Está sob fogo cerrado na Alemanha o plano de estímulos anunciado pelo Banco Central Europeu (BCE) na quinta-feira, 2 de outubro, que inclui a compra de pacotes de dívida privada no mercado. O presidente do banco central alemão, o antigo economista-chefe do BCE e aliados políticos de Angela Merkel intensificaram este fim de semana as críticas ao programa de estímulos.
Jens Weidmann, governador do banco central alemão (Bundesbank) e membro do conselho de Governadores do BCE, aproveitou uma entrevista à revista alemã Focus, publicada domingo, para alertar para o risco de o BCE vir a comprar “securitizações de créditos de baixa qualidade” a preços demasiado elevados.
Se isso acontecer, “então os riscos de crédito assumidos pelos bancos privados serão transferidos para o banco central e, portanto, para os contribuintes sem que estes recebam algo em troca”, afirmou o responsável, citado pela Reuters.
Já a partir de “meados de outubro”, o BCE vai avançar com a aquisição de títulos de dívida hipotecária (“covered bonds”), um dos instrumentos que os bancos mais utilizam para se financiarem, dando lotes de créditos hipotecários e créditos ao setor público como garantia. Ainda este ano, vai avançar-se também com a aquisição de pacotes “simples e transparentes” de dívida titularizada, isto é, títulos garantidos por empréstimos dos bancos às empresas. O objetivo é “estimular o crédito às pequenas e médias empresas” na zona euro, explicou o presidente do BCE a 2 de outubro.
Weidmann alertou também para os perigos de se procurar uma desvalorização da moeda única. “Uma política que procure enfraquecer deliberadamente a moeda também provocará reações. Todos acabam como perdedores numa desvalorização competitiva”, alertou o governador do Bundesbank. A moeda única desce mais de 9% face ao dólar desde maio, com os investidores a refletirem as expectativas de mais estímulos monetários pelo BCE.
BCE: um “banco tóxico”?
As críticas ao programa anunciado pelo BCE vieram também de alguns aliados políticos de Angela Merkel, a chanceler alemã. Hans Michelbach, membro destacado do partido Bávaro, irmão da CDU de Merkel, afirmou que o BCE parece ter “perdido o juízo” e que arrisca transformar o banco central num “banco tóxico”. Em particular, o responsável apontou o dedo às compras de ativos que o BCE irá fazer a bancos da Grécia e de Chipre, que têm “rating” abaixo de “investimento de qualidade”.
Norbert Barthle, membro do partido de Merkel, alertou para o risco de estes ativos acabarem “no colo” dos contribuintes alemães. “Esta redistribuição de riscos não é uma competência do BCE”, criticou.
Comentários semelhantes aos de Juergen Stark, antigo economista-chefe do BCE que se demitiu em 2011 em protesto contra a intervenção do banco central no mercado de dívida pública. Para este responsável, as novas medidas são “um ato de desespero”. “O BCE não tem legitimidade democrática para isto”, criticando um plano que “não tem nada a ver com política monetária”.