A diretora de operações do Facebook, Sheryl Sandberg, pediu desculpa pela realização de experiências psicológicas levadas a cabo pela rede social em janeiro de 2012. Num estudo que contou com a participação de investigadores da Universidade de Cornell e da Universidade da Califórnia, o Facebook manipulou o fluxo de 689 mil utilizadores e concluiu que é possível influenciar a forma como as pessoas se sentem  – mais felizes ou mais tristes – através de um processo de “contágio emocional”.

“Este estudo insere-se conjunto de pesquisas que as empresas fazem para testar diferentes produtos. Foi isso que aconteceu. Foi mal comunicado e por essa má comunicação pedimos desculpa. Nunca quisemos chatear-vos”, disse Sandberg esta quarta-feira.

Segundo o New York Times, a diretora de operações do Facebook também se mostrou confiante relativamente à capacidade de a empresa para resistir a inquéritos feitos por institutos de regulação. “Estamos em contacto com reguladores em todo o mundo e vai ficar tudo bem”, disse.

o estudo polémico

“Os estados emocionais podem ser transferidos aos outros através do contágio emocional, levando as pessoas a experimentar as mesmas emoções sem se quer se aperceberem disso”. Começa assim o artigo que revelou os resultados desses testes, publicado em março pela revista científica Proceedings of National Academy of Sciences (PNA).

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A equipa responsável pelo estudo filtrou o conteúdo visível pelos utilizadores, limitando ora as publicações com um tom positivo ora aquelas com um tom mais negativo para perceber como essas modificações alteravam o estado de espírito de quem as via. O estudo foi realizado sem que os utilizadores testados tivessem consciência de que estavam a ser sujeitos a uma experiência online.

Na terça-feira a empresa insistiu que ao efetuarem o registo na rede social os utilizadores autorizam de forma generalizada que os seus dados sejam utilizados para estudos. Quatro meses depois de a experiência ter sido realizada, o Facebook adicionou uma política de “investigação” ao seu formulário de termos e condições de utilização.

Mas há quem considere que o Facebook violou as condições de serviço e critique que a empresa não tenha procurado autorização expressa junto das pessoas testadas. A revelação do método utilizado pelo Facebook e pela equipa de académicos gerou grande descontentamento e foi alvo de muitas críticas por parte de utilizadores, políticos, especialistas e ativistas da internet, que classificaram a experiência de “escandalosa”, “assustadora” e “perturbadora”, escreveu o Guardian esta segunda-feira.

Uma sondagem feita pelo jornal britânico nesse mesmo dia revelou o desagrado dos utilizadores no auge da polémica. 84% dos inquiridos diz ter perdido a confiança no Facebook e 66% admitiu ter pensado em encerrar a sua conta na rede social.

As reações oficiais também não se fizeram esperar e foram muito duras com a empresa. O deputado britânico Jim Sheridan, membro do comité dos média da Casa dos Comuns, pediu uma investigação parlamentar sobre a forma como o Facebook e outras redes sociais manipulam as respostas psicológicas e emocionais dos utilizadores, escreveu o Guardian. “Eles estão a manipular informação pessoal e eu estou preocupado com a capacidade do Facebook e de outras redes de manipular os pensamentos das pessoas sobre política e outras áreas”, disse Sheridan.

No Twitter, Clay Johnson, co-fundador da empresa Blue State Digital, responsável pela gestão da campanha online de Barack Obama em 2008, confessou estar assustado com o estudo do Facebook:

https://twitter.com/cjoh/status/482882070101106688

E não ficou por aí, levantando uma data de questões sobre manipulação política. Poderá a CIA recorrer ao Facebook para incentivar uma revolução no Sudão, por exemplo?

https://twitter.com/cjoh/status/482883137161408512

E quanto a Zuckerberg, será ele capaz de decidir o resultado de eleições?

https://twitter.com/cjoh/status/482882762358026240

Robert Blackie, diretor da agência de marketing Ogilvy One, (responsável pela imagem de marcas como a Dove, a Nestlé ou a BP, por exemplo) disse que a forma como as empresas de internet filtram a informação que mostram aos utilizadores é fundamental para os seus modelos de negócio, o que explica a falta de transparência. “Terá de haver reguladores independentes ou governamentais daquilo que estas empresas fazem”, disse Blackie, citado pelo Guardian, acrescentando que estas empresas precisam de “discutir estas questões mais abertamente” sob pena de “as pessoas ficarem relutantes relativamente à utilização dos serviços”.

Na sequência desta polémica, várias agências europeias de proteção de dados estão a investigar se o Facebook violou leis de privacidade locais com a realização desta experiência. Uma dessas agências é o Gabinete do Comissário de Proteção de Dados, na Irlanda, – onde está a sede internacional do Facebook – responsável pela regulação das operações da rede social fora da América do Norte.

O Gabinete do Comissário da Informação em Inglaterra também está a tentar perceber se houve violações de privacidade aos residentes no país, de acordo com o New York Times. Apesar disto, nenhum dos reguladores lançou uma investigação oficial ao Facebook, escreve o mesmo jornal norte-americano.

Como lembra Farhad Manjoo, jornalista de tecnologia no New York Times, o Facebook e os restantes sites são “placas de petri” para os contactos sociais, o que leva muitos investigadores sociais a acreditar que a análise do comportamento humano online pode abrir pistas sobre a forma como as ideias se espalham pelos grupos, como as ideias políticas se criam e mesmo sobre questões mais íntimas como o porquê de as pessoas se apaixonarem.

Manjoo escreve que muita da investigação levada a cabo pelo Facebook e pela Google é secreta e recorda que esta última realiza, todos os anos, cerca de 20 mil experiências a partir dos resultados de pesquisa no seu motor de busca.

Este jornalista defende reações mais moderadas às revelações dos estudos destas companhias porque, diz, se estes resultados são recebidos com muitos protestos, o Facebook e as outras redes não voltarão a divulgar as suas pesquisas. “E não será melhor conhecer a sua força para nos defendermos contra isso do que não saber de todo aquilo que fazem?”, pergunta.