Já nos vamos habituando a assistir com regularidade a iniciativas legislativas, imbuídas de um certo “delírio de grandeza”, que prometem levar as massas a um caminho de felicidade e progresso. De tempos a tempos surge no palco mediático uma personagem política a proclamar, com o ardor próprio dos profetas, um pacote de medidas salvíficas destinadas a serem implementadas na sociedade. E foi o que aconteceu recentemente. De uma rajada, o Conselho Nacional do PS aprovou a legalização do suicídio assistido (eutanásia) e a criação de legislação para elevar a prostituição ao estatuto de “trabalho legal”.

Esta extraordinária hiperatividade legislativa, talvez sirva para para distrair o povo dos graves problemas que o país atravessa, mas não serve seguramente para melhorar a dignidade da vida humana. Os argumentos que suportam estas iniciativas legislativas estão repletos de eufemismos demagógicos: dignidade, liberdade individual, progressismo legislativo, etc. Mas se nos libertarmos desta “narcose demagógica”, percebemos que afinal estas medidas políticas, que nos tentam agora impingir, não servem o bem comum, nem tão-pouco irão ajudar a criar o tão desejado Paraíso terrestre.

Um dos argumentos usados para a legalização da prostituição assenta na opinião de que esta atividade deve ser considerada um trabalho; um “trabalho sexual”. Se julgarmos que a prostituição é uma atividade laboral, é legítimo que esta se legalize e que seja sujeita às regras do código do trabalho. Mas, convém sublinhar que, a prostituição não é um trabalho. A prostituição transforma o corpo de seres humanos em mercadoria transacionável, passando a ser objeto de aluguer de curta duração. A situação tem tanto de ridículo como de absurdo, já que um cliente insatisfeito com o serviço poderia usar o livro de reclamações, ou porventura pedir a devolução do dinheiro pago, alegando má qualidade do serviço.

A ideia de que a legalização da prostituição é uma forma de proteger a mulher e de lhe dar mais dignidade é falaciosa. A prostituição martiriza o corpo da mulher, corrompe a sua mente e rouba-lhe o futuro. Por razões profissionais, conheço algumas histórias de mulheres que passaram pela prostituição. Nunca escutei uma palavra que fosse no sentido de reclamar a legalização da atividade ­— essas encontram-se apenas nas cabeças de algumas luminárias políticas ­—, mas testemunhei vidas destruídas por um percurso que está muitas vezes associado ao consumo de drogas, aos abusos e maus-tratos, à perda da sanidade mental e à destruição da dignidade da pessoa humana. Por conseguinte, a legalização de uma atividade intrinsecamente má não vai fazer dela uma coisa boa ou respeitável. Do mesmo modo, a legalização do consumo das drogas não leva a que a sua utilização seja recomendável. Não serve de consolo para ninguém que um ser humano se autodestrua de forma higiénica e legal.

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A iniciativa legislativa de elevar a prostituição ao estatuto de trabalho sexual revela ingenuidade política e uma grande falta de conhecimento das razões que levam as mulheres (e homens) à prostituição. Além disso, considerar a prostituição como uma via profissional seria um péssimo sinal para os mais jovens, já que são aqueles que estão mais expostos a este caminho, onde o corpo se transforma num mero instrumento de prazer sexual e nada de positivo se constrói. Os jovens ­— principalmente os provenientes de meios sociais mais desfavoráveis — ficariam mais vulneráveis aos abusos sexuais, e à manipulação por oportunistas perversos, já que passando a ser legal “vender serviços sexuais” a sua compreensão, sobre aquilo que é um comportamento ajustado, ficaria afetada por uma legislação imoral.

Vivemos uma época viciosa que, em nome da liberdade, consagra falsas virtudes. A prostituição não promove relações humanas saudáveis, fomenta uma visão distorcida da sexualidade humana, desumaniza as pessoas convertendo-as em objetos de uso, e alimenta uma cultura do descartável: “usar e deitar fora”. A legalização da prostituição é na verdade uma infâmia, configura uma desonra ao mesmo tempo que corrompe a civilização humana.

Médico Psiquiatra