de 200 famílias. “Íamos colocar uma família numa situação de exposição que não seria benéfica, ainda por cima tendo em conta as famílias que acompanhamos. Muitas delas apresentam poucas condições habitacionais”, diz a fonte ao Observador.

Para esta IPSS, responder ao email “bem construído e apelativo” corresponde a algo que não está autorizada a fazer, além de não ser ético. A IPSS em causa tem um CAFAP — Centro de Apoio Familiar e Aconselhamento Parental –, cujas verbas provêm diretamente da Segurança Social. O CAFAP é uma entidade autónoma, não existe em todos os concelhos e é regulada pela portaria nº 139/2013 do Ministério da Segurança Social, onde se lê que a intervenção de todo e qualquer CAFAP deve “respeitar a intimidade e a reserva da vida privada da família e da criança ou do jovem”.

Tanto a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social (CNIS) como a União das Misericóridas garantiram ao Observador não terem sido contactadas.

Exmo. Sr.,

A produtora de televisão, Warner Bros Portugal, está a produzir um novo projeto direcionado para famílias: das pequenas às numerosas, passando pelas da cidade e do campo, às monoparentais, às tradicionais ou até novas famílias. Famílias que discutem e que fazem as pazes, que riem e que choram, que se divertem e se zangam. Todas cabem neste novo formato, que promete surpreender”, lê-se no email.

O padre Lino Maia, presidente da CNIS, disse ao Observador que a confederação não tem contacto direto com as famílias, mas sim com as instituições que as acompanham. As instituições poderiam eventualmente referenciar as famílias, depois de lhes pedir autorização, muito embora Lino Maia refira a existência de um código de conduta a ser tido em conta por todas as IPSS: “Nunca dar informações sobre as crianças”.

O Observador contactou a produtora Warner Bros. TV Portugal para saber quantas IPSS contactou, em que moldes o fez e se alguma família chegou ao programa referenciada por essas entidades. Até ao momento em que este artigo foi publicado, a Warner Bros. TV Portugal não respondeu.

Esta sexta-feira o Tribunal de Lisboa Oeste determinou que a estação podia continuar a emitir o polémico programa, mas com condições: utilizar “filtros de imagem e de voz, quer dos menores, quer dos seus progenitores, quer de quaisquer outras pessoas que intervenham ou participem no programa e que, por vínculo familiar ou com os menores, permitam identificá-los”. Perante esta decisão, a SIC já fez saber que o terceiro episódio de SuperNanny, agendado para este domingo, não vai ser emitido.