Perruchet. O nome é chique, soa até a vinho francês carote. Talvez fosse fraco de acidez e frutado, com toque a madeira e cheirinho a fugir da metrópole. Quem sabe seria esse o nome de guerra caso os seus pais não tivessem abandonado França, quando atuava nas escolinhas do Bordéus. Adrien Sebastian Perruchet Silva, natural de Angoulême, celebrou o 26.º aniversário no Funchal, com o sol a piscar-lhe o olho. Mais importante: resolveu o duelo complicado contra o Marítimo, de penálti (1-0). Sem tremer e sorridente.

O sol convidava e o Estádio dos Barreiros abriu-lhe a porta e as janelas. A fotossíntese parece ter conectado e iluminado os homens da casa, pelo menos durante 15 minutos. Entraram com gás, ousados, com vontade de fazer mossa no corpo dorido cheio de mazelas dos visitantes. E quase conseguiram, não fosse uma enorme mancha e braços à Inspector Gadget de Rui Patrício: Marega isolou-se depois de um passe soberbo de Fransérgio entre o lateral e o central do Sporting e tentou contornar o guarda-redes. Para aqueles que diziam que com Jefferson o FC Porto não marcaria aqueles golos todos aproveitando as costas da defesa do lateral, bom…

Marítimo: Salin, João Diogo, Gegé, Raúl Silva, Rúben Ferreira, Danilo Pereira, Alex Soares, Fransérgio, Marega, Dyego Sousa, Xavier

Sporting: Rui Patrício, Cédric, Paulo Oliveira, Ewerton, Jefferson, Rosell, Adrien, João Mário, Carrillo, Nani, Slimani

O Sporting teve algumas dificuldades para acalmar os ânimos do rival. Mas foi conseguindo-o a partir do minuto 15. O ataque dos leões deu o primeiro sinal de vida, daqueles valentes e vigorosos, aos 26′: Carrillo, qual abre-latas, entrou pelo corredor direito a dentro e inventou uma forma de cruzar rasteiro e com GPS para os pés de João Mário. O talentoso médio evitou dar de primeira, parou e tentou colocar, mas João Diogo travou as ideias do finalizador com uma gesto heróico. O Sporting conseguiria com alguma facilidade fazer chegar a bola a Nani e Carrillo, pois os laterais dos madeirenses fechavam muitas vezes por dentro, juntando-se aos centrais para tapar os caminhos da baliza de Salin.

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Com o jogo meio entupido de ambas as equipas, Jefferson, numa aventura pelo corredor central, qual viajante a carimbar o mapa-mundo, recebeu a bola de Nani e, depois de pisar a bola (uh la la, classe) e enganar um defesa, puxou novamente e foi derrubado de forma imprudente por Raúl Silva. Os madeirenses ficaram nervosos, mas havia poucas dúvidas. Penálti: guarda-redes para um lado, golo de Adrien para o outro, 1-0.

O jogo cairia depois num tacho cheio de nada, sem ingredientes picantes, sem interesse. O lume estava branco. O Sporting jogava sem William (atuou Rosell a trinco) e Ewerton estreou-se a titular. Cédric e Jefferson tentavam aqui e ali dar sacudidelas no jogo enfadonho do Sporting, mas com pouco sucesso. Nos rivais, Benfica e FC Porto, quando a máquina não anda aparecem normalmente Salvio, Gaitán, Tello, Brahimi e Quaresma. No Sporting, e apesar de haver talento para dar e para vender, que faria sucesso em qualquer mercado de troca de especiarias do Vietname, há algo que falha: Nani não tem a luz de outros tempos, embora a espaços lembre os demais quem é; Carrillo, que se tornou outro jogador com Marco Silva — esforçado e competente defensivamente –, desaparece muitas vezes da partida.

Intervalo nos Barreiros. O Sporting deixou-se surpreender nos primeiros 15 minutos, mas acabou melhor este primeiro tempo. O jogo tornou-se equilibrado e aborrecido, sem oportunidades de golo, mas estava controlado pelos homens de Marco Silva, um treinador que celebrava o jogo 85 na Primeira Liga. Em dois anos e meio, e é bom recordar que treinou durante dois anos o Estoril Praia, Marco Silva somou 42 vitórias (28 no Estoril e 14 no Sporting — 134 golos marcados, 85 sofridos) em 84 partidas. Nada mau, hein?

A segunda parte não seria mais sedutora. Slimani, que até se estreou a marcar na Liga contra o Marítimo, continuaria a sua luta do costume entre os centrais, procurando o que melhor sabe fazer: dar dores de cabeça àquela gente toda. Este argelino tem muito coração e nunca desiste, dá gosto ver. A sua pressão era essencial na hora do Marítimo pensar o jogo.

O sol desapareceria eventualmente, em boa hora para o calor não atrapalhar a recuperação e a respiração ofegante dos atletas. Mas o andamento e intensidade não andariam de mãos dadas com esta partida. O segundo tempo era dividido em ações, com muita liberdade, qual duelo de xadrez que permite o tempo ao rival para pensar o que quer fazer. Aos 68′, o desinspirado Carrillo deu lugar a Carlos Mané, para oferecer outra pedalada e alegria ao apagado ataque do Sporting.

E foi ele, o jovem extremo, que inventou uma jogada e tocou para o meio, onde estava Adrien à espera. O médio tentou a sorte, mas a bola saiu por cima. Se estivesse farto de festejar o “parabéns a você”, Adrien podia sempre abrir uma garrafa de champagne para celebrar o 150.º jogo pelos leões — só Rui Patrício o supera. E este senhor Perruchet, ou Adrien Silva, até tinha uma magia a seu favor: sempre que marcou para o campeonato (12 vezes), o Sporting venceu. Adivinhava-se um belo presente de aniversário então…

Ponto final. Sporting volta a vencer e ajeita os retrovisores do monolugar para olhar lá longe o Sp. Braga, que perdeu sábado no Estádio da Luz (0-2). Os leões aumentam para sete os pontos de vantagem para os minhotos e já sentem o hino da Liga dos Campeões a soar junto às orelhas.

É justo também fazer uma referência a Danilo Pereira, um jogador que encantava muita gente nos juvenis do Estoril Praia e que rapidamente saltou para o Benfica. Hoje, é importante nos equilíbrios do Marítimo e é muitas vezes o cérebro da equipa. Neste domingo até mereceu usar a braçadeira. Esta foi a segunda partida de Ivo Vieira, que substituiu Leonel Pontes no banco dos madeirenses, depois de vencer o Paços de Ferreira (2-1).

Para se ver resultado igual, favorável aos visitantes, é preciso recuar a um fim de tarde de novembro de 2006. O Sporting de Paulo Bento enganou o Marítimo de Alberto Pazos. O herói nem foi Nani, nem Moutinho, muito menos Liedson, mas sim Tello, Rodrigo Tello.