Mais de 80 pessoas foram detidas na segunda-feira à noite no condado norte-americano de Saint Louis, na sequência dos distúrbios ocorridos após a decisão de um júri de ilibar um polícia que matou a tiro um adolescente. A maioria das detenções (61) foi realizada na cidade de Ferguson (estado norte-americano do Missouri), principalmente por roubos, pilhagem e atos de violência, segundo a informação divulgada por um porta-voz da polícia local, Brian Schellman. Também foram registadas 21 detenções na cidade de Saint Louis, indicou o presidente da câmara local, Francis Slay.
A vaga de indignação, que degenerou em tumultos, ocorreu depois da divulgação da decisão de um grande júri sobre o caso de Michael Brown, um adolescente afro-americano que foi morto a tiro a 9 de agosto deste ano por um polícia, identificado como Darren Wilson. Depois de escutar 60 testemunhas e o próprio Darren Wilson, o grande júri decidiu ilibar o polícia, afirmando que não existiam provas suficientes para acusar o agente da morte de Brown.
Numa conferência de imprensa improvisada, o chefe da polícia local, Jon Belmar, afirmou, que os distúrbios agora ocorridos foram mais graves do que os registados em agosto passado, logo a seguir à morte do adolescente. Não houve registo de vítimas mortais ou de feridos, mas várias lojas foram saqueadas e outras foram incendiadas. Uma dúzia de prédios e carros da polícia também foram incendiados por manifestantes. A polícia local recorreu a gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes. As forças policiais também asseguraram que foram ouvidos mais de uma dezena de tiros na zona dos protestos.
Por todo o país, milhares manifestaram-se contra a decisão do grande júri. Em Nova Iorque, os protestantes reuniram-se em Times Square, onde um manifestante atirou sangue falso ao comissário da polícia, William Bratton, que está a sofrer pressões para se demitir depois de a polícia nova-iorquina ter matado um homem negro desarmado na semana passada. O manifestante foi detido, segundo o Guardian.
Em Washington, cerca de 500 manifestantes reuniram-se junto à Casa Branca, depois de percorrerem as ruas da capital norte-americana em protesto. Não houve incidentes que obrigassem a polícia a intervir. Na outra costa, em Los Angeles, centenas juntaram-se no parque Leimert para ouvir a decisão do grande júri, deslocando-se depois para a baixa da cidade. Aí houve alguns confrontos com a polícia, escreve o Guardian.
Pouco tempo depois do anúncio da decisão do grande júri, o testemunho de Darren Wilson foi divulgado pela primeira vez. Wilson disse aos jurados que Michael Brown ficou muito irritado por ser mandado parar pelo polícia, descrevendo a expressão do rosto do jovem: “Parecia um demónio”. Quando os dois se envolveram numa luta corporal, Wilson sentiu que Brown era mais forte do que ele, apesar de o polícia ser mais alto. “Senti-me como uma criança de cinco anos a tentar agarrar o Hulk Hogan”, pode ler-se no New York Times. A versão de Wilson contradiz aquilo que muitos pensam ter acontecido no dia fatídico. Segundo o polícia, Brown não levantou as mãos em sinal de rendição, fechando o punho esquerdo e correndo na direção de Wilson, ao mesmo tempo que fazia um grunhido de raiva.
Os familiares de Michael Brown, apesar de estarem “profundamente dececionados” por “o assassino do nosso filho não ter de enfrentar as consequências das suas ações”, pediram à comunidade, num comunicado, que “canalizasse as frustrações para uma mudança positiva. É necessário trabalharmos juntos para arranjar o sistema que permitiu que isto acontecesse”.
Leslie McSpadden e Michael Brown Sr, mãe e pai de Michael Brown, apareceram esta tarde numa conferência de imprensa juntamente com os advogados e o ativista de direitos civis, Al Sharpton, mas não falaram. O advogado da família, Benjamin Crump, disse que a credibilidade do agente Wilson nunca foi posta em causa durante os interrogatórios perante o grande júri, acrescentando que um “estudante de Direito do primeiro ano teria feito um melhor trabalho”. Crump disse que o processo devia ser denunciado. Al Sharpton também criticou a forma como o caso foi conduzido: “Nunca vi um procurador dar uma conferência de imprensa para desacreditar uma vítima”, disse, atacando Bob McCulloch, o procurador que anunciou a decisão do grande júri na segunda-feira à noite.