Um projeto de doutoramento da Universidade de Coimbra conclui que a intervenção das Nações Unidas (ONU) na Somália tem um custo elevado, limita-se a criar corredores de segurança e não ataca as raízes do problema da pirataria.

A atuação da ONU na Somália, em que Portugal preside ao fórum jurídico, começou em 2008 e consiste “na criação de corredores protegidos por forças navais internacionais e forças armadas privadas, bem como no estabelecimento de uma infraestrutura rudimentar de julgamento” no país e num modelo de construção de um Estado central “imposto de cima para baixo e de fora para dentro”, criticou Gilberto de Oliveira, investigador da Universidade de Coimbra, que terminou recentemente um doutoramento sobre a intervenção da ONU naquele país do Corno de África.

O problema da intervenção da ONU na Somália, país onde se registaram um grande número de ataques de piratas somalis a navios mercantes em meados dos anos 2000, deve-se, em grande parte, à “sua forte dependência das forças navais estrangeiras”, sublinhou.

Apesar de se observar uma “redução na quantidade de ataques e sequestros nas águas do Corno de África”, a partir de 2012 e 2013, o investigador salientou que “não se pode ignorar” a capacidade dos piratas de “adaptação e diversificação das suas atividades para contornar as pressões impostas pela intervenção internacional”. Para além disso, desde a mobilização internacional que a capacidade do “embrião de governo central” da Somália para conter a pirataria não tem evoluído “substancialmente”, apontou.

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Enquanto aos olhos da comunidade internacional pode haver “a impressão de que o problema está solucionado”, “o máximo que se pode dizer é que a atividade da pirataria está momentaneamente adormecida”. Para o investigador, a sustentabilidade da segurança no litoral da Somália a longo prazo é “questionável”, salientando que as redes de pirataria, que persistem no país, “podem ser facilmente reativadas em larga escala, ao menor sinal de relaxamento da atual estratégia de contenção”.

O problema está longe de ser resolvido, concluiu, recordando que a pirataria somali remonta ao final dos anos 1980, estando ligada “ao estágio inicial de guerra civil na Somália” e “à deterioração da fiscalização do seu mar territorial”, entre outros pontos. Segundo o investigador, deveria ser pensada uma alternativa “ao nível das comunidades locais dependentes da pirataria”.

O “curto governo da União das Cortes Islâmicas” na região centro do país foi um exemplo das “mobilizações locais contra a pirataria”, sendo que em 2006 a pirataria tinha sido “praticamente eliminada” dessa zona do país, por ação das milícias islâmicas, que se retiraram da região em 2007, por intervenção de tropas da Etiópia, em apoio ao governo de transição.

A intervenção poderia ser criada “em micro-escala, de custo relativamente mais reduzido”, com respostas “negociadas de baixo para cima”, numa transformação “mais modesta, menos intrusiva e mais contextualizada”, defendeu.