Intimista, transparente e espontâneo – quanto baste. Ouvir Alex Blumberg é mais do que acompanhar o lançamento da Gimlet Media. É uma viagem ao submundo do empreendedorismo. Termos como ‘objetivos’, ‘sucesso’ ou ‘retorno’ quase que desaparecem para dar voz às dúvidas e inseguranças de quem arrisca lançar um negócio próprio, quando a única coisa que o sustenta é a paixão pela ideia. Neste caso, pelo áudio. Melhor, por aquilo que ficou genericamente conhecido por podcasts, arquivos de áudio digital em formato MP3 que a Apple lançou no circuito mainstream com o lançamento dos primeiros iPods, há uma década.

Alex Blumberg é um dos produtores do This American Life, um dos programas de rádio (distribuídos por podcast) mais populares dos Estados Unidos da América (EUA), que já venceu três Emmys; e cofundador do Planet Money, outro podcast dedicado à Economia. Apaixonado pelo género, queria mostrar ao mundo que juntar áudio com jornalismo e storytelling podia ser um negócio lucrativo. Mas era preciso que alguém apostasse no setor. Porque não ele? A ideia de criar um negócio de podcasts surgiu desta forma. A ideia de documentar o processo veio a seguir. E está disponível na página StartUp.

Na StartUp, há podcasts sobre como é que Alex Blumberg vai lançar uma startup de podcasts. Tudo na primeira pessoa. O relato sobre o processo, que conta já com cinco episódios, é uma espécie de documentário áudio, onde se desvendam as fragilidades de quem está a empreender: da busca pelo investimento às críticas da esposa de Alex, à relação com o cofundador, que surge no terceiro episódio, ou a ansiedade gerada em busca do nome perfeito. “Glimet Media” é a surpresa do quinto episódio e a novidade mais recente do projeto lançado por Alex Blumberg no início de setembro. Os primeiros três episódios já entraram para o top 5 dos podcasts mais ouvidos do iTunes.

O que melhor define o projeto? A ansiedade de Alex Blumberg, mais do que evidente no programa estreia e no encontro com o investidor Chris Sacca. A forma como se engasga durante a apresentação do projeto, ainda que num contexto informal, não bate certo com a experiência de 15 anos que Blumberg detém na área.

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A conversa com Sacca, que foi um dos primeiros investidores do Twitter – pormenor que Alex descobre durante o encontro em Los Angeles – é uma reviravolta no discurso. A confiança dá lugar ao nervosismo. É o mesmo Alex Blumberg que ouvimos durante a narrativa? Sim, numa versão ‘homem de negócios’ desengonçada, que não sabe responder à pergunta decisiva: afinal, qual é a grande vantagem do projeto que quer lançar?

As conversas que Alex foi tendo durante o lançamento da Glimet Media foram gravadas e os excertos são colocados no podcast, entre músicas e narrativa. É por isso que ouvi-lo é uma imersão no íntimo de Alex, não só na empresa, mas na família, ou nos desabafos que tem a meio da noite. O cenário visualiza-se na cabeça do ouvinte, e não depende de um exercício exaustivo, é espontâneo. É essa, aliás, uma das vantagens dos podcasts de storytelling, a ilusão da intimidade.

A imagem dos empreendedores confiantes e seguros, que apresentam projetos em 2 minutos, humaniza-se: afinal, quais são os sapatos certos para uma reunião com um investidor? No primeiro programa, Alex Bumberg explica que a série vai ter entre seis a oito episódios, que o processo vai a meio e que “não faz a mínima ideia de como vai acabar”. A única coisa que sabe é que tem dois filhos, com dois e quatro anos, uma mulher com uma profissão exigente e que vai ter de gastar as poupanças de ambos durante o processo. E que à noite se deita com a esperança de que tudo corra bem.

“Eu sou o tipo da garagem com uma grande ideia. Sou Steve Jobs. Não o verdadeiro Steve Jobs, mas o Steve Jobs do podcast semanal que dura entre 20 e 40 minutos”, diz, durante o primeiro episódio, acrescentando que vai retratar o processo da forma mais transparente possível, incluindo a forma como conseguiu a publicidade, que interrompe os episódios a meio.

No segundo episódio, a dúvida: quer Alex Blumberg que o seu projeto se torne numa espécie de instagram do áudio, tal como sugere um segundo investidor? E no terceiro, o ‘namoro’ com aquele que acaba por ser cofundador da empresa, Matt Lieber, e as dúvidas sobre a fatia do capital social que este deverá ter. Afinal, como se chega à percentagem que é considerada justa?

No quarto episódio, o desabafo, entre sussurros, às 5h30, num momento que dura quase quatro minutos, sobre a solidão, os filhos, o medo, a imersão no mundo do capital de risco. Será Alex Blumberg capaz de “viver e respirar” a Glimet Media durante 24 horas por dia, sete dias por semana?

“Eu não consigo fazer isso. Não quero fazer isso. Já ando a chorar pelo tempo que não estou com os meus filhos. Estou assustado”, revela.

E no final, o primeiro investimento que consegue captar para a ideia: 385 mil dólares. Mas vão ser precisos cerca de 1,5 milhões para que a empresa consiga sustentar três programas durante 18 meses.

No programa seguinte, disponibilizado na segunda-feira, 13 de outubro, o trabalho árduo em busca do nome perfeito. Que acaba por ser tão trendy, como o próprio podcast, “Gimlet”: um cocktail feito com gin, vodka e sumo de lima. “Soava a fresco”, explica Alex Blumberg.

Os podcasts voltaram a estar em voga, depois do declínio dos últimos anos. Ouvir uma narrativa áudio em casa, no carro ou na rua tornou-se ainda mais fácil com o aparecimento do iPhone, em 2007. Entretenimento de nicho, está a suscitar cada vez mais fãs, sobretudo nos Estados Unidos da América e, segundo o Washington Post, pode ser uma das áreas de aposta para o futuro. No ano passado, a Apple indicou que o iTunes registou cerca de mil milhões de subscrições de podcasts.

Num mundo cada vez mais digital, a busca pela intimidade pode estar a renovar-se. No filme Uma História de Amor (Her, no título original), Joaquim Phoenix interpreta Theodore, um escritor solitário que se apaixona por um novo sistema operacional, do qual conhece apenas a voz. Com a quantidade de informação visual que é diariamente distribuída por todos os meios de comunicação social, os ouvidos podem ser o escape do futuro. E, se forem, há margem para o negócio? Alex Blumberg espera que sim.