O ‘sete’ no banco. Ainda por cima, já capitão. Eis um desafio. Limpa-se o pó à memória, escrevinha-se pela Internet, pergunta-se ao Google e, entre estradas e atalhos, lá se encontra. O dia era 9 de setembro, o ano 2005, e juntos dão a resposta: foi nesta data que, pela última vez, se viu Ricardo Quaresma sentado no banco de suplentes do FC Porto, quando a noite era de Liga dos Campeões. Quase uma década depois, mais do mesmo.
Na altura fora em Glasgow (na derrota, 2-3, contra o Rangers), e agora era em Lille. E não foi por falta de aviso. Não há titulares garantidos, lembrou Julen Lopetegui, antes da partida. “Em cada jogo há 11, é assim”, reforçou, talvez já a matutar o papel de Quaresma no carrossel onde quer ver os dragões a girarem. E o extremo, porventura, poderia emperrá-lo: na primeira jornada da liga, perdeu a bola por 23 vezes, contra o Marítimo. Contra os franceses, era proibido.
Cedo se percebeu porquê. Mavuba, Balmont e Gueye, o trio de médios do Lille, devem ter estado colados à televisão e com os olhos postos na estreia do Porto no campeonato, pois sabiam bem o que tinham de fazer. E quando. Na primeira parte, rara foi a vez em que Casemiro, Óliver, Herrera ou Rúben Neves receberam a bola e tiveram tempo para, com ela, darem meia volta e virarem-se de frente para a baliza francesa. Nas costas, muito perto ou a lá chegar, tiveram sempre um gaulês a pressioná-los que nem mais não.
Os cercos cerravam-se assim que alguém se aproximasse do posto fronteiriço, fixado a meio campo. Aí, pelo centro, os médios franceses fechavam muito, e bem, os espaços. Portanto, olhava-se para as alas como a melhor forma de fuga. Aos 11 minutos, Brahimi estava quase encostado à bandeirola de canto, esperou que Rúben Neves surgisse, passou-lhe a bola, e o miúdo nem pensou: rematou logo e Vincent Enyeama defendeu para canto. Depois, a jogada que mais se pareceu com algo de perigoso só apareceu aos 44’, quando Óliver aguentou a bola e a passou para Jackson que, já dentro da área, rematou a bola rasteira.
A bola era dos dragões. Quanto isso, não havia dúvidas. Nem o Lille as tinha — havia 70% de posse de bola portuguesa, ao intervalo. Mas podia, isso sim, impedir que o FC Porto chegasse à baliza francesa com ela nos pés. E conseguiu-o. Aos 44’, aliás, houve um susto antes do intervalo, e foram os franceses a pregá-lo. Origi ganhou uma bola a Danilo, na direita, cruzou-a, e Corchia atirou por cima, à segunda, após Alex Sandro lhe bloquear a primeira tentativa.
Tudo igual. Ao intervalo, um nulo. Depois, entre os 45’ e os 60’, nada aconteceu para o quebrar. Um canto aqui, um livre ali, e sempre a bola acabou ora nas mãos de Fabiano, ou Enyeama. Nos dragões, porém, uma coisa se viu: tudo o que obrigava a manter a bola parada na relva, era para Rúben Neves bater.
Sim, o adolescente, o tal com 17 anos, 5 meses e 7 dias que, assim que entrou em campo, quebrou um recorde: tornou-se no mais jovem português a jogar na Liga dos Campeões. E roubou a marca a uma lenda. Sim, a Cristiano Ronaldo, que detinha a honra desde que, em 2002, se estreara pelo Sporting. E à hora de jogo, Rúben Neves estaria na jogada que recompensou tanta posse de bola azul e branca.
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Herrera levantou a bola, mandou-a para o outro lado do relvado e pediu a Tello que a dominasse. O espanhol, acabado de entrar — sim, Quaresma continuou sentado –, tocou-a de cabeça para Rúben, que a aguentou consigo até que extremo corresse uns metros. Até que lhe devolveu a bola, o espanhol cruzou-a para a área e Jackson, de cabeça, rematou-a. Enyeama fez uma grande parada, mas a bola ficou ali à frente, a um metro da baliza, onde apareceu o pé direito de Hector Herrera. 1-0 e, por fim, tranquilidade.
No minuto seguinte (61’), entrara Rony Lopes, o português do Lille. Correu, pediu a bola e tentou fintar. Conseguiu-o, várias vezes, como aos 92’, em que um cruzamento seu não foi aproveitado por ninguém vestido de vermelho. Antes, aos 75’, e após um livre batido por Cochia, entre os vários que os franceses tiveram, Fabiano não agarrou a bola quando no meio estava de um maralha de jogadores. Um pequeno susto.
De resto, os dragões foram trocando a bola, mexendo muito as peças e procurando manter o carrossel a girar. Com 85 minutos contados, Ricardo Quaresma levantou-se e entrou em campo. Participou. Terminado o encontro, constata-se o óbvio: o FC Porto sai de França com um golo marcado fora e uma quase dupla vantagem para o encontro da segunda mão, no Estádio do Dragão.
Depois, refere-se há o outro resto. Sem contar com os suplentes, os 11 homens que começaram de início na equipa portista tocaram todos mais de 30 vezes na bola. Uns mais que outros — Casemiro (81) e Hector Herrera (71), são exemplos –, por supuesto, dirá o espanhol que, e isso nota-se, está a embriagar esta equipa com o vício de ter a bola durante muito tempo e não a dar de barato ao adversário.
Até agora, dois jogos, um par de vitórias e supremacia no tempo passado com a única coisa redonda que está no relvado. E o carrossel a ser empurrado com cada vez mais força.