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D. R.

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Chaínho: "Nas Antas, o Benfica chegava ao relvado todo borradinho"

Na antevisão do clássico, o Observador esteve à conversa com o médio "fetiche" de Fernando Santos no FC Porto do penta. E Chaínho garante: "O FC Porto do Sérgio Conceição lembra-me o meu".

Nunca se deu muito por ele no relvado, de tão discreto que era. Mas Chainho, primeiro no Estrela da Amadora, mais tarde no FC Porto, era quase “omnipresente” — mais a defender do que propriamente a atacar. Fernando Santos apreciava-lhe o “labor”, deu-lhe a titularidade na Reboleira quando este chegou vindo da III Divisão, e da Reboleira levou-o para as Antas, onde Chainho conquistou o “penta” ao lado do engenheiro que o erigiu.

Jogou vários clássicos como o desta sexta-feira, de azul-e-branco vestido, contra o Benfica — e recorda-os ao Observador. Não sendo Jardel, não sendo Zahovic, não sendo Deco, os clássicos muitas vezes corriam-lhe melhor do que aos “craques” das Antas. E nas Antas, diz Chaínho, o FC Porto entrava quase sempre a vencer. “O túnel era intimidante, era. O Benfica chegava ao relvado todo borradinho. Como é que sabia? Pelo forma como olhavam para nós.”

D. R.

E do primeiro clássico, lembras-te?
Lembro, lembro. Ganhámos 3-1. E o primeiro golo foi meu. Mas também estou envolvido no segundo ou no terceiro.

Isso foi nas Antas, logo na tua primeira época: 1998/99…
Nas Antas, sim. Tinha acabado de chegar. E até comecei a titular. Joguei logo contra o Beira-Mar. Mas depois, antes do clássico, estive três ou quatro jogos sem ser convocado.

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Porquê?
Não sei. Por opção do mister [Fernando Santos]. E tinha que respeitar.

Mas voltas a ser titular depois…
Volto. Jogo na Supertaça, o jogo correu-me bem e voltei a ser titular. Acho que foi depois da Supertaça que as coisas me começaram a correr bem. E esse primeiro clássico foi o “pulo” que faltava para o mister acreditar em mim – ela já me conhecia do Estrela [da Amadora].

É verdade que tinhas defrontado o Benfica quando jogavas no Estrela. Mas não é a mesma coisa que defrontar o Benfica jogando no Porto. Estavas nervoso? Ou foi preciso o Fernando Santos motivar-te?
Não, não foi o preciso o mister dizer-me nada. É claro que estava mais ansioso. Nervoso não; ansioso. O país pára! Mas quando sobes ao relvado, a própria envolvência no estádio das Antas, por exemplo, te motiva e a ansiedade vai-se embora. Está lá durante a semana mas vai-se embora quando o árbitro apita. Nem pensas. E depois tinha colegas de equipa que tinhas muitos, muitos clássicos. Isso ajuda. Mas eu entrava sempre motivado nos jogos. Clássicos ou não. Nunca tinha medo. Isso nasceu comigo. Podia estar a jogar num estádio com quarenta pessoas, como me aconteceu no Estrela, ou na Liga dos Campeões, com quarenta mil. É igual. E havia outra coisa: não sei porquê, fazia sempre bons jogos – e golos! – em jogos “grandes”.

D. R.

Mas há jogadores, às vezes até são o “cracalhão” lá do sítio, a quem acontece precisamente o contrário: desaparecem. Olha o caso do Jonas…
É verdade, é verdade. Mas é fácil de explicar: eles são marcadíssimos nos clássicos. Nem respiram! É mais fácil um médio-defensivo como eu destacar-se do que um avançado como ele [Jonas]. Num ressalto, numa bola parada, num canto, um médio-defensivo, um central, um lateral estão sempre mais livres. Mas não é só o Jonas. O Nuno Gomes, por exemplo, houve um período em que raramente me lembro de ter feito um golo ao Porto. E não é por isso que é melhor ou pior.

