Mais de um quinto da população portuguesa (22,9%) sofre de perturbações psiquiátricas, sendo que as mais prevalentes são a ansiedade (16,5%) e a depressão (7,9%). Números idênticos, num conjunto de 10 países analisados, só se encontram na Irlanda (23,1% da população sofre de perturbações mentais) e, já fora da Europa, nos Estados Unidos (26,4%). Esta conclusão é apresentada na segunda edição do relatório “Saúde Mental em Números 2014”, que está esta manhã a ser apresentado no Auditório do Hospital Júlio de Matos, em Lisboa.
As pessoas mais velhas apresentam uma maior probabilidade de sofrerem perturbações depressivas, de ansiedade e por utilização de substâncias. Sendo que o risco é maior para as pessoas viúvas, separadas ou divorciadas. As mulheres são as que apresentam um maior risco de sofrer de perturbações depressivas, sendo que são também as mulheres que mais procuram ajuda de profissionais, de acordo com o relatório.
E se é verdade que a mortalidade diretamente decorrente de doenças mentais não é “quantitativamente expressiva”, as doenças mentais apresentam um elevado impacto na vida dos portugueses na medida em que são as principais responsáveis pela incapacidade produtiva ao longo da vida. Tendo em conta o indicador dos anos de vida ajustados à incapacidade, as perturbações mentais e do comportamento surgem em destaque (20,55%), só depois seguidas das doenças respiratórias (5,06%) e da diabetes (4,07%). As perturbações mentais e do comportamento surgem ainda em segundo lugar no ranking das principais responsáveis por anos perdidos de vida saudável – que corresponde ao número de anos que teoricamente uma determinada população deixa de viver por morte prematura antes dos 70 anos de idade -, só sendo ultrapassadas pelas doenças cérebro-cardiovasculares.
No grupo das doenças mentais destaca-se a sobrecarga causada pelas perturbações depressivas (8,72%) e pela ansiedade (3,69%), referem os autores do relatório já citado.
A temática do suicídio é também abordada num dos capítulos do relatório. Em 2012 registou-se um ligeiro aumento do número de suicídios em Portugal, num total de 1.015, face a 2011 (951). Ainda assim, quando comparados os dados de 2011 com os restantes estados-membros da União Europeia, verifica-se que Portugal apresentava uma das taxas mais baixas. O mesmo não se pode dizer quando em causa está a faixa etária dos 65 ou mais anos de idade. Neste grupo da população a taxa de suicídios em Portugal (18,51%) era superior à média europeia (16,51%), em 2011, influenciada em grande medida pela taxa de suicídio nos homens (36,1% por 100.000 habitantes).
Equipas de saúde mental num patamar “inferior” às dos outros países da Europa Ocidental
Os relatores fazem algumas críticas à capacidade instalada em Portugal. Em resumo, escrevem, “as equipas de saúde mental em Portugal continuam num patamar de desenvolvimento significativamente inferior ao dos restantes países da Europa Ocidental”. E dizem mais: “Enquanto este aspeto não se modificar, é compreensível que a intervenção quase exclusivamente psicofarmacológica tenda a ser a resposta predominante, mesmo nas situações em que não está particularmente indicada, de acordo com a evidência científica disponível”. Em comparação com outros países europeus, Portugal apresenta o maior consumo de ansiolíticos, sedativos e hipnóticos.
Em 2013 havia 1.439 camas de internamento de psiquiatria de adultos no setor público, sendo que em Beja, Setúbal, Leiria, Aveiro e Setúbal não havia nem uma cama com este fim no Serviço Nacional de Saúde. O setor social tinha no mesmo ano 3.123 camas de internamento e 307 para reabilitação psicossocial. Nos cuidados continuados de saúde mental registavam-se 98 camas, “sempre lotadas”, como referem os autores do relatório que alertam para a importância de se avançar com a criação dos cuidados continuados integrados de saúde mental, criados por despacho pelo anterior governo, mas cujo processo ficou suspenso.
Ao nível dos recursos humanos, os especialistas destacam a má distribuição dos mesmos, dando como exemplos a região do Alentejo e do Algarve em que há metade dos médicos de psiquiatria de adultos desejáveis, sendo que nas outras regiões do país o número de médicos está entre 14 e 45% acima do número desejável. Já na psiquiatria de infância e de adolescência “a situação é bem mais preocupante”, referem, uma vez que apenas em Lisboa e Vale do Tejo e no Norte o número é ligeiramente superior a metade do desejável. Nas restantes regiões fica abaixo.
Em 2012, 66 a 92% das primeiras consultas de psiquiatria de adultos foram realizadas dentro do tempo de resposta garantido. Já na psiquiatria infantil e da adolescência houve mais utentes a esperar acima do tempo de resposta garantido.