O Banco de Portugal defende a medida de resolução aplicada ao Banco Espírito Santo, que levou à transferência dos ativos “saudáveis” para o Novo Banco, mas reconhece que é “necessário acompanhar de perto a atual situação, garantindo a manutenção da confiança dos agentes económicos e a estabilidade do sistema financeiro nacional“. Este é um dos principais riscos para a economia portuguesa identificados pelo Banco de Portugal no Relatório de Estabilidade Financeira, publicado semestralmente e que a instituição divulgou nesta quarta-feira.
“Da análise dos principais indicadores de mercado, e com base nos dados disponíveis até ao início de novembro, observa-se que, globalmente, a adoção da medida de resolução ao BES permitiu preservar a estabilidade e a confiança no sistema financeiro nacional e conter os efeitos sistémicos, não obstante tratar-se de um dos mais relevantes bancos nacionais”, reafirma o Banco de Portugal. Ainda assim, apesar de haver “sinais reveladores de um impacto limitado e temporário nos mercados financeiros, torna-se necessário acompanhar de perto o potencial efeito que a situação que levou à necessidade de adotar uma medida de resolução ao BES poderá vir a ter na economia”.
O BES tinha “fortes interligações” com o restante setor financeiro e “desempenhava um papel muito significativo no sistema financeiro e na economia nacionais”, pelo que “importa monitorizar de perto as consequências decorrentes da súbita redução dos níveis de solvabilidade do BES que, por sua vez, determinou a aplicação da medida de resolução”, explica o Banco de Portugal.
Uma medida de resolução que, diz a instituição, se tornou “imperativa e urgente“, já que era necessária uma “solução que garantisse simultaneamente a proteção dos depositantes, a estabilidade do sistema financeiro e a continuidade do financiamento da economia, minimizando, em simultâneo, o impacto sobre o erário público“, pode ler-se no relatório divulgado nesta quarta-feira.
Os riscos para a riqueza e para a confiança
Entre os riscos admitidos pelo Banco de Portugal estão as possíveis “implicações” estão “o efeito riqueza resultante das perdas assumidas pelos acionistas e pelos credores subordinados do BES, que residam em Portugal, bem como as perdas de residentes” que fossem acionistas ou credores das empresas do Grupo Espírito Santo (GES) que entraram em insolvência. Este efeito para a economia é “difícil de avaliar”, diz o Banco de Portugal, pelo que será necessário “o acompanhamento do seu eventual reflexo na procura doméstica e, consequentemente, na atividade económica”.
Além disso, há riscos associados às “falhas observadas” na administração do BES e as “perdas pelos acionistas e credores subordinados do BES poderão gerar efeitos ao nível da confiança”. Isto porque pode afetar “a perceção dos agentes económicos sobre a qualidade da gestão das empresas” ou “as suas decisões de investimento no curto prazo, prejudicando o funcionamento do mercado de capitais”.
Por fim, há um “potencial impacto da atual situação de transição sobre o desenrolar da função de intermediação financeira do setor bancário”. É necessário “monitorizar a evolução do crédito concedido, focando não apenas em potenciais efeitos volume e preço, como também na forma como o crédito é alocado entre os diversos setores da economia”. Aqui, os dados mais recentes apontam para uma melhoria da concessão de crédito, ainda que continue em “terreno” negativo na variação homóloga, indica o Banco de Portugal.
Banco de Portugal preocupado com exposição da banca ao imobiliário
As questões associadas ao BES são um dos riscos identificados no relatório. Mas o Banco de Portugal destaca também a exposição “significativa” dos bancos ao mercado imobiliário, não só no crédito mas também quanto à utilização de imobiliário como colateral e ao investimento em unidades de participação em fundos imobiliários. O Banco de Portugal receia que “a necessidade de manter o processo de ajustamento do balanço dos bancos poderá conduzir à venda mais célere e volumosa de parte daqueles ativos, pressionando os preços no mercado imobiliário e invertendo os sinais de recuperação registados desde meados de 2013”.
Por outro lado, o Banco de Portugal salienta também os riscos associados às baixas expectativas de crescimento tanto em Portugal como no resto da Europa, o que aumenta a pressão sobre o país na missão de reduzir o endividamento, sobretudo num contexto de inflação baixa. Para a banca nacional, o Banco de Portugal indica que um dos principais desafios do setor é a recuperação da rentabilidade.
Dívida pública não permite aliviar esforço de ajustamento
O Banco de Portugal indica também que “apesar da consolidação orçamental sem precedentes durante o programa de assistência económica e financeira, os níveis de dívida pública não permitem aliviar o esforço de ajustamento“. Assim, “a manutenção de uma trajetória firme de consolidação orçamental continua a ser crucial para garantir a credibilidade externa e alicerçar o crescimento económico sustentado”, pode ler-se no relatório publicado esta quarta-feira pelo Banco de Portugal.
Importante será, também, indica a instituição, “garantir um processo de ajustamento que promova a desalavancagem [redução da dívida] nos vários setores da economia portuguesa e, simultaneamente, crescimento económico assente em investimento em setores com níveis de produtividade elevados e que beneficiem de uma procura sustentável”. Aqui, o “setor bancário deverá ter um papel fundamental na reafetação de recursos aos referidos setores, condição indispensável para o sucesso do referido processo de ajustamento da economia portuguesa”, conclui o Banco de Portugal.