Como é que se prepara um clássico? Acabaste de me dizer que os melhores “nem respiram”. Isso é treinado. Sabem exatamente o que é que ele faz. É estudado ao pormenor…
Há coisas que não se treinam – e digo sempre isto ao meu filho. Podes treinar o passe, a receção, as bolas paradas, podes visionar os jogos do adversário no começo da semana, podes treinar muita coisa. Mas a agressividade, por exemplo, não se treina. E é isso que faz a diferença num clássico. A vontade de ganhar é que faz a diferença. A agressividade, a vontade, a motivação, são coisas que nascem contigo, não se treinam nem se ensinam. Mas tinha colegas que não tinham isso. Acho que não gostavam do jogo. Ser futebolista para eles era somente uma profissão. Estão no futebol para ganhar dinheiro. O futebol é mais do que isso…

Que colegas?
Epá, não te posso dizer…

Estrangeiros, aposto.
Claro! [Risos] Não falha…

"O túnel das Antas era intimidante, era. Nas Antas, o Benfica chegava ao relvado todo borradinho. Às vezes, durante o aquecimento já estavam borradinhos. Como é que sabia? Pelo forma como olhavam para nós. Depois, com o barulho dos 'pitons' a bater no cimento do túnel, os gritos, o “Vamos, caralho!” -- aquilo intimidava. Tu sentias o receio no adversário. E isso é logo meia vitória."

Mas conta-me lá: como é que se vive a semana antes do clássico?
O problema é que tu nunca sabes se vais ser titular ou não. No começo da semana treinavas, conversavas, mas só lá para quinta-feira é que sabias.

O treinador dizia-te?
Não. Nem precisava. Tu percebias pelo feedback durante os treinos.

Como assim?
Às vezes ele não precisava de te dizer: “Vais ser titular, Chaínho!” A forma como ele olhava para ti bastava. Mas o contrário também é verdade. Ou seja, havia treinadores que durante semana nem para ti olhavam. Até evitavam falar. E percebia logo: “Banco!”

E quando sabes que vais ser titular, dorme-se mal?
Nos primeiros anos, sim, dormes. Depois, com a experiência, dormes melhor. No primeiro clássico praticamente nem dormi. Na véspera, então, não dormi nada.

Muitos de vocês eram casados. Tinham filhos pequenos. Antes de um jogo tão importante tinham que se distanciar um pouco da vida pessoal? Para se concentrarem?
Na véspera entravas em estágio. Na altura do primeiro clássico ainda não tinha filhos, por exemplo. Quando joguei na Grécia, contra o Olympiacos, tinha. E a minha mulher sempre teve o cuidado de me permitir descansar melhor naquela semana. Mas não me afastava da família. Antes pelo contrário. Eu precisava de estar perto da família mais do que nunca.

Contavas-me que ter futebolistas experientes no balneário ajudava. Eles “apertavam” contigo?
Claro que sim. Mas sem agressividade. Diziam-me: “Vamos, Chaínho!” Mas não “apertavam” porque sempre deixei tudo no relvado. Só deixaria mais se matasse alguém! [Risos] Então, nunca me repreendiam. Mas jogar ao lado do Aloísio, do Jorge Costa, do Drulovic, do Capunho, jogadores “batidos”, claro que te ajudava.

"Grécia? Ao pé de um clássico em Portugal é a loucura! Nunca vi nada igual. Nos golos, os adeptos do Panathinaikos invadem o relvado para festejar contigo. Dão-te calduços! Sabias que o autocarro do Panathinaikos era velho, todo partido, com aquelas grades como os da polícia? O autocarro, antes de chegar aos estádios, era apedrejado, atiravam-nos petardos. Nunca vi nada igual."

Olha lá: é mesmo verdade que os adversários já começam a perder só por causa do ambiente no túnel das Antas? Aquilo era tramado.
[Risos] Era intimidante, era. Nas Antas, o Benfica chegava ao relvado todo borradinho. Às vezes, durante o aquecimento já estavam borradinhos.

