O Idrætsparken estava à pinha. Ouviam-se gritos, palmas e qualquer reação que a bancada deixava escapar. “Era um ambiente com muita gente”, recordou um dos 22 homens que lá estavam, talvez ciente de que, ali, no antigo estádio de Copenhaga, cabiam mais de 52 mil pessoas. Estava quase cheio. Como se quer. Pelo menos para Octávio Machado. “Só um menino com problemas nos ouvidos é que não gosta de jogar num estádio com ruído contra nós”, defendeu quem, em 1977, marcou um dos quatro golos que a seleção nacional trouxe da Dinamarca.

Também foi em outubro. Na altura, ao nono dia do mês. A missão era idêntica — era preciso transformar a visita a Copenhaga numa vitória, para bem da qualificação para o Mundial de 1978. Sucesso: no final, Portugal ganhou por 4-2. Golos de Rui Jordão, Nené, Manuel Fernandes e Octávio Machado. Não mais a seleção nacional saiu da Dinamarca a rir-se. Nas três visitas que se seguiram, um empate (1-1 em 2009) e duas derrotas (4-2, em 2006, num amigável, e 2-1, em 2011, na qualificação para o Euro 2012). A última vitória já lá vai: foi há 37 anos.

Já contra a França a conversa navegou pela mesma maré — com a derrota (2-1) de sábado, a nona seguida, a seleção nacional leva 36 anos sem vencer a equipa que fala com a bola em francês. E com os dinamarqueses, o que se tem passado: será do ambiente do estádio em Copenhaga, que aperta com os visitantes?

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Octávio Machado, que em 1977 marcou o último golo português, acha que não. “O difícil é jogar em estádios vazios, onde não se ouve nada. Estes, assim, são motivantes. Só um cobardolas é que tem medo”, argumentou, em conversa com o Observador, sem duvidar que uma seleção nacional “destas” tem “uma capacidade psicológica que ultrapassa isso”.

O Parken, recinto que, em 1992, foi erguido no mesmo local onde se demolira o Idrætsparken, estádio que viu Portugal ganhar, deverá encher nesta terça-feira. Algo que “só pode ser estimulante”, defendeu o antigo médio e hoje treinador, de 65 anos. Desarmada a questão do ambiente, poderá então ser do clima? Também não, e agora é Toni quem o diz. Ele que, em 1977, também foi titular na última seleção a ganhar em Copenhaga. “Ninguém está à espera de apanhar sol na Dinamarca. Isso não pode ser desculpa”, disse o ex-treinador do Benfica que, “como toda a gente sabe”, sublinhou, nesta altura “apanha-se frio a sério ou temperaturas mais baixas” no país.

Frio, chuva ou neve, para Toni, “nada retira a diferença que existe” entre Portugal e a Dinamarca, “sobretudo nas individualidades”. A mesma, porém, que já se dizia existir em 2011, quando a equipa de Paulo Bento perdeu (2-1) em Copenhaga e foi obrigado a fazer escala num play-off (contra a Bósnia), antes de aterrar no Europeu de 2012. Ou a tal que, 2007, após um 4.º lugar no Mundial, não chegou para evitar uma derrota (4-2) num amigável. “A imagem que temos da Dinamarca é a de uns homens altos, loiros e toscos, mas de vez em quando saem de lá uns Laudrups”, acautelou Toni, que nas duas últimas épocas andou pelo Irão, a treinar o Traktor.

O português referia-se à dupla de irmãos, Brian e Michael, que entre a década de 80 e 90 ajudaram a Dinamarca a dar nas vistas. “Ninguém esquece o Europeu de 1992, em os dinamarqueses estavam na praia e foram chamados para substituir a Jugoslávia. E ganharam”, lembrou. Explicar para quê? Foi mesmo isso que aconteceu, quando a Dinamarca foi campeã europeia, ao ganhar na final à Alemanha. Para Toni, houve “muitas Dinamarcas nestes últimos 37 anos” e esta “foi a melhor”. Não a de agora. Mas será esta que a seleção nacional terá de vencer para não voltar a abrandar na corrida para o Europeu de 2016. No sábado, em Paris, no primeiro encontro com Fernando Santos a mandar, viu-se uma derrota. “A dinâmica nova não proporcionou uma equipa equilibrada na primeira meia hora”, analisou Octávio Machado, cujos olhos detetaram, uma e outra vez, um Eliseu e um Cédric “sem coberturas”.

Ou seja, estiveram muitas vezes sozinhos contra dois ou três franceses, que faziam uma tabela e os ultrapassavam. “A entrada do William, sacrificando André Gomes, um dos portugueses em melhor forma, deu um equilíbrio à equipa e outra proteção aos alterais”, opinou. O losango que Fernando Santos montou no 4-4-2, porém, deixou-se por várias vezes desmontar. “Ninguém espere que, de sábado para terça-feira, surjam grandes diferenças”, avisou Toni, ao lembrar que na seleção “não há o tempo para trabalhar que existe num clube”.

O selecionador experimentou. E Cristiano Ronaldo gostou. E disse-o. “Ele pode ter gostado da tática. Mas perdeu. A tática não ganha jogos. O importante é a dinâmica, independentemente do modelo escolhido. Nunca ouvi um treinador dizer: ‘Perdemos, mas estivemos bem taticamente.’”, defendeu Octávio Machado. E equipa que “tem o melhor jogador do Mundo”, concluiu, “só pode ambicionar ganhar em qualquer parte” do planeta. “O problema é que ele só aparece a espaços”, acabou por lamentar, esperando que, esta terça-feira, “ele materialize em golos toda a qualidade que tem”. E que “Portugal ganhe”. Como não se vê há 37 anos.