Não há maneira de evitar um impasse político que dure todo o verão. Mesmo que o Governo aprove nos próximos dias a tabela salarial única e a revisão de suplementos da função pública, mesmo que o Presidente envie este diploma e o das pensões (hoje aprovado) para fiscalização preventiva do TC, os prazos e etapas legais que os diplomas têm de percorrer só estarão resolvidos em outubro, na melhor das hipóteses. Ou seja, já só em cima da apresentação do Orçamento do Estado (OE) para 2015 as dúvidas se vão dissipar. O processo pode, ao todo, demorar cerca de quatro meses até chegar ao fim.

O Conselho de Ministros aprovou esta quinta-feira a nova Contribuição de Sustentabilidade nas pensões e a ministra das Finanças anunciou a aprovação para os próximos dias das novas regras salariais da função pública.Tal como o Observador noticiou, o Governo quis separar estas medidas mais controversas do resto do Orçamento para acelerar o processo legislativo e afastar “a incerteza” sobre a constitucionalidade das novas medidas. O objetivo é obrigar o TC a pronunciar-se sobre os cortes permanentes a tempo da elaboração do Orçamento do Estado de 2015.

A fórmula, porém, não é nova. Foi a que o Governo tentou implementar em 2013 com a convergência de pensões do setor público com as do setor privado. E o processo acabou por ser tão moroso que o objetivo (saber se podia ou não incluir a medida no OE seguinte) não foi atingido.

Revejamos o processo: em 2013, o projeto foi entregue aos sindicatos e parceiros sociais na primeira semana de agosto (como agora terá de acontecer com os novos salários da função pública). Mas as negociações arrastaram-se e a medida só foi aprovada em Conselho de Ministros a 12 de setembro – apenas com um mês de antecedência em relação ao prazo de apresentação da proposta do Orçamento no Parlamento.

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O processo legislativo demorou mais uns dias e só a 1 de novembro o diploma foi aprovado na Assembleia da República. Foi enviado para Belém dia 15 e Cavaco Silva decidiu enviar a convergência das pensões para o Tribunal Constitucional no dia 23 de novembro. O TC, que esperou até ao último dia do prazo, só se pronunciou no dia 19 de dezembro, decidindo-se pela inconstitucionalidade da medida. Do início ao fim do processo, passaram quatro meses.

O caso da tabela salarial única e dos suplementos será assim parecido. O período de diálogo com os sindicatos poderá ser mais rápido do que no caso da convergência das pensões. Mas mesmo assim, se o TC voltar a chumbar as medidas, o prazo é apertado para encontrar uma solução que não atrase o Orçamento do Estado de 2015, que tem que dar entrada no Parlamento a 15 de outubro.

Se o processo for idêntico – e os prazos não permitem que seja muito mais rápido -, as decisões do TC só chegarão no início de outubro.

cheque da troika pode demorar meses

Outro problema que pode ficar suspenso durante vários meses é o do último cheque da troika (2,6 mil milhões de euros), que está dependente da aprovação de medidas de compensação pelo Governo para este ano – e a definição em concreto dos planos para 2015.

Hoje mesmo, na conferência de imprensa após o Conselho de Ministros, a ministra das Finanças reiterou que o Governo não vai tomar medidas até saber “o tamanho do problema” na sua totalidade. Ora, isso implica saber a decisão do TC sobre a atual CES (contribuição sobre as pensões, processo em que os juízes do Ratton estão longe de uma decisão).

Se assim for, também o fecho oficial e final do processo com os credores fica parado por uns meses.

O verão político promete, assim, ser quente – mais ainda se juntarmos o processo interno de escolha do candidato do PS a primeiro-ministro, entre António José Seguro e António Costa.