Como é que sabias?
Pelo forma como olhavam para nós. Depois, com o barulho dos pitons a bater no cimento do túnel, os gritos, o “Vamos, caralho!” — aquilo intimidava. Tu sentias o receio no adversário. Isso é logo meia vitória. Se entras forte, ganhas.

Tens algum jogo memorável contra o Benfica?
Aquele primeiro, o da estreia. Mas houve mais. Lembro-me de vencer por três ou quatro o Benfica. Também fiz grandes jogos na Taça [de Portugal] contra eles. Fazia sempre bons jogos.

Do outro lado, no Benfica, tinhas colegas de seleção, amigos. Esqueces-te disso mal começa, não?
Não há amizade no relvado. Podes ser amigo deles durante a semana. Podes ser amigos depois. Mas no relvado não há amizade. Aquilo não é uma “peladinha” de fim-de-semana com amigos. O Calado, por exemplo, era um dos melhores amigos. Joguei com ele no Estrela desde os catorze anos. Também era amigo do Andrade, por exemplo. Mas aquilo acabava por dar sempre “faísca”. Até nos comíamos! Não o queria magoar. Mas se entrasse duro, eu entrava duro. É assim.

D. R.

Jogaste no Panathinaikos , por exemplo. Um clássico em Portugal ao pé de um Panathinaikos-Olympiacos é um brincadeira de crianças…
[Risos] Contra o Olympiacos, contra o Paok… É a loucura! Nunca vi nada igual. Nos golos, os adeptos do Panathinaikos invadem o relvado para festejar contigo. Dão-te calduços! Vou-te contar uma história curiosa: sabias que o autocarro do Panathinaikos era velho, todo partido, com aquelas grades como os da polícia?

Então porquê?
O clube tinha dinheiro. E quando cheguei lá até perguntei: “Então, mas não têm um autocarro novo?” E responderam-me: “Esquece! Nem vale a pena; tinhas que comprar um novo todas as semanas…” O autocarro, antes de chegar aos estádios, era apedrejado, atiravam-nos petardos. Nunca vi nada igual. Lembro-me que, no final da época, seríamos campeões se, na deslocação ao estádio do Olympiacos, ganhássemos ou perdêssemos por menos de dois golos. Éramos melhores naquele ano. Mas perdemos 3-0.

Então?
Cheguei a temer pela minha vida. Até no túnel ouvíamos petardos a rebentar. Éramos cuspidos. Ameaçados. Chegar ao estádio de autocarro foi um inferno. A minha equipa era praticamente aquela com que a Grécia venceu o Europeu. Era melhor que a do Olympiacos, ponto final. E cheguei a dizer ao Karagounis: “Vamos embora! A nossa vida está em risco…” Depois da derrota só consegui sair à rua uma semana depois…

Porquê?
Os adeptos do Panathinaikos tratavam-te mal. Estavas no restaurante, a jantar com a tua família, e interrompiam-te. Tratavam-te mal. Levavas calduços. Não era fácil.

"Sérgio Conceição? Somos amigos. Não jogámos no Porto mas fomos colegas na seleção. Acho que o Porto precisava de um treinador “da casa”. Não é que o Nuno [Espírito Santo] não fosse. E até começou por fazer um bom trabalho. Mas a equipa tornou-se conservadora. Com o Sérgio não há isso. Com ele só joga quem tiver garra. Quem jogar 'à Porto'. Este Porto do Sérgio faz-me lembrar o meu. Quando um clube vinha jogar às Antas, vinha de pé-atrás, assustado."

