Faltavam quatro minutos para os 90 minutos. Para o Brasil festejar o tri. Estamos em 1970, na final do Campeonato do Mundo, no México. Os canarinhos venciam a Itália de Giacinto Facchetti por 3-1, cortesia de Pelé, Gérson e Jairzinho — Boninsegna marcara para squadra azzurra. Mas o melhor estava guardado para o fim, qual presente do divino. Clodoaldo “começou o carnival”, como diria Carlos Alberto, quando convidado pela BBC a recordar o golo digno do Olimpo.

Clodoaldo, que fez a carreira quase toda no Santos, deu cabo dos rins de quatro italianos, principalmente de Giancarlo Desisti. Este apelido cantado com sotaque tem a sua piada… Tocou para Rivelino, que fez a bola chegar a Jairzinho. O extremo deu a Pelé, para o Rei decidir. Tranquilamente, o dez lançou Carlos Alberto na direita, que chutaria um foguete daqueles de trivela. Golaço. Quatro-um. O Brasil fechava assim uma época de ouro: campeão do mundo em 1958, 1962 e 1970.

Contámos esta lengalenga toda porquê? Porque essa foi a primeira vez que um capitão brasileiro marcou num Mundial. Hoje, Thiago Silva imitou-o. Marcou o primeiro da noite e deixou o Castelão em ebulição. Faltou dizer que, entre eles, apenas Edinho, capitão do escrete no México-86, havia seguido as pisadas de Carlos Alberto.

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O Brasil desta noite foi… mais Brasil, como dizia Gary Lineker, via Twitter. E é isso mesmo. Oscar esteve mais perto do corredor central. Fernandinho e Paulinho não se colaram aos centrais e deram outra dimensão ao meio-campo, que já quis ser protagonista e ter a bola. Hulk apareceu soltinho, com vontade de destroçar a defesa rival. Neymar (sairia lesionado) esteve aquém e Fred foi um fantasma.

A primeira parte só deu Brasil, com exceção para um lance de Cuadrado, que resgatou a bola e chutou muito perto do poste esquerdo de Júlio César, e outro, um contra-ataque fabuloso começado por James Rodríguez, que falhou na hora H. Ruud Gullit acusava os colombianos de estarem a pensar neles e a jogar pouco em equipa. Não parecia o caso. A culpa era dos brasileiros que fechavam os caminhos da sua baliza e corriam mais do que os outros. Quando craques querem muito, fica muito mais fácil. James mal tocava na bola, mas merecia o respeito dos canarinhos: sofreu quatro das dez faltas da primeira parte.

O golo dos brasileiros surgiu logo aos sete minutos, o que explicou a atitude e confiança do escrete. Neymar bateu o canto, ninguém desviou ao primeiro poste, sobrando para o segundo poste, onde estava Thiago Silva para encostar para a baliza deserta. O capitão não chorou desta vez, apontou para o céu e agradeceu.

A segunda parte mostrou uma Colômbia com mais compromisso, mas não haveria volta a dar. O Brasil queria muito vencer esta partida e encontrar a Alemanha nas meias-finais, reeditando assim a final de 2002. O jogo continuou muito intenso, com disputas de bola acesas e muito coração. Os colombianos não conseguiam inventar espaço para Cuadrado e companhia fazerem estragos. O destino parecia traçado.

Já o fado de Thiago Silva, que se adivinhava sorridente, seria trágico. Aos 64′, Ospina, o guarda-redes colombiano, ia chutar a bola e o central colocou-se à frente para o travar. Resultado? Um cartão amarelo e um senhor jogador isento das meias-finais. David Luiz tratou de consolar o seu companheiro de “zaga” cinco minutos depois. E à Pirlo. Ou Cristiano Ronaldo. Ou à craque, se quiserem. Que golaço de livre direto — a forma como bateu na bola e o efeito da mesma foram estranhos, muito estranhos. O Brasil não marcava deste jeito desde 2002, quando Ronaldinho enganou David Seaman com uma “chapelada”.

À Colômbia restava-lhe agarrar-se ao coração e tentar o impossível. Pekerman já havia lançado Adrián Ramos ao intervalo e acabaria por lançar Bacca durante a segunda parte. A ideia era pressionar mais alto e fazer mossa no ataque. Estranha a ausência de Jackson Martínez, que estava com a moral em alta depois dos dois golos ao Japão. A resposta chegou de penálti: Júlio César derrubou Bacca. Quem haveria de assumir? O craque, certo? E foi. James Rodríguez pegou na bola, respirou, partiu para ela, fez uma paradinha e escolheu o lado com calma de craque. Com simplicidade. Sexto golo do número 10 colombiano na Copa.

Los cafeteros continuariam a pressionar e Bacca até esteve muito perto do empate, depois de um cruzamento milimétrico de James, pois claro. Até Ospina subiu à área do inimigo para tentar trair o seu colega de profissão. Nada feito. O Brasil desta noite teve o coração de 200 milhões. A força da rua. O Grito do Ipiranga ouviu-se, finalmente. Mas ainda não enche o olho, ainda não é samba, mas está muito melhor: já dá para um forró.

coise

James acabou em lágrimas, consolado por David Luiz, Marcelo e companhia. É um craque. Não merecia que o torneio acabasse para si. Em 2018 há mais, James…