Luis Conejo. Já ouviu falar? Era o guarda-redes da Costa Rica na estreia do país em Campeonatos do Mundo, em 1990. O grupo — Brasil, Escócia, Suécia — parecia uma missão impossível, mas esta seleção espantaria meio mundo. Ou todo. Conejo sofreria apenas dois golos e a sua seleção seguiria em frente.

A estreia seria gloriosa contra a Escócia (1-0). Depois chegou o sabor da derrota contra a canarinha, cortesia de Müller. Os costa-riquenhos voltariam a jogar em Génova, no Estádio Luigi Ferraris, como haviam feito na primeira jornada, e venceriam outra vez. Dois-um contra Ravelli, Schwarz, Brolin e companhia. O milagre estava feito. Hola “oitavos”.

O stop chegaria a seguir. A Checoslováquia não daria quaisquer hipóteses aos estreantes: 4-1 com hat-trick de Skuhravý, o tal avançado que aterraria em Alvalade cinco anos depois. A notícia era a Costa Rica sofrer tantos golos. Mas há uma explicação: Conejo não jogou. Depois do torneio, o guarda-redes seria transferido para o Albacete.

Vinte anos depois, em 2010, também Keylor Navas assinaria pelo Albacete. Se isto não é uma bela história… Quatro anos mais tarde, qual Conejo 2.0, Navas voltaria a encher a baliza da seleção das américas num Mundial, reeditando, várias vezes, uma espécie de David contra Golias com quem lhe ia aparecendo pela frente. É impossível não falar em Navas, o guarda-redes do Levante que tem uma cláusula de rescisão de dez milhões. Peanuts para quem promete milagres.

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A Holanda que o diga. O homem tem asas, tem braços de quatro metros, tem impulsão de canguru e, quando é ultrapassado, tem um qualquer pacto com os deuses do futebol. Os holandeses começaram bem, com mais bola. Van Gaal não desistiu dos três centrais, mas decidiu, e bem, dotar a equipa de extremos (Depay e Robben). Finalmente. Van Persie e Robben testaram o novo herói nacional costa-riquenho. Sem sucesso. A Costa Rica dava um ar da sua graça apenas de bola parada. Estavam tímidos e a bola não chegava a Campbell em condições.

A segunda parte chegou e tudo mudou. A Costa Rica descomplexou-se, livrou-se das amarras e arriscou trocar a bola entre os seus jogadores. A Holanda ficou desnorteada. Já não sabia controlar a bola. Não sabia romper e descobrir espaços. Quando conseguia algo, a bola acabava abraçada por Navas. Era como ver um filme sabendo já o seu final: remate, Navas.

O jogo estava mastigado. Aborrecido. O “brilhozinho nos olhos” chegou quando o relógio anunciou o minuto 82. A Holanda estava por cima nesta fase, a fazer sentir a sua força. A sua tradição. A história. A Costa Rica, guerreira e rigorosa, ia aguentando lá atrás. Navas salvava tudo. Quando não era o guarda-redes, era o poste. Sneijder bateu um belo livre, que acabou por esbarrar no ferro. Navas voltou a encher a baliza perante Van Persie, que ainda teria um falhanço incrível. Até Tejeda sacou uma bola em cima da linha, que acabaria por beijar a trave. Os deuses só podiam estar loucos com esta prova de resistência. Épico.

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O prolongamento, esse maldito para os holandeses — perderam sempre que o jogaram em Campeonatos do Mundo –, chegaria de mão dada com a calma. O jogo serenou depois daquele final de loucos. Van Gaal lançou Huntelaar no intervalo do prolongamento e montou uma espécie de 4-2-4 para o último sufoco. Era tempo de evitar ir a penáltis contra Navas.

A cinco minutos do apito final, Bolaños ainda trocou as voltas à espremida defesa laranja. A resposta chegou por Sneijder: bola na trave outra vez. As palavras de Falcao começavam a fazer (ainda mais) sentido. Este homem tem um qualquer pacto divino. Conclusão: ninguém teria arte e engenho para desatar o empate. O universo, o destino, o fado e quem via esta partida teve o que queria: penáltis.

Antes, uma originalidade. Van Gaal lançou Krul, guarda-redes do Newcastle, a dois minutos dos penáltis. Seria um especialista?… Et voilà! Krul acabaria por defender dois, um deles de Bryan Ruiz, o camisola 10 da Costa Rica. A Holanda volta a alcançar as meias-finais, tal como em 2010. Chegar duas vezes seguidas às “meias” só tinha acontecido a esta seleção em 1974 e 1978, quando perderam as duas finais do Campeonato do Mundo.

Keylor Navas foi grande, enorme. Como já havia sido: só sofreu um golo nesta Copa. Incrível. Esta noite os deuses voltaram a estar do seu lado. A sorte, o azar dos outros. Seria insuficiente isso tudo. Era sempre justo que qualquer uma delas acabasse a sorrir. O que parecia um Mundial talhado para as surpresas, acaba com quatro potências nas “meias”, que, entre elas, somam 21 finais — Brasil, Alemanha, Argentina e Holanda.