Voltando a Portugal. Nunca chegaste a jogar com o Sérgio [Conceição] no Porto. Ele vai para Itália na época em que és contratado. Mas são amigos. É o treinador certo para o Porto?
Somos amigos, somos. Não jogámos no Porto, mas fomos colegas na seleção. Acho que o Porto precisava de um treinador “da casa”. Não é que o Nuno [Espírito Santo] não fosse. E até começou por fazer um bom trabalho. Mas a equipa tornou-se conservadora. Com o Sérgio não há isso. Com ele só joga quem tiver garra. Quem jogar “à Porto”. Este Porto do Sérgio faz-me lembrar o meu. Toda a gente nos respeitava. Quando um clube vinha jogar às Antas, vinha de pé-atrás, assustado. O Sérgio está a recuperar essa mensagem, essa autenticidade que se foi perdendo.

Mas há aqui algo curioso: se o Benfica vencer – e a época não está a correr bem ao Benfica –, ultrapassa o Porto…
É verdade, é verdade. O Benfica começou mal, é certo, mas está a conseguir construir uma equipa com vitórias. E é por isso que a diferença é mínima. Falou-se muito do Benfica porque é o campeão, porque tinha uma equipa fantástica na última temporada. Mas digo sempre isto ao meu filho: “Não há vencedores ou derrotados antecipados no futebol; o que hoje é verdade amanhã é mentira…” As coisas mudam de uma semana para a outra.

O Benfica vem de uma goleada e o Porto de um empate na Vila das Aves. Sempre é verdade que vence quem está “pior”?
[Risos] Diz-se isso, diz. E talvez seja verdade. O Porto, por vir de um resultado mau, por saber que se perder é ultrapassado, vai estar muito, muito motivado. Não há hipótese. Não é melhor motivação do que um desaire antes do clássico.

E a arbitragem? As últimas semanas foram difíceis. O árbitro escolhido vai estar sob pressão?
Honestamente?

Sim…
Vai apitar sobre brasas! O melhor árbitro seria o Soares Dias. Mas não está disponível para este jogo. Talvez seja o Jorge Sousa. E também é experiente. Mas qualquer árbitro vai apitar sobre brasas. Epá, espero sinceramente que este clima acabe. Há muita gente no futebol, a viver do futebol, gente que muitas vezes não entende nada de futebol mas que o maltrata. Tenho amigos árbitros — e sempre respeitei os árbitros. Mesmo enquanto jogador, respeitava. Conheciam as minhas “manhas”. Sabia até onde podia “abusar”. Às vezes até vou treinar, fazer uma corridinha com eles. Custa-me muito ver este desrespeito. Eles fazem parte do jogo. Erram? Erram. Mas também eu errava. Mas não erram de propósito, para prejudicar este ou beneficiar o outro. É preciso respeitar o trabalho deles. E acabar com este clima.

"O árbitro vai estar sobre brasas! Epá, espero sinceramente que este clima acabe. Há muita gente no futebol, a viver do futebol, gente que muitas vezes não entende nada de futebol mas que o maltrata. Tenho amigos árbitros -- e sempre respeitei os árbitros. Mesmo enquanto jogador, respeitava. Conheciam as minhas “manhas”. Sabia até onde podia “abusar”.Eles fazem parte do jogo. Erram? Erram. Mas também eu errava. É preciso respeitar o trabalho deles. E acabar com este clima."

Mas esse “clima” não é de hoje. E não são vocês, jogadores, que o criam.
Há gente a mais no futebol, a estragar o futebol.

Comentadores? Diretores de comunicação? Dirigentes?
Há gente a mais… [Longa pausa] E vão desaparecer. Estão a maltratar a minha paixão. O destino deles é desaparecer.

Mas isso incomoda os jogadores?
Os jogadores até podem dizer que não ouvem; mas ouvem. Ouvem as “bocas”. E há treinadores que sabem usar isso a seu favor. Às vezes até colam as tais “bocas” na porta do balneário. Os treinadores vendem-nos sonhos, causas. Isto é uma causa. Quando alguém te manda uma “boca”, quando põe em causa a tua seriedade, o teu trabalho, o treinador sabe como te motivar, sabe como retirar o melhor disso.

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