Quando Nigel Farage, o líder do partido eurocético britânico UKIP, diz qualquer coisa como “eis um facto de que eu estou certo que algumas pessoas vão ficar horrorizadas por eu me atrever a falar dele”, então é porque algo verdadeiramente controverso está prestes a ser dito.
A frase continuou assim: “Todos os anos existem 7 mil pessoas são diagnosticadas com VIH neste país. Não é um bom lugar para elas, eu sei. Mas 60% deles não são cidadãos britânicos. Há quem venha para o Reino Unido, de todas as partes do mundo, é diagnosticado com VIH e depois recebem os medicamentos retrovirais que custam até 25 mil libras anualmente por paciente.”
Após um debate que terminou sem um vencedor claro, esta intervenção de Farage está a ser um dos momentos que está a gerar mais discussão no rescaldo do programa transmitido na ITV na noite de quinta-feira.
A primeira reação partiu de Leanne Wood, líder do partido galês de esquerda Plaid Cymru, se insurgiu diretamente contra a afirmação de Farage. “Esta retórica de arauto da desgraça é perigosa, é perigosa e divide comunidades. Coloca um estigma nas pessoas que estão doentes e eu acho que você devia ter vergonha de si próprio”, disse, arrancando aquela que foi a primeira ovação da noite em estúdio.
Já longe do foco das câmaras o líder trabalhista, Ed Miliband, escreveu no Twitter que este comentário de Farage foi “nojento” e que “ele devia ter vergonha”.
I want to say, Nigel Farage's comment about the NHS and HIV was disgusting. He should be ashamed. The fact he isn't says so much.
— Ed Miliband (@Ed_Miliband) April 2, 2015
Na mesma rede social, o candidato dos Liberais Democratas, Nick Clegg, falou da “política na maneira mais rasteira”.
And Farage's comments about foreign people with HIV were simply vile and desperate. Politics of the lowest form. #FairerSociety
— Nick Clegg (@nickclegg) April 2, 2015
Imprensa britânica diz que os números de Farage estão errados
Segundo um relatório oficial britânico referente a 2014, 62% das pessoas infetadas com VIH nasceram no Reino Unido, aponta o “The Guardian” – os números de Farage apontariam para 40%. Isto não significa que a percentagem de cidadãos britânicos entre os infetados fique por aí, tendo em conta que nascer no Reino Unido não é requisito obrigatório para obter cidadania.
O “The Guardian” lembra ainda um relatório de 2005 da responsabilidade da Casa dos Comuns que referia que a maior parte dos estrangeiros seropositivos recorriam ao serviço nacional de saúde britânico apenas quando a doença já estava num estado avançado. “[Este] não seria o comportamento esperado por parte de um cínico ‘turista de saúde’ que veio para o país somente para aceder a serviços grátis”, refere o documento.
Entretanto, Farage reagiu à polémica reforçando a sua ideia inicial, que diz basear-se em “factos puros e duros”. “Claro que queremos ajudar pessoas de todo o mundo, mas qual é o limite para isto? O nosso sistema nacional de saúde precisa de dinheiro e não existe para tratar o mundo inteiro”, disse, num tom visivelmente mais calmo do que aquele que adotou no debate de 2 de abril.
Foi tudo estratégia de Farage, diz o “The Telegraph”
No dia seguinte ao debate o jornal “The Telegraph” citou fontes anónimas ligadas ao UKIP que revelaram que o comentário controverso de Farage foi uma jogada “não no sentido de chegar aos eleitores indecisos mas antes dirigida à base eleitoral” do partido eurocético, no sentido de a “motivar”.
A mesma fonte também avançou que durante a preparação para o debate, Farage estava a pensar falar antes da proporção de estrangeiros com tuberculose em relação à população total afetada por esta doença. Mudaram de ideias: “Apercebemo-nos de que os medicamentos para o VIH eram mais caros”.